São Paulo, quarta-feira, 24 de abril de 2002

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AMBIENTE

Bairro de São Paulo tem aldrin, considerado cancerígeno, numa quantidade cerca de 1.320 vezes acima do limite

Shell admite megaconcentração de pesticida

Matuiti Mayezo/Folha Imagem
Caminhão da Shell na área da Vila Carioca (zona sul de São Paulo)


MARIANA VIVEIROS
DA REPORTAGEM LOCAL

Representantes da Shell admitiram ontem que as concentrações de drins (pesticidas tóxicos) no solo de parte da área contaminada pela empresa na Vila Carioca (zona sul de SP) chegam a ser até mais de 2.450 vezes superiores a parâmetros internacionais.
No caso do aldrin, por exemplo, a quantidade registrada está 1.320 vezes acima do limite máximo estabelecido pela Cetesb (agência ambiental do governo paulista) para áreas industriais no Estado.
A exposição aos drins já foi relacionada a disfunções de aprendizado e interrupção dos sistemas nervoso central e hormonal, com preocupação particular em relação a crianças e fetos.
Pesquisas da Escola de Saúde Pública de Harvard (EUA) demonstram o potencial carcinogênico (de causar tumores malignos) desses produtos, afirma o Greenpeace, que participou da denúncia de contaminação na Vila Carioca e acompanhou o caso do condomínio Recanto dos Pássaros, em Paulínia (126 km de SP), onde os drins atingiram a água e chegaram a moradores da região.
No caso da capital paulista, ainda não existem evidências da contaminação dos lençóis subterrâneos. A Shell faz estudos desde 2001 e diz que já está retirando as borras dos produtos do solo.
No local, chegaram a ser retiradas amostras que tinham 6.600 miligramas de aldrin por quilo de solo seco. O valor de intervenção -que indica um nível de comprometimento do solo acima do qual há riscos para a saúde e para o ambiente- é de 5 mg/kg, segundo o Relatório de Estabelecimento de Valores Orientadores para Solos e Águas Subterrâneas, publicado em 2001 pela Cetesb.
O isodrin foi encontrado numa concentração ainda mais expressiva: 9.800 mg/kg de amostra seca. Embora a Cetesb não tenha parâmetro específico para o produto, a Agência Ambiental da União Européia estabelece o limite de intervenção para o total de drins em 4 mg/kg de matéria seca. O padrão é adotado na Holanda, país de origem da Shell.
Até então, a empresa não admitia que fosse responsável pela contaminação, apesar de ser a única a produzir drins no mundo.
Os dados sobre as concentrações constam de documento da CSD-Geoclock, contratada pela Shell para fazer a avaliação e reparação dos danos ambientais, e são citados no relatório do engenheiro Élio Lopes dos Santos, especialista do Ministério Público que avaliou a área. A contaminação é alvo de uma ação civil pública proposta pela Promotoria de Meio Ambiente da Capital.
Ao todo, cerca de 180 mil m2 (o equivalente a 25 campos de futebol) estão com o subsolo e as águas subterrâneas poluídos por outros produtos tóxicos, como benzeno e chumbo. Há risco potencial para até 30 mil pessoas.
No local, a Shell mantém uma base de armazenamento de combustíveis e produziu pesticidas do fim dos anos 40 até meados dos anos 70, quando essa atividade foi transferida para Paulínia.

Autuação
A Vigilância Sanitária autuou na tarde de ontem a Shell pela contaminação na Vila Carioca. A empresa tem dez dias corridos para apresentar ao órgão documentos sobre os danos ambientais e exames de saúde dos funcionários. Caso isso não aconteça, poderá ser multada ou até interditada.
A Vigilância também realizará, com auxílio da Vigilância Epidemiológica, um estudo nas unidades de saúde da região para avaliar se há indicativos de doenças que possam ser relacionadas às substâncias encontradas. Só depois decidirá se faz ou não exames laboratoriais na população.



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