São Paulo, quarta-feira, 25 de janeiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VIOLÊNCIA

No imóvel na favela Parada de Lucas teriam sido torturados e mortos oito jovens seqüestrados em Vigário Geral

Polícia encontra suposta "casa da tortura" no Rio

Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
Com o rosto coberto, sobrevivente de seqüestro em Vigário Geral participa da reconstituição do crime


TALITA FIGUEIREDO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DO RIO

A polícia encontrou ontem, na favela Parada de Lucas (zona norte do Rio), a casa onde os oito jovens desaparecidos na favela vizinha Vigário Geral, em 13 de dezembro, teriam sido torturados e mortos. No local foram achados vestígios de sangue.
À noite, seria feito teste com a substância luminol, que pode identificar sangue mesmo que o lugar tenha sido lavado.
Os policiais encontraram o lugar durante a reconstituição do crime, feita com ajuda de um recruta da Marinha, sobrevivente da chacina. O rapaz foi libertado depois de acompanhar parte da tortura porque conseguiu provar que era marinheiro e não tinha ligação com o tráfico da favela de Vigário Geral, rival de Lucas.
A suspeita de que os corpos estariam dentro de um valão que fica atrás das duas favelas não poderá ser confirmada. Técnicos da Serla (Fundação Superintendência Estadual de Rios e Lagoas) estiveram no local e constataram que os equipamentos não conseguem chegar ao local: são muito grandes e pesados para passar pelas vielas estreitas da favela.
A busca com mergulhadores dos bombeiros também foi cancelada, já que a poluição e a quantidade de plantas que há ali põe a saúde deles em risco.
A polícia investiga ainda a possibilidade de os corpos terem sido enterrados em uma casa a menos de 50 m da divisa entre as duas favelas. A polícia escavou um pequeno buraco ontem e deverá continuar as buscas hoje.
"Encontrei o casaco do meu filho em frente a esta casa e a calça de um outro rapaz que também foi seqüestrado. Dentro da casa havia um saco de cimento e, num dos cômodos, havia cimento fresco no chão. Eles precisam escavar aí para ver se encontram nossos filhos", pediu a mãe de Douglas Tavares, que tinha 16 anos.
A reconstituição de ontem foi continuação da que começou em dezembro e foi feita apenas em Vigário Geral. Na ocasião, pouco antes de entrarem em Parada de Lucas, os delegados que acompanham o caso descobriram que policiais militares do Posto de Policiamento Comunitário soltaram o traficante conhecido como Açougueiro, preso naquela manhã. Ele seria o responsável por esquartejar os corpos.
A Polícia Civil interceptou escutas que confirmam já ter partido uma ordem de Márcio Nepomuceno, o Marcinho VP, um dos líderes do CV (Comando Vermelho), para vingar a morte dos moradores de Vigário Geral. A polícia afirma que, dos oito, cinco seriam traficantes. A Favela de Parada de Lucas é dominada pelo TC (Terceiro Comando).
Os criminosos estariam preparando um "bonde" [comboio de traficantes armados] com a participação de pelo menos 50 homens para invadir Parada de Lucas. A encomenda de morte se estenderia aos PMs do posto comunitário que fica na divisa entre as favelas. Eles receberiam pagamento que varia entre R$ 900 e R$ 1.500, por plantão, de traficantes de Lucas.
Amanhã haverá na Justiça o depoimento de acusação contra os dois PMs que teriam recebido R$ 50 mil para soltar o Açougueiro.
A polícia não descarta a participação de PMs na ação dos traficantes de Lucas. Alguns criminosos estavam fardados de PMs quando seqüestraram os oito jovens. Fardas da PM foram encontradas com um adolescente preso.

Ameaças
O advogado João Tancredo, contatado para representar algumas vítimas de famílias dos jovens desaparecidos sofreu um seqüestro relâmpago na última sexta. Ele foi solto perto da favela. Os criminosos levaram dele uma conta de telefone, onde consta seu endereço residencial, e as chaves de sua casa. Ele tem reunião marcada para hoje com uma das famílias dos jovens.
João Tancredo já advogou em diversos casos importantes, muitos com PMs como acusados. Ele representou parentes das vítimas da chacina de Vigário Geral em 1993 e da chacina da Baixada Fluminense, em março de 2005.


Texto Anterior: Polícia: Jovem que dizia ter sido estuprada confessa que forjou o próprio seqüestro
Próximo Texto: Caso Richthofen: Cravinhos podem ser julgados sem Suzane
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.