São Paulo, domingo, 25 de fevereiro de 2007

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Chefes querem ter governo como parceiro

DA SUCURSAL DO RIO

Duas propostas do chefe da milícia do complexo de Palmeirinha soam como insólitas, tendo em vista a resistência oficial ao fenômeno. Ele quer ter o poder público como principal parceiro para "melhorar a vida das comunidades" onde atua e promete até legalizar os seus serviços de segurança, para evitar a repressão.
"Gostaríamos de trabalhar em conjunto com o governo. A parte difícil já fizemos, que é expulsar e dominar o tráfico, acabar com roubos, assaltos. Queremos auxílio para administrar as comunidades da forma que o governo determine."
O líder de milícia ainda quer legalizar seus serviços e transformar as favelas em espécies de condomínios fechados. Criar e contratar empresa de segurança privada, com guardas uniformizados, por intermédio da associação de moradores; regularizar o "GatoNet" (TV a cabo com sinal furtado) e a venda de gás e carvão.
Para ele, vale abrir mão de receitas livres de impostos em troca de "tranqüilidade".
No mapa colorido de mais de um metro, montado com fotos de satélite do site Google Earth, já estão marcados os quatro pontos das futuras cancelas, "abertas das 5h às 22h", conforme inscrição a caneta.
O secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame, considera uma "bravata" a proposta do líder da milícia de legalizar seus serviços e formar empresa de segurança no local. "Ele não vai fazer isso, porque terá de pagar impostos, fundo de garantia, INSS e se estabelecer como empresário. É até uma análise mais econômica. Mas se quiser, então faça!"
A exploração de atividades como transporte irregular, venda de gás e "GatoNet" é a principal fonte de renda das milícias. Normalmente, elas herdam os negócios ilegais dos traficantes. "Tudo o que dava [dinheiro] para o tráfico passa a vir para a gente. Mas a diferença para quem dá é monstruosa", disse o chefe da milícia do complexo da Palmeirinha.
Segundo ele, o "GatoNet" é uma importante receita. "Vamos formalizar pedido à Net para legalizá-la, com custo popular para a comunidade."
A Net informou que tem projeto-piloto de TV por assinatura para 500 pessoas de baixa renda, a R$ 15, em Vila Canoas, São Conrado, no Rio, desde o ano passado. Segundo sua assessoria de imprensa, a Net estuda caso a caso as demandas e planeja expandir o projeto a outras comunidades, caso seja bem-sucedido. "É sinalização à legalização de "gato"."
Na Vila das Canoas, há um plano básico com canais abertos, um canal comunitário, um educativo/cultural, um universitário, outros regionais não-codificados, TVs Senado, Justiça, Câmara, Canal Legislativo e mais dois canais.
De acordo com o comandante da milícia do Piscinão de Ramos e Roquette Pinto, um policial civil, a tomada das comunidades pelo grupo tornou o local um ponto de encontro e atrai policiais nas horas de descanso.
"Hoje vêm muitos policiais para o piscinão. Antes já morreram muitos aqui, três agentes da PF, mais de dez PMs, quatro civis. Aqui era incrível. Hoje, tem mais de 50 policiais com a família, pode vir ver no fim de semana. Aqui virou "point"."
O policial, que diz não andar armado, nega haver cobrança de taxas aos moradores.
"Isso aqui não é milícia. Pode entrevistar quem você quiser. [Não cobro porque] Não é interessante, moro aqui, tenho satisfação nisso. Senão vou virar bandido", disse. Ele disse que não se vê ninguém fumando maconha e nos bailes funk "você não vai ver orgia, menina pelada ou arma exposta".


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