São Paulo, sábado, 22 de maio de 2010

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1 em cada 7 brasileiras de 18 a 39 anos já fez aborto

São 5 milhões de mulheres, segundo pesquisa nacional inédita do Ministério da Saúde

"Pesquisa mostra a cara da mulher que aborta. Não é uma outra, é uma de nós. É a nossa colega, a nossa vizinha, a nossa irmã", diz coordenadora

Rodrigo Capote-20.mar.2010/Folha Imagem
Protesto em março reuniu milhares contra projeto pró-aborto, em SP; pesquisa diz que 5 milhões de mulheres já abortaram no país

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma em cada sete brasileiras de até 40 anos já fez aborto, um número aproximado de 5 milhões de mulheres. Na faixa etária de 35 a 39 anos, a proporção é ainda maior: uma a cada cinco já decidiu abortar.
É o que revela uma pesquisa nacional inédita, financiada pelo Ministério da Saúde e realizada pelo instituto Ibope.
No total, foram ouvidas 2.002 mulheres entre 18 e 39 anos, das capitais brasileiras e de municípios acima de 5.000 habitantes. Foram excluídas as que vivem na zona rural e as analfabetas -454.374 brasileiras, segundo o IBGE.
O estudo mostra que 48% das mulheres que abortaram usaram algum medicamento e que 55% delas ficaram internadas em razão do procedimento.
O aborto é mais frequente entre as mulheres com baixo nível de escolaridade: 23% daquelas com até o quarto ano do ensino fundamental, contra 12% entre as que concluíram o ensino médio.
A proporção de mulheres que fizeram aborto cresce de acordo com a idade. Vai de 6% (dos 18 aos 19 anos) a 22% entre as de 35 a 39 anos.
"A pesquisa mostra a cara da mulher que aborta. Não é uma outra, é uma de nós. É a nossa colega, a nossa vizinha, a nossa irmã, a nossa mãe. Geralmente, tem companheiro e segue uma religião", afirma a antropóloga Débora Diniz, professora da UnB (Universidade de Brasília) e uma das coordenadoras da pesquisa.

Religião
Na pesquisa, não foram observadas diferenças entre mulheres que pertencem a grupos religiosos distintos.
Para o ginecologista Thomaz Gollop, professor livre docente pela USP, os resultados da pesquisa revelam que os dogmas religiosos estão totalmente dissociados daquilo que acontece na sociedade e que a criminalização do aborto não impede que milhares de mulheres continuem adotando a prática.
Margareth Arrilha, diretora-executiva da CCR (Comissão de Cidadania e Reprodução), afirma que os dados refletem que as mulheres continuam abortando e não encontram respostas nas políticas públicas de saúde. "Estamos vivendo um retrocesso em todas as esferas, no Executivo, no Legislativo e no Judiciário", afirma.
O projeto que trata da descriminalização do aborto está parado na Câmara. A ação que discute se a mulher tem ou não direito a interromper a gravidez em caso de fetos anencéfalos (sem cérebro) ainda não foi votada pelo STF (Supremo Tribunal Federal). E, recentemente, o governo federal retirou o apoio à descriminalização do aborto do Plano Nacional de Direitos Humanos.
O médico Adson França, assessor especial do Ministério da Saúde, diz que a pesquisa reafirma que o aborto é uma questão de saúde pública, "como o ministério tem repetido inúmeras vezes".
França afirma que a pasta atende hoje 34,5 milhões de usuárias do SUS com todos os métodos anticoncepcionais. Isso, diz ele, já começa a refletir no número de abortos.
De 2003 para 2009, houve uma queda de 16,6% no total de curetagens (de 240 mil para 200 mil), a maioria por conta de abortos provocados.

Abortos
Os dados da pesquisa não permitem estimar o número de abortos no país. "É seguramente maior do que o número de mulheres que abortam porque uma mesma mulher pode ter feito mais de um aborto. O número também sobe se as áreas rurais e a população analfabeta forem computadas", explica Débora Diniz, da UnB.
Segundo ela, as analfabetas foram excluídas porque não poderiam preencher o questionário das suas entrevistas, e a zona rural, pelo alto índice de analfabetismo entre mulheres.


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