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Sítio arqueológico em Pinheiros para obra e irrita prefeitura
Empresa Municipal de Urbanização "esconde" da imprensa objetos de quase dois séculos e mostra só os dos anos 50
Ao apresentar objeto "novo", prefeitura desqualifica sítio arqueológico; Kassab tem pressa para inaugurar obras do novo largo da Batata
RICARDO WESTIN
DA REPORTAGEM LOCAL
A Prefeitura de São Paulo e o
Iphan (Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional),
que é ligado ao governo federal,
entraram em guerra por causa
de um sítio arqueológico descoberto nas obras de revitalização
do largo da Batata, em Pinheiros, zona oeste da capital.
A prefeitura convocou ontem
jornalistas para mostrar que os
objetos encontrados no local
não passavam de pedaços de
ossos, ferraduras e utensílios
domésticos datados dos anos
1950, escurecidos e desfigurados pelo tempo e de valor histórico praticamente nulo.
A Folha procurou os arqueólogos responsáveis pelas escavações e ouviu que, na realidade, haviam encontrado outros
objetos muito mais antigos que
os selecionados pela prefeitura.
O subsolo do largo da Batata,
segundo eles, guarda pratos de
cerâmica, garrafas de vinho,
cerveja e uísque, copos, frascos
de perfume e pedras de acender lamparina, entre outros objetos. Escondidos a cerca de
um metro da superfície, foram
fabricados quase 200 anos
atrás -portanto de imenso valor histórico.
A prefeitura tenta desqualificar os objetos porque parte das
obras de revitalização do largo
da Batata está paralisada justamente por causa do sítio arqueológico. Em novembro, o
Iphan recebeu denúncia de que
no local havia material histórico e determinou que os trabalhos ficassem suspensos até
que toda a área fosse analisada.
Os arqueólogos dizem que
até o momento escavaram apenas um terço do terreno onde
será construída uma praça, o
que ameaça os planos do prefeito Gilberto Kassab (DEM)
de ter a primeira parte do novo
largo da Batata inaugurada em
julho de 2010. Segundo os arqueólogos, a escavação pode se
estender até o fim do ano.
As obras incluem ainda a
construção de um terminal rodoviário e a abertura de novas
ruas. A promessa de acabar
com a degradação da área atiçou a especulação imobiliária, e
praticamente todos os terrenos
vizinhos já foram comprados.
"Eles [a prefeitura] estão
preocupados, não estão sabendo lidar com o embargo [imposto pelo Iphan]", disse o arqueólogo Plácido Cali, da empresa contratada para escavar
o terreno e analisar o material.
Quem apresentou os objetos
ontem em nome da prefeitura
foi o diretor de obras da Emurb
(Empresa Municipal de Urbanização), Edward Zeppo Boretto: "São dos anos 50". "Não têm
valor porque na época a fotografia já existia", acrescentou
um assessor da Emurb.
Taberna
Cali discorda da prefeitura:
"O achado é relevante porque
as informações históricas disponíveis sobre essa região naquela época são escassas".
Pela primeira análise do material coletado, o arqueólogo
diz que aquela região de Pinheiros tinha casas e uma taberna
na primeira metade do século
19. "Por causa da qualidade das
louças, sabemos que não eram
famílias abastadas", explica.
Os arqueólogos têm a expectativa de encontrar vestígios de
um aldeamento erguido em Pinheiros pelos jesuítas em meados do século 16. "Muitos consideram esse o primeiro bairro
da cidade", diz Cali.
Boretto, da Emurb, reclamou
ontem do rigor do Iphan: "O
metrô fez obras aqui do lado e
não se encontrou nada [histórico]. Já solicitei ao Iphan a lista
dos sítios arqueológicos de São
Paulo, para não termos problema de novo".
A Folha não conseguiu falar
com o funcionário do Iphan
que cuida desse processo. Não
há previsão para que a obra seja
completamente liberada.
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