São Paulo, quinta-feira, 22 de novembro de 2007

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PASQUALE CIPRO NETO

"Se ela dissesse que era de menor..."

Ao se dirigir ao público, pela TV, a autoridade teria feito melhor se tivesse empregado a forma "menor (de idade)"

NA ÚLTIMA COLUNA, teci alguns comentários sobre trechos da letra do "Hino à República" (que em algumas publicações aparece com outros nomes -"Hino da República", "Hino à/da Proclamação da República", "Hino da Proclamação Brasileira").
Atribuí (erroneamente) a música a Francisco Braga e a letra a Olavo Bilac por duas razões: a) confiei na memória (lembrava-me de que a dupla compusera um dos nossos hinos e tinha quase certeza de que esse hino era o da República); b) como não tinha certeza absoluta, recorri ao deus dos nossos dias -a internet- e me dei mal (escrevi "Hino à República" no Google e abri a primeira das inúmeras páginas sugeridas; lá encontrei a informação que confirmava o que a minha memória sugeria, ou seja, letra de Olavo Bilac e música de Francisco Braga). Já na manhã da quinta-feira encontrei inúmeras mensagens de atentíssimos (e gentis) leitores que apontaram o equívoco. Acho que respondi a todos (ufa!), mas creio que os que não me escreveram (e acreditaram na coluna) merecem saber que a música não é de Francisco Braga, não; é de Leopoldo Miguez (recebi até uma mensagem de um parente distante do maestro). E a letra? Não é do poeta parnasiano Olavo Bilac (co-autor, com Francisco Braga, do "Hino à Bandeira"). Os versos do "Hino à República" são de José Joaquim de Campos da Costa de Medeiros de Albuquerque. Feita a correção (e o "autoflagelo"), vamos ao assunto de hoje, "patrocinado" por uma autoridade (???!!!) policial do Pará, que, para justificar a presença de uma menor de idade numa cela masculina, perpetrou esta pérola: "Se ela com certeza dissesse que era de menor, seria um outro procedimento". Pois bem, caro leitor, a maior das barbaridades contidas no pronunciamento do superintendente da Polícia Civil do Pará não é lingüística, não; é moral mesmo. Quer dizer que, se a presa fosse "de maior", não haveria nenhum problema em colocá-la numa cela exclusivamente masculina, certo? Eta Brasilzão! Mas vamos à questão lingüística: afinal alguém é "de menor" ou simplesmente "menor"? Na linguagem popular do Brasil, é largamente empregada a expressão "de menor", tal qual a utilizou o luminar da segurança pública do Pará. Costuma-se explicar o uso dessa locução pela abreviação ou redução da expressão "de menor idade" ("Ele é de menor idade"), o que parece fazer sentido. O problema é que, como atestam os nossos dicionários, manuais (o da Professora Maria Helena de Moura Neves, por exemplo) e assemelhados, a forma "de menor" não vige na língua culta nem na linguagem jurídica, nas quais se registra unicamente a forma "menor" ("Ele é menor"), como redução da expressão "menor de idade" ("Ele é menor de idade"). Ao se dirigir ao público, pela televisão, o prócer da Polícia Civil do Pará teria feito melhor se tivesse empregado a expressão "menor (de idade)", que um belo dia, supõe-se, deve ter lido nos compêndios de Direito Penal. Para dizer a verdade, pode ser que os tenha lido, mas não sei bem se os entendeu; tivera-os entendido, não dissera que a jovem só foi parar numa cela masculina porque era menor, ou melhor, "de menor". E assim caminha este triste país. É isso.


inculta@uol.com.br

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