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Favelado, policial esconde profissão
DA REPORTAGEM LOCAL
Há um hábito que é quase norma entre os PMs que vivem em favelas e cortiços: na vizinhança,
ninguém pode saber o que fazem.
Nos barracos próximos, dizem,
existem bases e casas de infratores
que não só são conhecidos dos
PMs, como contam a eles seus crimes. Os delitos ficam impunes.
No vale-tudo da periferia, a lei da
sobrevivência é mais forte do que
o Regulamento Disciplinar.
Pelo regulamento, é infração
média "frequentar lugares incompatíveis com o decoro social
ou policial militar" e grave "faltar
com a verdade". Ambas podem
ter a prisão como punição.
Os policiais que contam suas
histórias não permitem que seus
nomes sejam divulgados. Coisas
do regulamento, que pune comentários sobre a polícia.
É o caso dos soldados Sérgio, 46,
20 anos de PM, e Santos, 45, 23 deles na corporação. Ambos deram
nomes fictícios, vivem em favelas
da Grande SP, dividem um único
quarto com a mulher e os filhos
adolescentes -dois e três, respectivamente-, têm seus nomes nos
serviços de proteção ao crédito,
gastam cerca de 30% dos salários
[menos de R$ 700 líquidos" pagando prestações de empréstimos, fazem bico, não dizem
quantos já mataram e escondem
que são PMs. "É a lei da selva. Eles
[os vizinhos" acham que eu vivo
de catar papelão", diz Santos.
A fantasia com a qual Sérgio é
obrigado a conviver é ainda mais
elaborada. Os vizinhos acham
que ele vive de "consertar computador". Ele diz que trabalha também de noite porque "os funcionários usam o computador de
dia, e ninguém pode mexer na rede". Quando alguém da favela
aparece com um aparelho para ele
consertar, afirma estar cansado e
indica um técnico da região.
"Deixo a farda no batalhão",
narra Sérgio, que esconda das filhas que trabalha nas ruas.
"Eu às vezes trago a farda para
casa em uma sacola. Venho rezando para ninguém resolver
abrir a bolsa", completa Santos.
Mazelas comuns, sonhos idênticos. "Quero um dia morar bem,
poder dizer com orgulho que sou
policial e tirar a funcional de dentro do sapato", diz Santos.
(SC)
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