São Paulo, quinta-feira, 22 de novembro de 2007

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Droga antiobesidade pode elevar em 40% risco de depressão

Pesquisa sobre o Acomplia, considerado uma das grandes promessas da indústria farmacêutica, envolveu 4.105 pessoas

Nos EUA, o medicamento foi vetado; no Brasil, apesar de ter sido aprovado, ainda não é vendido por causa de um impasse sobre o preço

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

O medicamento antiobesidade Acomplia (rimonabanto) pode aumentar em 40% o risco de transtornos psiquiátricos graves, como depressão e ansiedade, revela um estudo dinamarquês publicado na última edição da revista "The Lancet".
A pesquisa envolveu uma análise conjunta de quatro estudos clínicos (metanálise) com 4.105 pessoas sem histórico anterior de depressão, divididas em dois grupos: os que receberam 20 miligramas por dia de rimonabanto e outros que tomaram placebo. Em um ano, o primeiro grupo perdeu 4,7 quilos a mais que o segundo e apresentou também mais reações psiquiátricas adversas.
É a primeira metanálise publicada sobre os efeitos colaterais do remédio -considerado uma das maiores promessas da indústria farmacêutica no combate à obesidade.
O Acomplia foi vetado em junho pelo FDA (agência norte-americana que regula alimentos e fármacos) que pediu mais estudos sobre os seus efeitos colaterais, especialmente os distúrbios psiquiátricos e risco de suicídios. Na Europa, ele é vendido há mais de um ano.
No Brasil, a droga foi aprovada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em abril, mas ainda não é vendida por um impasse sobre o preço. A fabricante Sanofi-Aventis quer comercializá-lo a R$ 250,74, mas a Cmed (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos) estipulou o preço em R$ 130,05.
Alheias ao imbróglio, muitas pessoas têm importado o medicamento. Só em São Paulo, ao menos 3.000 pacientes de 12 endocrinologistas e cardiologistas estão usando o remédio. Para a Anvisa, a droga é segura desde que obedecidas as indicações médicas -pessoas com a síndrome metabólica, situação que aumenta o risco de doenças cardiovasculares.
Segundo Arne Astrup, do departamento de nutrição humana da Universidade de Copenhague e uma das autoras do estudo, a metanálise mostra que mesmo pessoas sem histórico prévio de depressão têm risco elevado de desenvolvê-la com o uso do rimonabanto.
A professora Ana Maria Cardoso, 52, é um exemplo. Ela conta que sempre se considerou uma "gorda feliz", mas que, um mês após iniciar o tratamento, começou a se sentir deprimida, sem vontade de sair de casa. "Só chorava. De repente tudo ficou cinza", afirma.
Ela diz que demorou pelo menos duas semanas até associar a depressão à medicação. "Assim que falei com meu médico, ele suspendeu a medicação e, em poucos dias, eu já me sentia outra."
Já o comerciante Carlos Silva, 45, teve uma experiência inversa. Com o tratamento, perdeu quatro quilos e relata ter conseguido melhorar os níveis de colesterol. "Uso [o Acomplia] há um ano e me sinto até de melhor de humor."
Philip Mitchell, chefe da escola de psiquiatria da Universidade de New South Wales (Austrália), co-autor do editorial que acompanha o estudo, observa que a depressão é comum em pessoas obesas e pode se manifestar em outros tipos de tratamento para emagrecer.

Benefícios
Médicos brasileiros defendem o Acomplia e dizem acreditar que ele traz mais benefícios do que riscos, mas intensificaram o monitoramento.
A endocrinologista Maria Fernanda Barca, por exemplo, examina pacientes a cada 25 dias. Só depois de avaliá-los e se certificar de que não apresentam sintomas psiquiátricos é que ela continua o tratamento.
Barca tem 125 pacientes que já utilizaram o remédio. Desse total, 6% apresentaram ansiedade, tristeza ou depressão leve. Para ela, o remédio continua sendo uma ótima opção para quem apresenta a síndrome metabólica. "Sem dúvida, os benefícios superam os riscos."
O endocrinologista Antonio Roberto Chacra, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), defende que a droga seja dada ao "paciente correto". "Jamais deve ser indicada para fins estéticos. É para quem tem real risco cardiovascular."


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