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ARTIGO
Em defesa da Universidade de São Paulo
ANTONIO CARLOS ROBERT MORAES
ESPECIAL PARA A FOLHA
Quando o atual governo do
Estado de São Paulo decidiu
promulgar um decreto alterando a estrutura das universidades públicas estaduais, gerou a possibilidade da crise que
agora vivenciamos. Tal medida
não constava do programa de
governo apresentado pelo candidato a governador, nem foi
levantada em sua campanha
eleitoral. Por isso surpreendeu
a comunidade uspiana, inclusive aqueles que nele votaram.
Para utilizar uma expressão
popular, foi uma medida "tirada do bolso do colete", incidindo em uma área da administração pública estadual que, comparativamente, não apresentava grandes problemas. Ao contrário, a USP permanecia com
a sua produção acadêmica de
qualidade e estava expandindo
vagas. Cabe assinalar que, para
uma proposta que visava "aprimorar" o sistema universitário
paulista, a medida continha
grandes lacunas e imprecisões,
como ficou bem demonstrado
nas alterações posteriormente
realizadas pelo próprio governo estadual, e nas dúvidas que
persistem sobre suas atribuições até o momento.
Em face ao quadro descrito,
e dada a omissão dos dirigentes
da USP que não se manifestaram quando da publicação do
decreto, instalou-se um clima
de insatisfação na comunidade
uspiana. Tal terreno possibilita
atitudes radicais e mesmo impróprias, como a invasão do
prédio da reitoria por um grupo minoritário, que se manifestou como "vanguarda" política no processo.
Sem dúvida, essa ação desencadeou o debate que agora
se trava, porém a atual situação
de impasse, que persiste, é altamente lesiva à instituição. As
atividades-fim de ensino, pesquisa e extensão são prejudicadas, e municia-se os interesses
contrários à universidade pública com argumentos falaciosos, que passam à sociedade
uma visão distorcida da vida
universitária.
Órgãos de imprensa inescrupulosos fartam-se nessa situação, apresentando os docentes
como uma corporação privilegiada e os alunos como rebeldes irresponsáveis. Esta visão
deturpada e intencionalmente
dirigida para a destruição de
um bem público não releva os
enormes serviços prestados
pela USP ao longo de sua existência. Todo o sistema universitário brasileiro lhe tem como
matriz geradora de quadros especializados e como referência
institucional.
A pesquisa de excelência ali
praticada, responsável por
quantidade considerável da
produção humanística e científica nacional, se expressa
desde a geração de patentes de
remédios de suma importância
para a saúde humana até a elaboração de interpretações básicas para o entendimento de
nossa história, desde o desenvolvimento de tecnologias vitais para o país até a reflexão
sobre posicionamentos que
aprimoram a nossa sociabilidade.
Além disso, cotidianamente,
a universidade presta diversificados serviços à população, seja no campo do atendimento
médico, da elaboração de laudos técnicos, de difusão da cultura, entre outros. Enfim, seria
longa a lista dos benefícios que
a universidade cria para a sociedade que a mantém. Pequeno é o seu custo em comparação com outras aplicações dos
recursos públicos.
Por essa tradição já consolidada, a Universidade de São
Paulo não pode ser colocada na
"bacia das almas" do jogo de interesses mercantis, partidários
ou político-eleitorais. A sociedade paulista tem de defender
este seu patrimônio, lutando
pela manutenção de sua autonomia, de sua independência
administrativa e de pensamento. O que não significa falta de
transparência na prestação de
contas (como parece sugerir o
discurso governamental).
ANTONIO CARLOS ROBERT MORAES é professor-titular do Departamento de Geografia da
FFLCH, foi secretário da Adusp e representante
dos professores-assistentes e dos professores-doutores no Conselho Universitário da USP
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