São Paulo, domingo, 23 de maio de 2010

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Não há lugar no Rio em que polícia não entre, diz Beltrame

Secretário de Segurança quer ocupar 47 áreas hoje sob o controle do tráfico, inclusive o Complexo do Alemão

Para ele, armas, drogas, munição, caça-níqueis, milícias e corrupção policial são delitos que levaram desgraça ao Rio


ITALO NOGUEIRA
DO RIO

Sob o comando do gaúcho José Mariano Beltrame, 53, a Secretaria de Segurança do Rio revive a esperança de recuperar favelas controladas por criminosos e assiste à queda nas taxas de homicídios. Mas a polícia superou todas as estatísticas de mortos em supostos confrontos.
Sua receita para as UPPs mescla planejamento, trabalho de inteligência e enfraquecimento das quadrilhas. "Mas, se tivermos que repetir a dose no Complexo do Alemão [onde 19 supostos traficantes foram mortos em 2007], nós vamos. Podemos ir e não pacificar", disse.
Beltrame planeja ocupar 47 áreas hoje sob controle do tráfico até 2014, inclusive o Complexo do Alemão, aglomerado de 13 favelas apontado como o "quartel-general" do Comando Vermelho.

Folha - Como a polícia ocupa favelas sem resistência?
José Mariano Beltrame
- O Bope não entra mais [na favela] rumo a um determinado lugar, à casa tal, endereço tal. Ele entra capilarizando.
Entrando assim, o tráfico entende que os policiais vieram para ficar. Isso faz as pessoas fugirem.

Dizia-se que a polícia não entraria nesses locais sem tiro. Faltava planejar?
Faltou planejamento para quase tudo. Não havia nenhum plano para ocupação dessas ilhas.

O planejamento da UPP demorou dois anos...
Demorou. As pessoas e os políticos querem respostas rápidas... Querem chegar e acender a luz. Não sabem que tem que furar a parede, passar o fio...

Furar a parede, na segurança, foram as operações?
Foram determinações minhas. A gente tem que combater arma, droga, munição, máquina caça-níquel, corrupção policial e milícia, seis delitos que trouxeram a desgraça para o Rio.

Reduzir o tráfico de drogas é função da UPP?
É consequência. A UPP não é solução para tudo. "Ah, mas o tráfico vai permanecer". Mas, se tiver policiamento, posso fazer prevenção e investigação.

Diz-se que boa parte dos traficantes e das armas estão sendo enviadas para o Complexo do Alemão.
Será que esses caras têm esse poderio? Não trabalham em escala, não têm reposição, treinamento, são dotados de uma total irresponsabilidade. Não vejo um poder.
Quando você vê uma pessoa com um fuzil na mão achincalhando a sociedade, choca a todos nós. Mas hoje, no Rio, não tem lugar em que a polícia não entre.

Mais de mil pessoas são mortas pela polícia por ano. Como o sr. vê esse dado?
Não sairemos de mil mortos para zero. Aqui tudo é muito denso. Ao andar naquelas vielas, os fuzis quase se encontram. Em outros locais, a polícia tem facilidade para progredir. Aqui há barricadas, óleo na pista. Mas os números vêm caindo.

Como afastar a UPP da corrupção policial?
Até agora está afastado. Temos uma supervisão forte, a sociedade começa a conhecer as pessoas e há um upgrade financeiro [os PMs recebem bônus de R$ 500 ao salário de R$ 1.000].
Os policiais [recém-formados] vão sem vícios. Saem da academia pensando: "Vou fazer um trabalho de polícia. Não sou um combatente".
O policial do Rio é o mais estressado do mundo. Ele está na rua, daqui a pouco o chamam para ir ao São Carlos [favela sob controle do tráfico]. Ele vai sair daqui, vai se travestir de guerreiro e vai lá atirar, matar, se ferir. Volta e pega a saída do colégio. O policial da UPP não vive isso.


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