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VÔO LIVRE
Informação é do inspetor-chefe da Receita no aeroporto de Cumbica, que já recebeu desconto para ir a Buenos Aires pela TAM
Fiscais ganham passagem de empresa aérea
ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL
Funcionários da Receita Federal
que atuam no aeroporto de Cumbica, em Guarulhos (Grande São
Paulo), costumam receber passagens nacionais e internacionais de
empresas aéreas com descontos
superiores a 50% ou até de graça.
Os servidores do órgão trabalham com a função de controlar
bagagens e fiscalizar tributos dos
produtos importados ou exportados por meio das companhias aéreas. Quando saem de férias, alguns pedem e conseguem isenções para viajar com a família.
A informação sobre a prática foi
admitida à Folha pelo inspetor-chefe da Receita no aeroporto,
João Figueiredo. Ele já recebeu
cortesia para ir a Buenos Aires em
2003 -diz não se lembrar o percentual do desconto, mas a TAM,
fornecedora do bilhete, afirma
que ficou entre 50% e 75%.
"Realmente existe no aeroporto
essa cortesia de algumas companhias. Se alguém falar coisa ao
contrário, é mentira. É conveniente para elas manter essa relação amistosa com todo mundo",
diz Figueiredo, para quem a "política de boa vizinhança" delas visa
manter um bom atendimento
"das demandas".
O inspetor da Receita afirma
que a prática se estende aos demais empregados do aeroporto e
a defende sob duas condições:
desde que não seja uma imposição às companhias aéreas ("fica a
critério delas dizer quanto, quando e se quer dar") nem interfira
no trabalho diário da fiscalização.
Mas não pode haver um conflito
de interesses, questiona a Folha?
Na opinião de Figueiredo, não.
"Não existe nenhuma obrigatoriedade em termos de retribuição
de favores. A gente sempre alerta
os funcionários de que não pode
haver contrapartida", diz.
"O cara dá uma passagem aérea
e eu tento passar uma muamba
para ele. Se alguém fizer coisa desse tipo, no dia seguinte estará na
corregedoria", exemplifica.
Requisições
As informações do inspetor foram dadas depois de a Folha receber comprovantes de requisições
internas de passagens gratuitas ou
com descontos da TAM em nome
de três funcionários ou ex-funcionários da Receita no aeroporto,
incluindo Figueiredo. Os outros
dois, conhecidos dele, não foram
localizados pela reportagem.
A lista inclui viagens em nome
de uma pessoa chamada João Figueiredo, inclusive para Miami e
Paris, entre 2000 e 2003. Mas só a
de Buenos Aires tem a veracidade
confirmada como sendo destinada ao próprio inspetor da Receita.
As demais também constam do
sistema da TAM, mas há suspeita
do próprio Figueiredo de ser uma
fraude no sistema interno cometida por pessoas usando seu nome.
Ou então pode ser um homônimo, o que considera mais difícil.
O inspetor diz que não vai aos
EUA há mais de dez anos -e se
dispõe a mostrar seu passaporte
para provar a versão. Ele até esteve em Paris na época do bilhete da
TAM, em 2001, mas viajou por
outra companhia, sem cortesia.
Figueiredo, que está no aeroporto desde a década passada, inicialmente como fiscal e depois como inspetor, afirma que, além da
viagem a Buenos Aires pela TAM,
em 2004 ele pediu desconto para
ir ao Chile pela LanChile. Apresentou sua identificação, mas não
teve sucesso e desistiu da viagem.
"Fui ao balcão da LanChile e falei: "vocês dão desconto para funcionário do aeroporto, está aqui
meu crachá". Mas é política da
companhia não dar desconto para ninguém. Falei obrigado e continuei meu relacionamento profissional comum."
Segundo ele, nos anos 90 as viagens de servidores do aeroporto
pela Vasp "principalmente ao exterior, eram a "rodo'". "Para quem
quisesse davam de graça."
Apesar de negar conflito de interesses, Figueiredo diz que já
houve um servidor da Receita,
três anos atrás, que tentou se beneficiar -mas não conseguiram
fazer um flagrante. "O cara falou
para uma empresa que precisava
de tantas passagens por mês, ou
ele não liberaria nenhuma bagagem extraviada", diz Figueiredo.
Ronaldo Lomônaco, superintendente da Receita em São Paulo
que cuida de questões aduaneiras,
diz ver conflito ético na obtenção
de cortesias se a pessoa se identificar como servidor. Ele considera,
porém, ser "menos grave" quando não há contrapartida na função. Lomônaco diz já ter ouvido
sobre as cortesias, mas nada concreto. "Existem informes, as situações são comentadas, mas não
com elementos palpáveis."
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