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REFERENDO/REPERCUSSÃO
Para líderes da campanha, crise política interferiu no resultado da votação; frente vai defender restrição à exportação de armas
"Sim" vê voto de protesto contra governo
DA REPORTAGEM LOCAL
Os líderes da campanha pelo
"sim" no referendo apontaram
ontem a crise política e as acusações contra a gestão Lula como
um dos fatores que interferiram
no resultado da votação.
O governo era um dos apoiadores da proibição da venda de armas e, na avaliação deles, a frente
do "não" usou isso para tentar fixar a idéia de que a administração
petista queria tirar os focos do escândalo do "mensalão" e da falta
de investimentos em segurança.
"Quem votou "sim" votou por
uma ojeriza às armas. O voto do
"não" acabou sendo um voto de
capitalização do desencanto, do
protesto, da falta de confiança no
governo, nas instituições, na polícia, na segurança, no que está aí",
disse Rubem Cesar Fernandes,
coordenador da ONG Viva Rio.
"O índice de reprovação do Lula
e de aprovação do "não" são muito
semelhantes. O referendo, se tivesse acontecido dois meses antes
ou três meses depois, era outra
coisa. O contexto político prejudicou muito e a campanha do "não"
soube explorar isso com muita
competência", afirmou Denis
Mizne, do Instituto Sou da Paz.
Mizne ressalva que a opinião
dele não significa uma rejeição ao
apoio dado pelo governo petista.
"Fiquei feliz com isso. Todas as
grandes lideranças responsáveis
do Brasil nos apoiaram", disse.
"O grande adversário do "sim"
não foi o "não", mas o PT e o governo", afirmou à Folha Raul
Jungmann (PPS-PE), deputado
da frente favorável à proibição do
comércio de armas e munições.
Jungmann disse temer a tendência de uma "maré conservadora" devido à vitória do "não".
O prefeito de São Paulo, José
Serra (PSDB), disse ontem que
"muita gente que vota "não" protesta contra as precárias condições de segurança no Brasil". Ele
afirmou ter votado "sim".
Questionado se os votos no
"não" sinalizavam insatisfação
com a Presidência da República,
Serra disse que era difícil afirmar
isso com segurança. "Eu acho que
não está claro isso", declarou.
Eleições de 2006
Os defensores do "sim" no referendo avaliam que a segurança
pública vai pautar as eleições de
2006 e que a discussão do tema fez
da consulta popular uma iniciativa útil -apesar de seus gastos.
"Mas quem obrigou a ter referendo foi a turma do "não", que
impediu a aprovação no Congresso. Quem criou isso foram eles",
afirmou Mizne, acrescentando
ainda que a luta pela proibição do
comércio de armas começou em
1997, com as ONGs, e depois ganhou espaço no governo tucano
de Fernando Henrique Cardoso.
Eles também apontaram falhas
na campanha de TV e tempo curto para discussões como razões
que prejudicaram a frente do
"sim". "É lamentável que tenha sido na correria, um tempo tão curto. A crise política abafou esse assunto. Formar uma opinião em 20
dias não é fácil", disse Fernandes.
"No meio da guerra, normalmente as pessoas tomam decisões
irracionais", disse Mizne, citando
a reeleição de Bush nos EUA como exemplo e citando que a votação do "não" teve a insegurança
pública como cabo eleitoral.
Apesar de admitir os erros, a
frente do "sim" não esperava a diferença de votos apontada nos
primeiros resultados divulgados
ontem -ou seja, as mudanças na
campanha de TV não evitaram a
evolução do voto no "não". Mesmo assim, diziam que os mais de
30 milhões de votos no "sim" já
representavam algo de positivo.
Novas propostas
O representante do Sou da Paz
disse que vai tentar reunir os representantes da frente do "sim" e
propor ao Congresso Nacional
um pacote pela diminuição do
contrabando e responsabilização
da indústria de armas pelas vendas fraudulentas.
"Quero saber se a bancada do
"não" vai defender a indústria ou a
população. Afinal, eles disseram
na campanha que os problemas
não estavam na venda legal, mas
no contrabando", disse.
Uma das idéias, afirmou ele, é
proibir a exportação de armas
"para países que não têm controle, como Paraguai, Bolívia, Colômbia, Uruguai, Argentina". Assim, impediria que elas retornassem ao Brasil contrabandeadas.
Jungmann afirmou ser favorável a discutir a vinculação de recursos para investimentos em segurança, como já ocorre com os
setores de saúde e educação.
A sugestão é avalizada pelo líder
da frente parlamentar Brasil sem
Armas, Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, que já
fez proposta de emenda constitucional sobre esse tema.
Calheiros afirmou que "pesou
na decisão" do referendo a "omissão voluntária do governo federal
em relação aos investimentos na
área de segurança pública".
Ele ainda fez duras críticas à
condução da campanha do "sim"
no rádio e televisão. "A campanha
deles foi melhor focada e a nossa
não reagiu na hora". Para Calheiros, os depoimentos de artistas,
que marcaram os programas iniciais, "eram frios".
O governador Geraldo Alckmin
(PSDB) também declarou seu voto no "sim", mas enfatizou que
precisar haver combate ao contrabando de armas com mais
energia nas fronteiras do país.
"O tráfico de armas tem que ser
combatido independentemente
do problema de comércio", disse.
"Voto "sim" não porque entenda
que isso vá resolver os graves problemas de segurança que afligem
nosso tempo, mas pode contribuir um pouco. Quem está preparado para andar armado é a polícia. É importante que as pessoas
não andem armadas", afirmou.
(ALENCAR IZIDORO, VICTOR RAMOS, LUÍSA BRITO e MÁRVIO DOS ANJOS)
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