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Foragido da Justiça, Hosmany Ramos lança livro de ficção
Cirurgião plástico condenado por homicídio, roubo de joias e carros, tráfico e contrabando afirma estar na França e diz viver com dinheiro de direitos autorais
Henrique Manreza/Folha Imagem
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Cirurgião Hosmany Ramos, foragido da Justiça, lança livro |
PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL
O cirurgião plástico Hosmany Ramos não gosta de ouvir, mas o enredo de sua vida é
muito mais intrigante do que o
de "O Goleador -Morte e Corrupção no Futebol", romance
policial que chega às livrarias
na semana que vem e no qual
ele conta a história do assassinato de um cartola do futebol.
No livro, a principal suspeita
do crime é uma alpinista social
-linda e sedutora-, centro de
um triângulo amoroso que envolve o cartola e uma estrela do
futebol, Rony Lee. Este, a dada
altura, é surpreendido com um
garoto de programa, no carro.
"Qualquer semelhança é mera coincidência: o próprio craque [Ronaldo] foi parar em um
motel com três travestis", afirma Hosmany, que, em óbvias
alusões à vida real, batizou um
dos figurões do futebol de Richard Peixeira e chamou um
banqueiro de Henrique Salles.
Foragido desde janeiro,
quando deixou a cadeia para
passar o Natal com a família e
não voltou, Hosmany, 61, foi
condenado a 47 anos de prisão
por homicídio, roubo de joias e
carros, tráfico e contrabando.
Em entrevista por Skype, o
médico diz que está "em Paris".
A Folha apurou que, na verdade, ele passa temporada na casa
do filho, Erik, na Noruega.
Diz que vive na Europa com
o dinheiro dos direitos autorais
de seus livros (o último, "Delitos Obsessivos", de 2005, vendeu 34 mil exemplares).
FOLHA - Perto do enredo da sua vida, a trama do livro é quase infantil.
Acha mais fácil viver no crime do
que escrever um romance policial?
HOSMANY RAMOS - Como você
sabe, eu não vivo no crime, eu
escrevo livros. O crime é coisa
do passado. É preciso separar o
joio do trigo, coisa que jornalista não faz. Fica misturando as
estações, "Ah, é crime, é crime".
FOLHA - O crime é "coisa do passado" na sua cabeça: o sr. é foragido.
HOSMANY - Presta atenção: esse lance de foragido é algo discutível. A Justiça brasileira é
tão irresponsável... Eu li na Folha que a advogada da [Suzane
von] Richthofen ganhou não
sei quantos anos de remissão
de pena. Tô há mais de dez anos
solicitando remissão, mas eles
não consideram trabalho escrever livros. Já cumpri minha
pena [está preso desde 1981,
com intervalo de uma fuga, em
1996, quando se envolveu em
um sequestro e voltou]; saí agora pois tinha problemas de saúde e o atendimento médico era
precário: ou saía, ou ia morrer.
FOLHA - O sr. e muitos outros?
HOSMANY - [Como se não tivesse ouvido] Então, eu vou te diz...
FOLHA - ...A solução, então, é todo
mundo abandonar a prisão...
HOSMANY - Você leva pra esse
lado, mas a prisão não te dá
condições. Eu, graças a Deus,
fui aceito pelos meus livros e
pude reconstruir minha vida.
FOLHA - No livro o sr. aborda temas
como bissexualismo, pedofilia e
adultério. Tem experiência em alguma dessas práticas?
HOSMANY - É um livro...mas, se
você for ver o próprio craque
[Ronaldo], foi parar em um motel com três travestis.
FOLHA - Atualmente o sr. namora,
transa com quem?
HOSMANY - Tô refazendo minha vida sem pressa. Vai acontecer na hora certa. Não estou
aposentado nesse sentido.
FOLHA - O sr. viveu bem o desbunde dos anos 70 no Rio. Usou aquelas
referências no livro?
HOSMANY - Quando você escreve procura conduzir o leitor da
primeira à última página, senão, fica chato. Você pega o livro do Paulo Coelho, "As Valquírias", não consegue passar
da oitava página.
FOLHA - O sr. pensa em ficar rico
com livros?
HOSMANY - Todos nós escrevemos para dar vazão a essa parte
intelectual interior. Mas, se dá
pra atingir uma boa vendagem,
isso é bem vindo.
FOLHA - Quanto tempo o sr. levou
pra concluir o livro?
HOSMANY - Ele está na minha
cabeça desde a Copa de 98. Tínhamos o melhor time, o Ronaldo estava na melhor fase,
excelente forma física, e aconteceu aquilo. Não foi por acaso.
A França era a dona do estádio,
precisava ganhar pra deslanchar o crescimento do esporte
lá. Isso tudo leva uma mente
fértil a imaginar que aconteceu
uma maracutaia.
FOLHA - Pretende continuar a exercer a medicina. Ainda pode exercer?
HOSMANY - Claro que posso.
Tanto que eu exerci dentro do
sistema penal. Na rebelião de
Araraquara, quando havia
1.600 presos, tratei de muitos
deles. Continuo médico, não
perdi meu diploma [o CRM diz
que Hosmany não foi cassado,
mas seu registro foi cancelado,
o que significa que ele pode voltar a exercer a profissão desde
que atualize os papéis]. Mas
agora eu tô acreditando muito
nessa possibilidade literária.
FOLHA - Isso vai ser suficiente para
o seu sustento em Paris?
HOSMANY - Escuta, você sabe
quantos livros eu tenho? Dois
de grande vendagem na Gallimard e quatro na Geração.
FOLHA - Vendeu quanto?
HOSMANY - É investigação policial ou matéria? [A editora diz
que "O Goleador" recebeu encomendas de 6.000 exemplares]. Você faz perguntas que
não têm a ver com o livro. As
pessoas querem saber do livro.
FOLHA - Sua história provoca mais
curiosidade.
HOSMANY - Não quero mais dar
entrevistas para pessoas despreparadas que me espremem
na parede e descambam para o
sensacionalismo barato.
FOLHA - O sr. saiu do Brasil em um
indulto de Natal e não voltou. Isso
estava planejado?
HOSMANY - Vivia sem segurança [na cadeia]. Agora, estou perto do fim da minha caminhada,
não vou morrer de graça.
FOLHA - Como saiu do país?
HOSMANY - Peguei um veleiro
até a Ilha do Diabo, depois, outro até Portugal [a Folha apurou que ele saiu direto para a
França, de avião, com um passaporte falso]. Fiquei quase
dois meses nessa viagem.
FOLHA - Sabe velejar?
HOSMANY - Não [impaciente].
As pessoas [a tripulação] precisam de médicos em uma empreitada assim.
FOLHA - E o passaporte?
HOSMANY - Não tenho. Cheguei
em Portugal, desci lá, fui até a
Espanha de carona, depois até a
França sem nenhum papel.
FOLHA - Como o sr. passou de um
país para outro?
HOSMANY - Ahá, você passa hôhô. Pela estrada é fácil.
FOLHA - Mas tem a imigração...
HOSMANY - Determinadas horas dá pra passar....Bem, mas
agora vou terminar essa temporadinha na França e vou
prum outro país, tentar ver se
consigo reabertura do meu caso num tribunal internacional
e mandar uma carta pro Lula,
explicando minha situação para ele ver que estou trabalhando honestamente, que não quero voltar pra cadeia em São
Paulo, a cadeia do José Serra
[governador de São Paulo], para amanhã morrer de graça.
FOLHA - O sr. mantém contato com
a alta sociedade carioca?
HOSMANY - Não estou nem interessado nisso. Olha, acabou,
não tenho mais nada a dizer...
FOLHA - Há um tempo o sr. disse
que iria fazer um curso de explosivos no IRA?
HOSMANY - Pelo amor de Deus,
se põe numa posição decente,
você tá fazendo uma entrevista
intelectual. O IRA nem existe
mais, você deveria saber...
FOLHA - Foi o sr. quem disse. De repente conseguiu outro organismo...
HOSMANY - Olha, você me desculpe, mas o que eu poderia falar com você já acabou...
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