São Paulo, domingo, 22 de setembro de 2002

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DESIGUALDADE

Moradores de regiões com melhores indicadores sociais da capital tiveram decréscimo de 25% na sua participação

São Paulo encolhe nas áreas de boa condição

DA REDAÇÃO

Antônio Gaudério/Folha Imagem
Conjunto Habitacional Miguel Ackel, em São Miguel, na zona leste de São Paulo, com casas construídas em mutirão; melhorias se devem à mobilização da população


A cidade de São Paulo é um aglomerado de muitas realidades. Mas comece por dividir a capital paulista em duas partes. Uma que possui um conjunto de condições de vida satisfatório, outra em que isso não é verificado.
De 1991 a 2000, a população que mora na São Paulo das carências teve um acréscimo de 1.106.444 de habitantes -o equivalente à população de municípios como Goiânia ou Campinas.
A participação da parcela da cidade que vive em situação de exclusão social aumentou 5,8% (em 91, representavam 81,2%; hoje, são 85,9%, totalizando 8.943.231).
Em contrapartida, a população incluída socialmente teve uma queda de 25,1% em sua participação (de 18,8% para 14,1%, um decréscimo de 346.761 pessoas).
O processo de encolhimento da cidade incluída, que abrange as áreas centrais, tem uma correspondência direta com a grande tendência demográfica dos anos 90 -a migração para a periferia.
A camada mais pobre deixou a inclusão para fugir do aluguel -a busca da moradia própria, ainda que em áreas precárias. Os habitantes de maior poder aquisitivo saíram das áreas centrais para se estabelecerem em condomínios fechados -na tentativa de se isolar da violência e de encontrar maior qualidade de vida.
É como se, de maneira perversa, o bordão do prefeito Figueiredo Ferraz (1971-1973) estivesse sendo cumprido. A cidade parou, sim, de crescer, mas justamente na sua melhor parte. Na periferia, deu-se o que Luiz Antonio Pinto de Oliveira, 55, chefe do Departamento de População e Indicadores Sociais do IBGE, resumiu em uma frase: "É a migração da pobreza carregando o seu lastro".

Caixa de maldades
O Mapa da Exclusão/Inclusão Social, pesquisa da PUC-SP que a Folha divulga hoje com exclusividade, procura interpretar São Paulo utilizando 47 indicadores sociais. Trata-se de um exercício que remete ao mito de Pandora. Abre-se a porta da análise e, por ela, escapam todas as maldades -no caso, as desigualdades da maior metrópole brasileira.
Os problemas que o estudo revela começam pela distribuição de renda. De 1991 a 2000, o número de chefes de domicílio sem renda cresceu 166% na área excluída da cidade, atingindo 287.443 pessoas. Na área de inclusão, o acréscimo foi de 55%. Em contrapartida, nessa região, 33,5% dos chefes ganham acima de 20 salários mínimos. Na área de exclusão, eles são apenas 4,6% do total.
No que se refere à mortalidade de jovens entre 15 e 24 anos, o setor menos favorecido concentra a quase totalidade dos casos, com 96,1%. A área de inclusão social detém apenas 3,9%.
Dirce Koga, 38, Kazuo Nakano, 32, e Frederico Ramos, 32, da equipe de pesquisa do mapa, destacam que a oferta de serviços públicos, como creche e educação infantil, não acompanhou o crescimento das demandas da cidade -os déficits mais graves estão nas áreas mais carentes. "Os serviços públicos não chegam pela falta de políticas para atender a população excluída", diz Nakano.
O quadro é particularmente alarmante quando se leva em conta que 42,4% dos jovens entre 15 e 24 anos da capital moram nos 20 distritos com mais exclusão.

Extremos
Jardim Ângela, na zona sul, ocupa a pior posição no ranking de condição de vida. Em nove anos, sua população cresceu 71,3%. É uma região que passou a chamar a atenção da sociedade por ser violenta. A escalada de crimes foi acompanhada da deterioração dos precários indicadores da região -verificados já no primeiro mapa, com base em 1991.
O distrito, com 19,8% de seus chefes de casa sem rendimento, caiu quatro posições e se tornou o campeão da exclusão. Em 2000, houve 109 homicídios de jovens entre 15 e 24 anos na área.
Condições ruins de vida são verificadas nos distritos vizinhos, como Capão Redondo, Campo Limpo e Jardim São Luís. "É como se a violência da região tivesse minado os indicadores, que passaram a piorar", analisa Nakano.
Moema manteve sua posição de liderança na inclusão. É o distrito que tem o melhor conjunto de indicadores. No que se refere à renda, 41,5% dos chefes de domicílio ganham mais de 30 salários mínimos. Lá, apenas um jovem entre 15 e 24 anos morreu em 2000.

Os recém-incluídos
Dois distritos que não faziam parte do rol dos que apresentavam boa qualidade de vida foram incluídos no ranking atual.
Pari, área tradicional de imigração italiana e portuguesa, passou a apresentar condições satisfatórias devido a seu decréscimo populacional. O distrito foi o que teve maior percentual de queda da população (31,8% em nove anos). Essa redução expressiva significou uma diminuição na demanda por serviços públicos e por infra-estrutura -o que tornou a oferta disponível satisfatória.
Socorro, na zona sul, também passou a integrar o grupo dos incluídos. Isso se deu em decorrência da construção de condomínios de alto padrão no distrito.
Não se verificou nenhuma melhora expressiva em razão de uma ação política determinada. Como no mito de Pandora, o que fica na caixa é a esperança.
(EDNEY CIELICI DIAS)

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