São Paulo, sexta-feira, 23 de junho de 2006

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Cientistas contam como fugiram, a nado, de arquipélago

Para alcançar o barco de resgate, os quatro pesquisadores brasileiros saltaram de penhasco e enfrentaram ondas de 5 m

Há duas semanas, ressaca devastou o conjunto de ilhotas isolado a mil km do litoral, que não tem sombra nem água doce


SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO

A nado. Assim escaparam para o barco de resgate, em meio a ondas de 5 m de altura, os quatro pesquisadores da estação científica destruída pelo mar há duas semanas no arquipélago de São Pedro e São Paulo. Na volta para casa, eles relataram à Folha a aventura.
Atirar-se de um penhasco no intervalo de vagas enormes para, nadando, chegar à salvação foi o momento mais perigoso da situação enfrentada pela equipe da USP (Universidade de São Paulo) e da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) durante dois dias.
Como a Folha revelou no dia 9, a ressaca devastou a estação e isolou-os em um dos mais inóspitos lugares do país.
O conjunto de ilhotas rochosas não tem água doce nem sombra. Fica sobre a linha do Equador, a mil quilômetros do litoral do Rio Grande do Norte e a 650 km de Fernando de Noronha. Desde a década de 90, o governo mantém ali uma estação científica, sem moradores. Equipes de pesquisa se revezam a cada 15 dias.
Quando as primeiras ondas chegaram com violência à estação -uma casa de madeira de 40 m2-, ao anoitecer do dia 5, o médico Fábio Tozzi, 45, e os biólogos Adriana Kohlrausch, 29 (ambos da USP), João Paulo Machado Torres, 40, e Larissa Cunha, 37 (da UFRJ), decidiram correr para o farol.
Só tiveram a chance de pegar algumas laranjas, sacos de batatas fritas, azeitonas e um pedaço de pão. Ficaram sem água, pois o mar levou os 45 galões de 20 litros armazenados.
Por causa dos perigos da jornada, os cientistas, antes da viagem, fizeram curso de sobrevivência no mar, ministrado pela Marinha. Uma pesquisadora que não sabia nadar teve a viagem vetada.
Após dois dias confinados no farol, de apenas 1 m de diâmetro, os cientistas receberam a informação, transmitida por rádio pelos pescadores da traineira Ave Maria, que a ressaca se tornaria mais destruidora no dia seguinte (quinta-feira, 8).
"Foi aí que decidimos deixar a ilha o mais rapidamente possível. Não sabíamos se a onda chegaria ao farol. O relato de um pescador era a de que isso tinha acontecido há uns 30 anos", disse Torres.

Rádio portátil
Como os equipamentos de comunicação tinham sido destruídos, os cientistas se valeram de um rádio portátil para pedir socorro ao barco de pesca, mantido na área pela Marinha em suporte à equipe.
O problema era que, por causa das ondas, o bote de resgate não conseguiria atracar no deque de pedras. Embora arriscada, a solução foi escapar a nado.
Em um ponto atrás do farol, onde a profundidade era maior, as ondas não estouravam com tanta violência. Quando uma passava, eles mergulhavam um a um e com braçadas vigorosas alcançavam a bóia atirada pelos pescadores. A seguir, eram trazidos para a embarcação.
Naquela quinta-feira, quando o navio-patrulha Guaíba, da Marinha, chegou para socorrer a equipe, Tozzi voltou à ilha. Conseguiu recuperar computadores portáteis, câmeras fotográficas e parte da pesquisa -sobre contaminação de caranguejos, atuns e ovos de pássaros por metais pesados, pesticidas e outras substâncias tóxicas persistentes.
O grupo chegou no fim de semana seguinte a Fernando de Noronha e depois a Natal.


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