São Paulo, segunda-feira, 24 de outubro de 2005

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REFERENDO/REPERCUSSÃO

Líderes do grupo parlamentar defendem consultas populares para discutir outros temas, como idade penal e proibição total do aborto

Frente do "não" agora quer prisão perpétua

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA REPORTAGEM LOCAL


Antes mesmo do fechamento das urnas, mas já certos da vitória no referendo, líderes da frente parlamentar do "não" passaram a defender a realização de novas consultas populares para discutir temas como a idade penal mínima e a prisão perpétua.
O presidente da frente parlamentar Pelo Direito da Legítima Defesa, deputado Alberto Fraga (PFL), propôs a realização de plebiscitos para acabar com a idade penal, proibir totalmente o aborto e instaurar a prisão perpétua.
Para ele, não deve existir idade penal mínima. Fraga defende que cada caso seja analisado por um conjunto de especialistas, que definiriam se o acusado pode ser responsabilizado penalmente -independentemente da idade. "Uma pessoa de 12, 13 anos, se sabe o que está fazendo, tem de ser julgada", disse. Hoje a maioridade penal no país é de 18 anos.
O deputado Luiz Antônio Fleury Filho (PTB-SP), vice-presidente da frente, também se disse favorável ao uso de plebiscitos para discutir idade penal e a questão do aborto. Fleury, no entanto, defendeu que a idade mínima para a responsabilidade penal seja apenas reduzida, passando dos atuais 18 anos para 16 anos.
Os líderes do "não" também aproveitaram o dia de votação para criticar o Congresso Nacional, as políticas de segurança pública no país e o governo federal.
Depois de o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) começar a divulgar os resultados da apuração, Fraga afirmou que a crise no governo causada pelo "mensalão" foi 50% responsável pela vitória do "não" no referendo.
"O Estatuto [do Desarmamento, regulamentado em julho de 2004] dificulta, restringe, mas não proíbe. Mas eles queriam mais. Exatamente parlamentares envolvidos no mensalão queriam mais, queriam tirar um direito do cidadão", afirmou Fraga.
Para o deputado, parte dos votos favoráveis à manutenção do comércio de armas teve como componente a insatisfação popular com o governo, que enfrenta sua pior crise desde o início do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva -o petista e seus principais assessores defenderam o "sim". "São votos de protesto."
O deputado, que disse andar sempre armado com pistola calibre 40 e não ter medo de ser chamado de membro da "bancada da bala" na Câmara, afirmou ter sido contra o referendo. Fraga afirmou que a frente gastou de R$ 1,3 milhão a R$ 1,5 milhão na campanha, mas arrecadou apenas R$ 400 mil. "Não vamos dar o calote, vamos pagar tudo".
Na avaliação de Fraga, a campanha do "sim" era enganosa. "Foram 1.044 armas vendidas dentro do comércio doméstico do Brasil, mas diziam que eram 50 mil quando contavam as armas fornecidas à polícia e a empresas de segurança. Isso é tentar enganar a sociedade", afirmou.
Segundo o deputado, a expectativa da frente era obter uma vantagem de 16 pontos percentuais sobre o "sim". Ele disse nunca ter acreditado que seus adversários estivessem com 80% das intenções de votos, como chegou a ser constatado em pesquisas no início da campanha do referendo.
Para o deputado Fleury, o fato de o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, ter se posicionado favoravelmente à proibição do comércio de armas "pode ter contribuído" para o crescimento do "não". O deputado afirmou que irá pedir uma audiência com o ministro para discutir políticas nacionais de segurança pública.
"Esse foi também um voto de protesto contra a falta de políticas de segurança pública tanto em nível federal quanto nos Estados."
Fleury, que se disse surpreendido com a larga vantagem que os eleitores deram para o "não", afirmou que é importante que se aproveite o momento, em que o "país inteiro" debateu sobre a questão da segurança pública, "para que os governos passem a colocar a questão como prioritária. O tema sempre foi considerada um "patinho feio'".
Ontem, logo após votar em São Paulo, Fleury aproveitou para criticar também o fato de o referendo ter sido marcado para este ano. "Tínhamos uma proposta de fazer o referendo na época das eleições." Para o deputado, seriam economizados recursos -gastos com a Justiça Eleitoral, por exemplo- que poderiam ser utilizados em segmentos "como educação ou a própria segurança".
Alberto Fraga ainda chamou de "covardes" parte dos congressistas, por deixarem o tema sobre a venda de armas, um assunto "técnico", para ser decidido pela população. "Não é justo o povo ter de responder a uma questão tão técnica por omissão, por covardia de muitos no Congresso."

Filho e revólver
Ao chegar para votar em Brasília com a mulher e os três filhos, todos vestidos com camisetas pretas do "não", Fraga foi cumprimentado por eleitores. Alguns pediram para tirar fotos. Com cara de sono, ele disse que não tinha nem conseguido dormir direito à noite. Fraga contou que já mostrou várias armas para seu filho menor, de cinco anos, justamente para que a criança saiba que não pode mexer, porque é perigoso. Além do caçula, acompanharam o deputado a mulher, Mirta, e os filhos Diego, 23, e Bruna, 18.


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