São Paulo, sábado, 22 de julho de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

comentário

O papel de administrar justiça

FERNANDO CASTELO BRANCO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O TRIBUNAL do Júri no Direito brasileiro, composto por sete jurados, restringe-se ao julgamento dos crimes dolosos (isto é, intencionais) contra a vida: homicídio; induzimento, instigação ou auxílio a suicídio; infanticídio e aborto.
Nos Estados Unidos, ressalvadas as peculiaridades da legislação penal de cada Estado, o alcance do instituto é bem mais amplo, dividindo-se entre o Grande Júri (Gran d Jury), composto por até 25 jurados, e o Pequeno Júri (Petit Jury), composto por 12 jurados.
Enquanto o Grande Júri funciona como um organismo judicial de acusação ou investigação, sem atribuição de sentenciar o eventual infrator, o Pequeno Júri é responsável pelo julgamento do réu, proclamando-o culpado ou inocente.
Antes mesmo da promulgação da Constituição norte-americana, já havia previsão da instituição do júri pela Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia, de 1776: "Em todo processo criminal, incluídos aqueles em que se pede a pena capital, o acusado tem direito de ser julgado, rapidamente, por um júri imparcial de 12 homens de sua comunidade, sem o consentimento unânime dos quais não se poderá considerá-lo culpado".
Há inúmeras diferenças entre o modelo brasileiro e o norte-americano. A forma de decisão dos jurados nos parece uma das mais relevantes.
Nos Estados Unidos, somente os jurados podem permanecer na sala secreta para deliberar, expondo suas dúvidas e convicções sobre o caso, debatendo de forma livre e transparente, na busca pela correta decisão, necessariamente consensual. No Brasil, além dos jurados, que devem responder aos quesitos propostos, permanecem na sala secreta o juiz de Direito, os acusadores, os defensores e os oficiais de justiça.
Antes de proceder "à votação de cada quesito, o juiz mandará distribuir pelos jurados pequenas cédulas, feitas de papel opaco e facilmente dobráveis, contendo umas a palavra "sim'e outras a palavra "não", a fim de, secretamente, serem recolhidos os votos".
Os jurados, sentados lado a lado ao redor de uma mesa, e já naturalmente extenuados pelos dias seguidos de julgamento, devem preservar, dos olhares atentos de todos ali presentes, o sigilo de seus votos.
Ao mesmo tempo que manipulam as "pequenas cédulas", devem zelar para que não transpareçam suas convicções.
Certamente, esta preocupação retira parte da concentração necessária que deveria nortear a conduta de cada jurado no julgamento dos crimes praticados contra o bem mais importante de nossa sociedade: a vida. A mais bela função da humanidade, disse Voltaire, é a de administrar justiça. Para que seja alcançada, porém, são indispensáveis serenidade e paz de espírito.


FERNANDO CASTELO BRANCO, advogado criminal, é professor de processo penal na PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo

Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Até Bia Falcão vira argumento em júri
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.