São Paulo, quarta-feira, 24 de maio de 2000


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VIOLÊNCIA
Uma creche e quatro colégios protegem as crianças quando há fugas no 48º Distrito Policial, em Capela do Socorro
Escolas da periferia têm "plano de guerra"

GABRIELA ATHIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

A violência em São Paulo, aliada à superlotação carcerária, está fazendo com que escolas vizinhas ao 48º Distrito Policial (DP), em Capela do Socorro (zona sul), elaborem um "plano de guerra" para proteger os alunos quando os presos se rebelam, fogem ou são resgatados de dentro da carceragem.
"Até hoje só não ocorreu uma desgraça por milagre", disse o delegado-assistente do 48º DP, William Moitinho Navarro, que presenciou as três últimas tentativas de fuga e de resgate de presos em menos de seis meses.
Essa situação, que poderia ser rotina para crianças de países que vivem em estado de guerra declarado, atinge 6.954 alunos matriculados nas quatro escolas localizadas no entorno do DP, entre elas a Creche Municipal Coronel Geraldo de Arruda Penteado, com 98 alunos de até 6 anos.
A creche e a Escola Estadual Laerte Ramos de Carvalho são "vizinhas de muro" com o DP e os fundos da Escola Adventista de Interlagos está a poucos metros da delegacia (veja arte).
O "plano de guerra" da creche envolve crianças e funcionários. Os alunos são recolhidos do pátio com as mãos na cabeça e levados para as salas de aula. Dependendo do caso, abaixam-se para reduzir os riscos de serem vítimas de bala perdida. O que não dá para reduzir, dizem psicólogos, é o dano emocional que isso causa às crianças: "elas ficam apavoradas", disse a diretora, Iracema Simões.
Depois de se certificar de que todas as crianças estão trancadas nas classes, os funcionários, explica Iracema, abrem os dois portões da casa para facilitar a fuga dos presos, diminuindo o tempo que eles passam dentro da creche.
Márcia Alux, diretora do Laerte Ramos de Carvalho, com 2.400 alunos, também orienta as professoras a fechar os alunos nas classes e trancar os cadeados dos portões que permitem o acesso da quadra para a escola.
No caso do Laerte, quando os presos pulam o muro do DP (o que ocorre com certa frequência) eles caem dentro da quadra, frequentada diariamente por 120 alunos.
Alguns espaços da escola lembram um presídio. Os corredores que levam às quadras são protegidos por portões de ferro que vão do chão ao teto. Tanto pânico não é sem motivo. A carceragem do 48º DP, com capacidade para 25 presos, abriga uma média de 150 e, nos últimos tempos, os detentos vêm protagonizando fugas cada vez mais ousadas. "Isso começou desde que passamos a abrigar ladrões de banco e traficantes", diz o delegado-assistente.
No sábado, 13, um grupo entrou na delegacia para resgatar dois assaltantes de banco, renderam funcionários, houve troca de tiros e 144 detentos fugiram.
Antes disso, no dia 11 de julho de 99, um grupo entrou na delegacia também para resgatar presos e houve troca de tiros. A situação repetiu-se no dia 30 de dezembro, por volta das 8h30, quando um investigador foi metralhado nas pernas.
A série de fugas consideradas ousadas começou em 93, quando os presos cavaram um túnel até a creche e conseguiram fugir. No resgate do dia 30 de dezembro, as grades das celas foram destruídas e até hoje não foram repostas. Os presos estão contidos apenas por uma porta de ferro, uma corrente e um cadeado.


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