São Paulo, sábado, 24 de março de 2007

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Sem estrutura, parque da Bocaina padece

Com 104 mil hectares, área é a segunda maior reserva de mata atlântica do país, mas tem verba anual de apenas R$ 50 mil

Com somente um veículo, os sete fiscais não conseguem controlar o desmatamento provocado por fazendeiros cujo gado pasta no parque

MARIO HUGO MONKEN
ENVIADO ESPECIAL A SÃO JOSÉ DO BARREIRO (SP)

Sete fiscais e um veículo para patrulhar uma área de 104 mil hectares. Uma verba anual de apenas R$ 50 mil da União. Essa é a situação hoje do Parque Nacional da Serra da Bocaina, que fica na divisa entre o Rio de Janeiro e São Paulo.
O parque é a segunda maior reserva de mata atlântica do país -a primeira é o parque estadual da Serra do Mar, em São Paulo, com 315 mil hectares.
A precária estrutura tem trazido conseqüências graves. O número reduzido de fiscais não é capaz de controlar o desmatamento, principalmente o provocado por fazendeiros cujo gado pasta dentro do parque.
Um levantamento da ONG SOS Mata Atlântica revela que apenas 7% desse tipo de floresta ainda se mantém preservada. Estima-se que, na Bocaina, haja cerca de 1.500 cabeças de gado.
O pior é que, sem pessoal, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), órgão responsável pela reserva, não tem como fazer o diagnóstico sobre o percentual de mata preservada na Bocaina.
No último sobrevôo no parque, no fim do ano passado, constatou-se que ao menos 30 áreas estão sob risco, mas não foi calculado o tamanho da região afetada. O diretor da unidade, Dalton Novaes, se diz preocupado. "Se continuarmos assim, o parque poderá ser dividido e perderemos a cobertura contínua de mata atlântica."
Entre 2002 e 2005, o parque perdeu cerca de mil hectares (equivalente a mil campos de futebol) de floresta devido às queimadas. Entretanto, segundo Novaes, esse dado é ínfimo, porque representa só os cinco meses (junho a outubro) de cada um dos anos em que houve controle das queimadas. Esse é o período anual em que uma brigada de incêndio atua na reserva por causa da falta de chuva. As punições para os culpados são raras. Segundo os fiscais, 86% dos incêndios têm causas desconhecidas.

"Parque de papel"
O parque da Bocaina foi criado por decreto federal em 1971. Ele passa por seis municípios: Cunha, Areias, Ubatuba e São José do Barreiro, em São Paulo; Parati e Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. Inicialmente, o objetivo era criar uma espécie de cinturão contra um eventual acidente na usina nuclear de Angra dos Reis. Para Novaes, devido à falta de estrutura, "a Bocaina é ainda um parque de papel". O parque só tem uma sede, em São José do Barreiro, e uma portaria, em Cunha. Praticamente não há controle sobre a entrada e a saída de pessoas.
A pequena verba não consegue custear nem os serviços essenciais. Na semana passada, os telefones da sede estavam cortados por falta de pagamento. "Essa verba é uma piada", disse o analista ambiental Marcelo Guena, fiscal do parque.
Outro problema é a questão fundiária. Quando o parque foi criado, muitas famílias já moravam no local. Para poder retirá-las, o governo tem de indenizá-las. Segundo funcionários, a última vez em que indenizações foram pagas foi em 1985. O Ibama não tem estimativa sobre o número de famílias que vivem no parque. O último dado, de 1976, falava em 422.
Na região de Mambucaba, em Angra dos Reis, por exemplo, o bairro pobre de Boavista, que fica às margens da rodovia BR-101, se formou no parque. Também não há dados sobre construções irregulares.
Dentro do parque, não há serviços que auxiliem seus freqüentadores. Não há placas informando sobre os pontos turísticos ou qualquer orientação sobre as trilhas existentes. A principal atração da Bocaina é a Trilha do Ouro, uma estrada de blocos de pedra construída no século 18 por escravos que levavam o ouro de Minas Gerais até o porto de Parati. Outro ponto é a praia do Caixadaço, em Parati, que vem sendo degradada em razão da construção de quiosques e hotéis.
A ausência de estrutura na Bocaina não tem trazido bons frutos para o turismo na região. Funcionários contaram que, em média, 7.000 pessoas visitam o parque num ano.
Um dos principais hotéis nas redondezas do parque, o Porto da Bocaina, estava vazio na semana passada e só deverá ter hóspedes na Semana Santa, no início de abril.
A falta de pessoal traz outros problemas para a fiscalização. Os fiscais só patrulham o parque de duas em duas semanas. Quando não estão na floresta, têm de ajudar nos serviços burocráticos na sede. "Precisaríamos de, no mínimo, 20 fiscais e 4 viaturas para poder trabalhar", disse Dalton Novaes.


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