São Paulo, sexta-feira, 22 de julho de 2011

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BARBARA GANCIA

Urbanismo de resultados


Onde estão os 200 terrenos para construir as creches? E de onde virão verbas de manutenção e operação?


MERGULHADAS NA crise até a tampa, Grécia, Espanha e Itália bem que poderiam seguir a fórmula sugerida ontem pelo secretário municipal de Desenvolvimento Econômico e do Trabalho de São Paulo, Marcos Cintra, para ver se se livram de suas agruras.
Nos textos que costuma assinar no jornal, Marcos Cintra se apresenta como "doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA) e professor titular da Fundação Getulio Vargas". Muito imponente. A mim, ignorante fugida do jardim de infância, pessoas lidas e viajadas sempre intimidam, mesmo que a FGV hoje conduza cursos patrocinados por empresas quais fossem anunciantes do programa da Hebe. Ou que Harvard tenha sido presidida pelo misógino Larry Summers e seja sabidamente uma das fontes onde bebem os pregadores da balela de que o sistema financeiro se autorregula sem precisar de controles externos. Mas isso não vem ao caso.
Nós estamos aqui hoje para comemorar a ideia genial do doutor Cintra, que não só encontrou um meio para solucionar o problema da falta de creches em São Paulo como pode estar no caminho de resolver a crise econômica mundial.
É irônico que, justamente na hora em que a informatização veio para aprimorar a arrecadação eletrônica e que os cofres públicos estão nadando em dinheiro, a prefeitura tenha a desfaçatez de sugerir a venda de bens públicos que estão sendo bem utilizados pela população, como é o caso do terreno em área supervalorizada do Itaim Bibi que agora querem trocar por creches.
O doutor Cintra acha que vai nos sensibilizar com a argumentação das creches, que vai colocar os moradores da área como vilões numa reedição do teatro perpetrado quando a JHSF construiu sua Queóps sobre a marginal.
Pois eu pergunto: onde estão localizados os 200 terrenos na periferia para construir as tais creches? E de onde virão verbas de manutenção e operação dos estabelecimentos?
Se aplicássemos o método Cintra à Grécia, os problemas da Europa estariam resolvidos em dois tempos. Bastaria que os gregos concordassem em vender a Acrópole. Não sei se a Grécia estaria disposta a abrir mão de sua identidade a fim de quitar dívida contraída por uma administração pública. Mas o doutor Cintra é reconhecido interplanetariamente como técnico em urbanismo e gestor de cidades, ele deve estar por dentro, não é mesmo?
A favor do doutor-professor existe ainda o argumento de que sabemos que roubalheira, desperdício e promessas não cumpridas nunca entram nesse tipo de equação e que toda vez que se vende um bem público o dinheiro dele advindo é usado com grande sabedoria.
Depois de ler o que Cintra escreveu sobre como a troca do terreno do Itaim irá beneficiar 25 mil famílias, já estou pensando em ir pessoalmente ao Consulado Italiano na avenida Paulista para pressionar o governo Berlusconi a higienizar a economia italiana. Simples. É só mandar ver na liquidação do Coliseu, na venda da Capela Sistina e no leilão da Pietà. Nem que o papa chie um pouquinho, acho que Cintra consegue convencê-lo com os argumentos vivazes de seu urbanismo de resultados.
Os espanhóis parece que reagiram muito bem ao artigo do doutor Cintra. Já estão fazendo um estudo para ver por quantas creches dá para permutar o Prado. Se fizerem bem-feito, ainda sobra uma graninha para pagar integralmente o FMI.

barbara@uol.com.br

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