São Paulo, segunda-feira, 24 de março de 2008

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Folheto ensina jovem a lidar com abordagem policial

Guia criado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos será distribuído nos 14 Estados que têm ouvidorias de polícia

Público-alvo são os jovens de periferia; presidente do Movimento Nacional de Direitos Humanos não vê cartilha como algo eficaz

EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Por meio da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, o governo federal irá distribuir a partir do mês que vem 1 milhão de exemplares de um minifolheto com o seguinte título: "A polícia me parou. E agora?".
O objetivo, estampado abaixo do título e de um grande ponto de interrogação, é explicar "como se comportar e quais são os seus direitos diante de uma abordagem policial". O público-alvo são os jovens, em especial os de periferias.
Ao abrir o folheto, esse jovem terá, no lado esquerdo, algumas dicas sobre o que fazer durante a abordagem. Entre elas: "fique calmo e não corra" e "deixe suas mãos visíveis e não faça nenhum movimento brusco".
Do lado direito, vem a lista de "direitos" numa abordagem, como "saber a identificação do policial", "ser preso apenas por ordem do juiz ou em flagrante" e "não ser algemado se não estiver sendo violento ou tentando fugir da abordagem".
Para Isabel Figueiredo, diretora nacional do Programa de Apoio Institucional às Ouvidorias de Polícia e Policiamento Comunitário, vinculado à Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência, o objetivo é esclarecer dúvidas da população.
"Nada é contra a polícia, muito pelo contrário. É fruto de abuso [policial], mas, além disso, é fruto de dúvida mesmo. Às vezes as pessoas não conhecem as coisas básicas", afirma. O panfleto será distribuído nos 14 Estados que já têm ouvidorias de polícia -do Sul (RS, PR e SC) e do Sudeste (SP, RJ, ES e MG), além de MT, GO, PE, RN, CE, PA e BA.
Rosiana Queiroz, coordenadora nacional do MNDH (Movimento Nacional de Direitos Humanos), mostra-se descrente com a eficácia do folheto.
"Eu sinceramente desconfio dessas orientações. Não que a idéia não seja boa, mas eu desconfio da eficácia disso para uma abordagem policial", diz. "A modificação de uma abordagem policial depende de repensar a polícia, sua estrutura, a concepção militaresca, a forma de selecionar policiais, formá-los, orientá-los e dar um bom salário a eles. Precisa fazer uma investigação sobre quais policiais estão envolvidos com o crime organizado."

Preconceito racial
O bancário Rômulo Vinícius Martins, 28, não guarda boas recordações da polícia. Ele já foi parado seis vezes por policiais e, em cinco delas, foi tratado com agressividade. "Depois disso, tomei um ódio enorme de policial. Não consigo nem confiar nem gostar deles." Ele conta que uma vez estava com dois amigos na avenida Sumaré (zona oeste de SP) quando um carro da
Polícia Militar parou perto deles. "Eles apontaram a arma para a gente e começaram a gritar. Depois, nos empurraram com força contra a parede para fazer a revista." Segundo ele, os policiais falavam com voz alta e violenta. Também utilizavam palavrões. "Perguntamos por que tinham nos parado. Disseram que nossa atitude era suspeita, mas não explicaram o por quê."
Apesar de considerar que houve abuso por parte dos policiais, Martins disse que não denunciou o fato por considerar que não resolveria o problema. "Vou prestar queixa por quê? Ainda mais na delegacia em que eles trabalham", afirma. "Tenho mais medo de polícia do que de andar em bairro perigoso sozinho à noite."


Colaborou TALITA BEDINELLI


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