São Paulo, segunda-feira, 25 de abril de 2011

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MINHA HISTÓRIA RICARDO COSTA, 39

Arizona nunca mais

(...) "Embora saibam que sou inocente, eles querem que faça um acordo", afirma brasileiro preso desde 2008 no Arizona acusado de molestar os filhos

(...)"Minha ex-mulher disse que faria essas acusações se não voltasse para ela"


Arquivo pessoal
Ricardo Costa, a ex-mulher, Angela Martin, e os três filhos

RESUMO O brasileiro Ricardo Costa, 39, está preso no Arizona desde o fim de 2008 acusado de abusar sexualmente de dois dos seus filhos. A acusação foi feita por sua ex-mulher, a americana Angela Martin, pouco depois de eles se separarem.
O ex-modelo ainda não teve julgamento, e a juíza do caso impôs no mês passado a fiança de US$ 75 milhões. Procurada, Angela não quis dar entrevista e afirmou ser "vítima".

(...) Depoimento a
ÁLVARO FAGUNDES
DE NOVA YORK

Estou aqui celebrando hoje [dia 19] 28 meses na cadeia -ou centro de detenção, usando o termo politicamente correto. Na verdade, desde novembro estou na solitária.
Antes, estava em um dormitório de sete metros quadrados, com outras duas pessoas na cela. Era um beliche e uma cama no chão, além da privada e da pia. A gente ficava trancado 36 horas e podia sair 12 horas [da cela].
Eu me dava muito bem com o pessoal lá, nunca tive problema com ninguém.
Até que chegou um rapaz e disse que ia me matar, que ia me esfaquear. Cão que ladra não morde, e todo mundo gostava de mim, não iam deixar ele fazer nada. Os guardas escutaram a conversa, mas não fizeram nada durante uns dois, três dias.
Daí, no dia 23 de novembro do ano passado, encontrei com o meu advogado, e o promotor, pela enésima vez, disse que era melhor eu assinar um acordo [assumindo a culpa em troca da liberdade]. Eu não aceitei e, no dia seguinte, os guardas bateram na minha porta e disseram: "Pega as suas coisas que você vai para a solitária".
A explicação oficial é que eu estava com muitos problemas aqui. E o moleque que tinha me ameaçado também foi mandado para a solitária. Eles precisavam encobrir a história, precisavam arranjar uma desculpa.
Eu prefiro agora a solitária, porque não tenho que aguentar duas pessoas falando o dia inteiro sobre drogas, prostituição, crime.
É uma cultura muito difícil de lidar se você não cresceu com isso.
Só tenho meia hora [por dia] para sair, mas prefiro a ficar 36 horas com outras pessoas numa cela.
Embora saibam que sou inocente, eles querem que faça um acordo. Não posso aceitar essa proposta. Eu sou inocente. Se aceitar, não vou poder ver meus filhos, vou ser removido dos EUA. Se aceitar essa proposta, vou ser muito covarde. Vou fazer algo que é bom para mim, mas é muito ruim para as minhas crianças, minha família, meus amigos e meu país. Isso para mim é inaceitável.
Eu quero ir para o julgamento. Eles [a promotoria] não querem isso. Já tive o julgamento adiado três, quatro vezes porque querem eu assine [a confissão].
Já disse que não vou assinar, parem de perguntar. Daí dizem que, se eu perder, posso passar o resto da vida na cadeia. Tudo bem.

EX-MULHER
Quando a gente se conheceu, no Japão, ela tinha 29 anos, e eu, 19. E, desde então, ela ficou fascinada de uma maneira meio doentia. Todas as vezes que tentei sair do relacionamento, ela sempre fazia um drama.
Coincidentemente, ela ficou grávida do nosso primeiro filho quando eu estava para sair da relação. Ela sabia que estando grávida eu continuaria. E foi a mesma coisa com meus outros dois filhos. Culpa minha? Culpa minha de não ter saído de vez.
Ela fazia ameaças assim: "Em quem você acha que eles vão acreditar se eu te acusar de alguma coisa: você, que é homem e brasileiro, ou eu, mulher e americana?". Também tinhas outras ameaças e agressões físicas e psicológicas.
No final, eu acabava ficando na relação porque não queria que meus filhos ficassem sozinhos com ela. Mas chegou a um ponto que saí e disse: "Você faz o que acha que tem fazer". E ela fez.
Ela disse que faria essas acusações se não voltasse para ela. Eu não fiz nada, não tinha por que ter medo, cansei de ser tratado como bicho. Ela ficava insistindo para que eu voltasse, mas eu não faria isso nem se estivesse pintada de ouro.
A psicóloga que tratou os meus filhos perdeu a licença por causa do meu caso, porque ficou provado que ela fez lavagem cerebral não só com as minhas crianças, mas com outras também. Com a minha mulher e a psicóloga fazendo lavagem cerebral, isso resultou na minha acusação.

BRASILEIRO
Ser brasileiro aqui no Arizona não ajuda, piora muito. É um preconceito na cara, não é um preconceito escondido. A minha ex-mulher, no tribunal, fazia comentários como "ele é brasileiro". E a juíza atual e os anteriores deixavam fazer acusações racistas e ficava por isso mesmo. Deixavam passar como se não tivesse acontecido.
A fiança de US$ 75 milhões (mais de R$ 117 milhões) é uma piada. É a fiança mais alta da história da humanidade em dinheiro.


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