São Paulo, quinta-feira, 22 de agosto de 2002

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No Rio, medo do tráfico causa fechamento de cem lojas

MARIO HUGO MONKEN
DA SUCURSAL DO RIO

Impedidos pela PM (Polícia Militar) de fechar o comércio no Jacarezinho (zona norte do Rio) para homenagear o "chefão" Waldir Ferreira, o Vado, morto anteontem pela polícia, os traficantes da favela ordenaram o fechamento de cem lojas e quatro escolas em cinco ruas do bairro do Cachambi, a 6 km de distância.
O chefe da Polícia Civil, Zaqueu Teixeira, disse que abrirá inquérito para investigar a possibilidade de Vado ter sido morto por "queima de arquivo". Para ele, "era melhor para a polícia ter Vado vivo".
"Estávamos próximos de prendê-lo, mas ele acabou morto em uma ação policial", disse.
Vado é o traficante que falava com o cantor Marcelo Pires Vieira, o Belo, em gravações divulgadas pela Polícia Civil. Nas conversas, os dois negociariam armas e drogas, segundo inquérito da Delegacia de Repressão a Ações Organizadas e Inquéritos Especiais da Polícia Civil.
O traficante, que tinha 33 anos, foi morto na noite de anteontem em tiroteio com policiais do 3º BPM (Batalhão da Polícia Militar). No confronto, o cúmplice Cláudio de Moraes Silva, o Macarrão, 19, também morreu e sete pessoas, entre elas uma menina de quatro anos, foram feridas por tiros e estilhaços de granada.

Contraste
A PM ocupou a favela com cem homens do Batalhão de Choque, Getam (Grupamento Tático Móvel) e 3º BPM. Com isso, o clima na favela era tranquilo.
A situação era diferente no Cachambi, policiado por apenas duas patrulhas. Segundo os comerciantes, por volta das 9h, um homem passou de bicicleta e ordenou o fechamento das lojas.
Segundo um comerciante, o mensageiro do tráfico disse que voltaria às 13h para conferir se as lojas estavam fechadas.
Os alunos de escolas do bairro foram surpreendidos com a suspensão das aulas. Cerca de 1.600 estudantes ficaram sem aulas. O colégio Célio Rodrigues fechou suas duas unidades no bairro.
A Escola Municipal José Linhares também não funcionou. Desesperados, pais chegaram a retirar os filhos das sala de aula. O movimento de pessoas nas ruas era pequeno.
O comandante do 3º BPM, tenente-coronel Paulo Mouzinho, minimizou a importância do episódio. "O que ocorreu foi um efeito cascata. Eu não posso obrigá-los a abrir as lojas", afirmou.
A PM enviou 50 homens ao cemitério de Inhaúma (zona norte), onde Vado e Macarrão seriam enterrados. O sepultamento foi adiado para hoje.
O comandante disse que abrirá sindicância para apurar se os tiros que acertaram os sete feridos foram disparados por policiais.
"Seria uma hipocrisia minha se descartasse a possibilidade de os tiros que atingiram inocentes terem sido disparados por policiais. Na hora do tiroteio, havia muita gente na rua", declarou ele.
Elaine Danembergue Carilo, 22, teve parte da panturrilha direita atingida por um tiro de fuzil. Ela disse que a polícia agiu com truculência. "Estava em um bingo quando a polícia chegou atirando", afirmou.

Maluco
O secretário de Segurança Pública do Estado do Rio, Roberto Aguiar, levantou ontem a possibilidade de o traficante Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, morrer antes de ser preso pela polícia.
Questionado sobre a possibilidade de Elias Maluco ser morto durante uma operação policial, assim como aconteceu com outros quatro traficantes ligados a ele nos últimos dias, Aguiar respondeu: "Elias Maluco tem um aparato suicida".
"É por isso que estamos tendo muito cuidado. Tem que ser uma operação cirúrgica", completou o secretário.
Elias Maluco é apontado pela polícia como chefe do bando que, no dia 2 de junho, matou o jornalista Tim Lopes, da TV Globo.


Colaborou SABRINA PETRY, da Sucursal do Rio

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