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São Paulo, domingo, 25 de maio de 2003

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AMBIENTE

Áreas não devem ser abertas ao público por causa do perigo de explosões e incêndios e de movimentação do solo

Gás adia transformação de aterro em parque

MARIANA VIVEIROS
DA REPORTAGEM LOCAL

O plano da Prefeitura de São Paulo de transformar seis ex-aterros em parques municipais terá de ser, ao menos, adiado. Segundo relatório da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA), todos os antigos depósitos de lixo têm grande produção de biogás e, por isso, apresentam risco potencial de explosões e incêndios -o que torna inviável, no momento, a abertura das áreas à população.
O gás, produzido pela degradação da fração orgânica dos resíduos, tem no metano (CH4) seu principal componente, é altamente inflamável e não foi ainda totalmente drenado do subsolo, mesmo em locais que pararam de receber resíduos há mais de 15 anos, afirma o documento oficial.
As informações foram dadas pelo município à Promotoria de Meio Ambiente da Capital, que, motivada por uma reportagem da Folha de dezembro de 2001, investiga a situação dos aterros encerrados na cidade e que tipo de risco eles podem trazer para a população que vive no seu entorno.
São pelo menos 200 mil pessoas, a maioria de baixa renda, que moram no entorno dos terrenos, contrariando, por exemplo, normas de segurança européias, que estabelecem uma distância de 50 metros entre ex-aterros e casas.
Em São Paulo, a ocupação ocorreu sem nenhum controle por falta de legislação sobre o tema. O perigo maior é que o biogás migre pelo subsolo e se concentre em algum compartimento dessas casas, onde pode causar explosões como a que feriu duas pessoas numa moradia vizinha ao aterro Jacuí em 1988 -como admite a prefeitura ao Ministério Público.
A investigação da Promotoria virou inquérito civil, a cargo do promotor Paulo Roberto Dias Júnior. Com a constatação da intensa produção de biogás, Adriano Diogo, titular da SVMA, diz que os ex-futuros parques vão passar inicialmente por revegetação, mas ainda não serão entregues como áreas de lazer à população.
Diogo admite que os locais precisam de avaliação mais aprofundada, mas diz que não esperará "cem anos" até ter certeza de que são totalmente seguros para torná-los áreas verdes. "Abrir para as pessoas é outra coisa."
Segundo o secretário, já está firmado convênio com a Comgás para fazer medições nos ex-aterros, já que a prefeitura não tem tecnologia nem recurso para isso.
O projeto de transformar aterros encerrados em parques tentava responder a duas necessidades da capital: áreas para lazer na periferia e recuperação ambiental dos locais que, durante anos, receberam lixo sem controle de gás ou chorume (líquido produzido na degradação do lixo orgânico) ou com um sistema muito distante dos padrões aceitos hoje em dia.
Diogo diz que, até o fim do semestre, o aterro de São Mateus, que fica na Área de Proteção Ambiental do Carmo e recebeu menos lixo que os demais, estará reflorestado com espécies nativas da mata atlântica. "A maneira como as plantas se desenvolverão será indicativo de como está o aterro", diz a geóloga Patrícia Marra Sepe, assessora da SVMA.

Problemas
Pelo relatório, os ex-aterros Jacuí, Sapopemba e São Mateus, todos na zona leste, "ainda apresentam geração significativa de gases, com valores de concentração muito acima do limite inferior de explosividade [LIE, o que equivale ao nível mínimo de gás necessário para gerar combustão]".
É possível ter idéia da dimensão do problema por meio da medida-padrão recomendada pela Cetesb (agência ambiental estadual) em casos de ultrapassagem do LIE em poços de monitoramento de áreas contaminadas: imediata "lavagem" ou expulsão dos gases.
Os ex-aterros de Santo Amaro (zona sul) e Vila Albertina (zona norte) "ainda estão bastante ativos, com grande geração de gases e recalques [movimentação do solo, que "assenta" à medida que o lixo é decomposto]". A produção de biogás é tão intensa nesses locais que o relatório recomenda que se faça o aproveitamento do produto para gerar energia.
Já o ex-aterro de Itatinga (extremo da zona sul) tem drenos de gás "ainda queimando" (apesar de ser depósito de entulho, também recebeu lixo doméstico), além de uma geometria "bastante desfavorável para utilização como área de lazer", diz o documento.
Mesmo assim, representantes da SVMA e do Limpurb (Departamento de Limpeza Urbana, a quem cabe fiscalizar aterros) dizem que os riscos reais de explosões ou incêndios são mínimos.
"É difícil dizer se tem problema. Para isso, temos de fazer um estudo mesmo. Pelos anos de prática que tenho, digo que o perigo não existe. Além disso, desde 88, não temos reclamações da população. Mas, se tiver problema, é fácil de resolver. Se o Ministério Público mandar, vamos lá fazer", afirma Plínio Valente, diretor da divisão técnica de aterros do Limpurb.
Dos seis que virariam parques, só três são controlados pelo órgão (Santo Amaro, Itatinga e Vila Albertina), mas não há medição de gás em nenhum deles. A manutenção dos aterros de Sapopemba, São Mateus e Jacuí, suspensa na gestão Paulo Maluf (93-96) por corte de verba, não foi retomada.
Segundo Valente, está sendo feita licitação para que medições sejam feitas no Santo Amaro, no São Mateus e no Sapopemba porque a remediação ambiental deles é condição para o licenciamento ambiental do aterro São João, um dos dois em operação na cidade.

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