São Paulo, sexta-feira, 23 de abril de 2004

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CRIME NO PARQUE

Despesa mensal com manutenção da fundação caiu 20% após revisão de procedimentos e novas licitações

Corte em contratos chegou a R$ 1,4 milhão

DA REPORTAGEM LOCAL

A revisão de contratos de prestação de serviços e de fornecimento de produtos -sobretudo rações-, aliada à mudança de procedimentos administrativos, reduziu em 20% os custos mensais de manutenção do Zoológico de São Paulo na comparação entre o desembolso do segundo semestre de 2001 e o gasto atual.
A manutenção consome cerca de 55% da receita total do zôo -aproximadamente R$ 13 milhões por ano, incluindo repasses do governo e arrecadação de bilheteria. São cerca de R$ 7,3 milhões para limpeza, segurança, comida dos animais, remédios, conserto de instalações, equipamentos etc., mas o valor já foi quase R$ 1,4 milhão maior.
Os outros 45% do orçamento mensal cobrem as despesas com pessoal (35%) e patrocinam os investimentos (10%). Há alguns anos, porém, os custos de manutenção eram tão pesados -inclusive pelo descontrole da entrada de animais- que engoliam toda a verba de investimento, paralisando atividades de reprodução e manejo de espécies raras. Na época, os fornecedores eram os mesmos havia mais de dez, 20 anos.

Felinos obesos
A mesma falta de controle e planejamento que permitia que funcionários fizessem a reposição de alimentos de suas casas a partir da despensa do zôo também colocava em risco a saúde de alguns animais, narram técnicos do parque.
Sem acompanhamento médico adequado, os felinos, por exemplo, estavam obesos no final de 2001, pois os 12 kg de carne eram entregues diariamente a eles sem, por exemplo, o jejum necessário.
"Logo que assumi, costumava circular pelo parque, entre os visitantes, para ouvir comentários feitos entre eles. Uma vez escutei uma mulher dizendo ao marido: "Benhê, vamos ver se a gente acha algum bicho vivo, vai". Não dá para ouvir isso", narra o veterinário Paulo Bressan, diretor-presidente do zôo desde julho de 2001, referindo-se à preguiça observada à época nos animais obesos.

Pesquisa x diversão
A falta de prioridade nos gastos tinha relação direta com os problemas de relacionamento entre o Conselho Superior do zôo e o então secretário de Esportes e Turismo, Marcos Arbaitman, titular da pasta à qual a fundação foi vinculada durante décadas.
Apesar de não haver relação hierárquica entre os órgãos, Arbaitman mantinha no zôo um assessor de seu gabinete que, narram os membros do conselho do zôo, empenhava-se em impor sugestões da secretaria à instituição. Na ocasião, a ingerência chegou a ser alvo de queixas à Promotoria.
Tais sugestões tinham origem no mais ferrenho embate mantido entre conselheiros e secretários por anos -a vocação do parque. Para os conselheiros, oriundos basicamente da Universidade de São Paulo, o zôo é uma fundação científica, que tem de valorizar o ensino e a pesquisa.
Para o secretário, a instituição iria se consagrar como parque de diversões, no qual os animais seriam apenas uma das atrações.
"O zoológico passou por uma fase meio tumultuada. Parece que havia um conflito de interesses", afirmou à Folha, em março, o presidente do conselho orientador do zôo, Miguel Trefaut.
Cada tendência, é evidente, queria ver as verbas aplicadas de forma alinhada com o enfoque defendido para a instituição. O conselho tentava priorizar a pesquisa e o ensino. O secretário queria fazer "um parque bonito", que garantisse boa bilheteria.
A face mais visível desse entrevero foi a indicação feita por Arbaitman de Marcelo Gutglas, o presidente do Playcenter, para o comando do conselho e sua nomeação, pelo governador.
Gutglas ficou só um mês no cargo. Na primeira reunião com os conselheiros, ele foi questionado sobre sua formação acadêmica. Engenheiro, não poderia ocupar o cargo, segundo o estatuto da fundação, que exige um profissional da área de biociências.
Com uma ilegalidade explícita para se apegar, o conselho suspendeu a reunião sem que sua ata fosse nem sequer finalizada, o que só aconteceu quatro meses depois, quando Bressan assumiu as rédeas da fundação, vindo da Secretaria da Administração e atendendo a um pedido pessoal de Geraldo Alckmin (PSDB).
Conhecido como um homem de confiança do governo, ele é tradicionalmente indicado para desatar nós da administração. Em 2001, o zôo era mais um. Foi Bressan quem disse a Arbaitman que a fundação exerceria sua plena autonomia administrativa. Hoje, o Zoológico de São Paulo é vinculado à pasta de Ciência e Tecnologia. (SÍLVIA CORRÊA e FABIANE LEITE)

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