São Paulo, sexta-feira, 24 de julho de 2009

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80% recusam atendimento na cracolândia

Até o fim da tarde, só 66 das 332 pessoas abordadas haviam concordado em passar por avaliação médica em posto de saúde

Agente de saúde que participa da operação diz que mesmo os que aceitam ser atendidos acabam voltando para a região, às vezes no mesmo dia


Apu Gomes/Folha Imagem
Consumidores de crack se concentram na praça Julio de Mesquita,
na região central de São Paulo, na madrugada de ontem


CONRADO CORSALETTE
DA REPORTAGEM LOCAL

Cerca de 80% dos moradores de rua -a maioria consumidores de crack- abordados por agentes de saúde nos dois primeiros dias da ação na cracolândia recusaram atendimento. Boa parte dos que passam o dia nessa região do centro de São Paulo nem sequer responde a perguntas das equipes.
Até o final da tarde de ontem, os agentes haviam feito 332 abordagens. Sessenta e seis pessoas concordaram em ir para postos de saúde passar por avaliação médica. Doze precisaram ser internadas. Segundo o auxiliar de enfermagem Taylon Ramos, que atua na base das equipes de saúde, mesmo os que aceitam ser atendidos acabam voltando, às vezes no mesmo dia, para a rua. "Normalmente eles vão, tomam banho e retornam."
Agentes de saúde disseram que a presença ostensiva da polícia retrai ainda mais os usuários de crack. Eles dizem que é preciso obter a confiança dos viciados, o que leva tempo. A Folha presenciou cinco abordagens e só uma pessoa aceitou atendimento. Na av. Duque de Caixas, uma mulher com cerca de 40 anos, questionada se estava disposta a ir até o posto de saúde, respondeu: "Hoje não vou, não. Hoje vou ficar aqui fumando [crack]".
De manhã, uma jovem de 15 anos foi retirada do gramado da estação Júlio Prestes. Ela disse estar ali havia três dias, sem conseguir se mover. Segundo os agentes, ela tem tuberculose e é viciada em crack. A nova intervenção do Estado e da prefeitura, batizada de Ação Integrada Centro Legal, prevê internação em hospitais por até 30 dias de pessoas com doenças graves, problemas psiquiátricos e dependentes químicos. As internações podem ser voluntárias, involuntárias após diagnóstico ou compulsória, via ordem judicial.
Segundo coordenadores da operação, há 60 leitos em hospitais estaduais e municipais preparados para esse fim. A prefeitura diz que, após a internação, viciados serão encaminhados a centros de tratamentos de dependentes químicos. Parte dos 120 agentes está na cracolândia desde janeiro. Desde quarta-feira, eles têm feito abordagens das 9h às 22 h.
A ação de saúde é acompanhada pela polícia. São 70 homens que, diz o comando da PM da região central, ficarão na cracolândia e imediações por tempo indeterminado.

Promotora
A promotora de Justiça Laila Shukair enviou ofício à prefeitura pedindo informações sobre a intervenção na área. Laila defende que, em alguns casos, a internação de viciados seja compulsória. "Adianta chegar no cara que bebeu, fumou, que está "babando", e perguntar se quer ser internado?"

Colaborou JOSÉ ERNESTO CREDENDIO, da Reportagem Local



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