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ENTREVISTA
GENE ABEL
Redes de pedofilia são raras, afirma psiquiatra dos EUA
Autor de dois livros sobre o tema, Gene G. Abel diz que prática tende a não acabar, mas que o pedófilo pode ser tratado
ANDREA MURTA
DE NOVA YORK
Pesquisador do tema há mais
de 40 anos, o psiquiatra norte-americano Gene G. Abel acredita que a organização de redes
para a prática de pedofilia, como a que é investigada em Catanduva (SP), é algo raro e que o
aliciador de crianças para fins
sexuais tende a agir sozinho.
Autor de dois livros e de mais
de cem artigos científicos sobre
o assunto, Abel diz que, embora
não seja o único fator, cerca de
1/3 dos pedófilos já foram vítimas de abuso e que a pedofilia
tende a continuar existindo.
Leia a entrevista concedida por
telefone de Atlanta, nos EUA.
FOLHA- O quão comum é o abuso
sexual infantil entre pessoas de uma
mesma comunidade?
GENE G. ABEL - Não é surpreendente. Abuso sexual infantil
acontece quando a criança está
próxima aos molestadores. A
maioria pensa que o abuso
ocorre quase sempre dentro da
família, mas não é o caso; um
bom número de pessoas sofre
abuso por parte de amigos mais
velhos ou adultos. Apenas 10%
são praticados por estranhos.
FOLHA- Pedófilos em geral atuam
em redes ou sozinhos?
ABEL - Alguns fazem parte de
grupos que trocam fotografias
pornográficas, por exemplo.
Mas organizar uma rede para
abusar de crianças é algo raro.
É mais comum um parceiro do
molestador, como sua mulher,
ajudar a atrair crianças para satisfazer o outro, sem se interessar pessoalmente por isso.
FOLHA- Em Catanduva (SP), as
crianças envolvidas têm de 6 a 12
anos. Há uma idade mais comum?
ABEL - Nos EUA, a incidência
de abuso contra crianças de 14 a
17 anos é tão alta quanto a de
abusos de crianças menores.
Ao mesmo tempo, a idade do
molestador médio é 14 anos. A
pedofilia começa muito cedo.
FOLHA- O que leva uma pessoa a
desenvolver interesse por crianças?
ABEL - Pedófilos têm interesse
sexual por adultos também.
Cerca de 1/3 dos pedófilos foram vítimas de abuso, mas há
outros fatores. Quanto mais jovem é a vítima, mas fácil é que
ela pratique o abuso no futuro.
Quanto mais o molestador for
alguém que a vítima admira,
maior a probabilidade de ela
desenvolver interesse por
crianças. Também parece contar o quanto o abuso envolveu
"sedução". Já sofrer abuso por
parte de um estranho não está
associado ao desenvolvimento
de tendências para a pedofilia.
Outro terço dos casos é devido à fixação em experiências
sexuais ocorridas na infância.
Se um indivíduo tem uma experiência precoce, pode desenvolver interesse sexual pelo uso
constante de fantasias que envolvem crianças. Quanto mais
usam essas fantasias quando
estão excitados sexualmente,
mais forte o interesse se torna.
FOLHA- Há um padrão de atuação?
ABEL - A maioria quer acariciar
crianças ou se envolver em penetração genital, mas raramente há desejo de machucar a vítima. O curioso sobre molestadores é que são muito bem adaptados para se relacionar com
crianças. Sabem do que elas
gostam e usam isso.
FOLHA- Dá para curar um pedófilo?
ABEL - O interesse particular
não pode ser curado, mas é falso pensar que eles não podem
ser tratados. Já tratei de cerca
de 350 molestadores condenados e a taxa de reincidência é de
4%. Ensinamos a não se colocarem em situações de risco, a
bloquear e reduzir o interesse
em crianças.
FOLHA- É realista almejar pôr fim
ao abuso sexual infantil?
ABEL - O abuso de crianças
sempre vai continuar. Indivíduos sempre vão gravitar em
torno de quem é mais vulnerável a experiências sexuais.
FOLHA- Nos 40 anos em que o sr.
estuda o tema, houve grandes mudanças de tendências ou padrões?
ABEL - Abuso sexual infantil
existe há muito tempo. A atenção começou a crescer nos anos
1970, com movimentos antiestupro, liderados por mulheres.
Quando foram organizados
centros especiais, mais pessoas
vieram a público contar que sofreram abuso na infância. Agora há forte ênfase no abuso sexual infantil, que é muito mais
comum do que o estupro de
mulheres adultas. E a internet
se tornou um problema real.
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