São Paulo, quarta, 23 de dezembro de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JUSTIÇA
Casais fizeram exame de sangue ontem para achar bebê trocado em maternidade de Osasco (SP) há cinco anos
Pais dizem que não vão destrocar crianças

MALU GASPAR
da Reportagem Local

Eles dizem já ter pensado em mudar de cidade, esquecer ou contestar o resultado do exame de paternidade. Para esse grupo de 16 casais, o que interessa é não perder as meninas que criam como filhas há cinco anos.
Os casais estiveram ontem no Imesc (Instituto de Medicina Social e Criminologia) a pedido da Justiça para ajudar a esclarecer quem é o bebê trocado numa maternidade de Osasco (Grande São Paulo) em 1993.
Eles dizem que, mesmo que o exame de sangue feito ontem aponte que estão com a filha de outro, não a entregarão aos pais verdadeiros.
"Eu faço qualquer coisa, mas sem minha filha eu não fico. Se não tiver outro jeito, a gente foge com ela", diz Conceição da Silva Celano, 33, mãe de Tatiana.
Ela era uma das mães que estavam com a escriturária Sueli Zaothei Silva, 36, na enfermaria do Hospital e Maternidade João Paulo 2º em 14 de maio de 93. As filhas de ambas nasceram naquele dia.
Havia uma greve nos hospitais da cidade e o João Paulo 2º era um dos únicos que funcionavam.
No dia seguinte, o hospital chamou o marido de Sueli, Benedito Leopoldo da Silva Júnior, para avisar que a filha havia morrido ao nascer. Ele não acreditou: o bebê que havia morrido ao nascer prematuro não tinha nada a ver com sua filha Bruna, que nasceu com a gestação completa e foi vista pela mãe logo após o parto, chorando.
"Na hora eu vi que não podia ser a minha filha, mas demorei a perceber que os bebês podiam ter sido trocados", afirma Silva Júnior.
Procurada ontem pela Folha, a diretoria do João Paulo 2º não quis se manifestar sobre o caso.
Saber exatamente o que ocorreu na maternidade naquele dia e quem é a filha do casal é o objetivo de um inquérito policial do 5º Distrito Policial de Osasco que está protegido por sigilo de Justiça.
Durante as investigações, um exame de DNA já provou que o bebê morto não era do casal.
O exame de ontem, feito com casais que tiveram filhos nos dias próximos ao parto de Sueli, vai apontar se alguma das meninas que eles criam é o bebê trocado.
Mas ao mesmo tempo em que é a esperança do casal Sueli e Benedito, o exame tira o sono dos outros casais há pelo menos um mês, quando foram chamados para prestar depoimento na delegacia.
"Quando entendi o que havia acontecido, tive um choque, me desesperei. Mas recuperei a confiança e tenho certeza que ela é minha filha. É a cara de todo mundo lá em casa", diz Maria Rosário Alves da Silva, mãe de Jaiane.
A semelhança física é a maior prova para esses pais que não têm como argumentar diante da evidência de que um bebê foi trocado no hospital naquele dia.
Na sala de espera do exame, todos admitiram estar buscando semelhanças entre pais e filhos para tentar adivinhar quem é a menina.
"A gente repara, é inevitável. Eu já vi aqui uns dois ou três que não parecem muito com os pais. Mas acho que a criança que essa mulher procura não está aqui", afirma Ademilson Ribeiro da Cruz, pai de Natani, sua única filha.
O estranhamento entre os pais e o casal que busca a filha foi imediato. "Vieram perguntar porque estamos mexendo nisso depois de tanto tempo. Mas a culpa não é nossa", diz Sueli, que tem três outros filhos, todos homens.
Diferentemente do marido, que ficou impassível, ela diz que passou a manhã procurando nos rostos das crianças os traços de sua família. Os olhos brilham quando diz que achou uma. "Até me arrepiei quando vi uma menina que é a cara do meu filho. Fiquei pensando se não era ela", diz.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.