São Paulo, segunda-feira, 25 de maio de 2009

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Pobre em escola privada vai melhor no Enem

Comparação de notas por renda familiar mostra que alunos igualmente pobres se saem melhor em colégios privados do que em públicos

Mesmo usando até metade da renda com educação, pais dizem preferir ensino privado por haver menos violência e mais facilidade de cobrança

Caio Guatelli/Folha Imagem
Ferreira, morador de São Rafael (zona leste de SP), leva as filhas de bicicleta à escola particular

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

TALITA BEDINELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Todo dia o operador de máquina Cláudio Roberto Ferreira, 35, leva de bicicleta a filha Ana Beatriz, 8, à escola. Mora numa casa de três cômodos -cozinha, banheiro e quarto- num loteamento irregular no distrito de São Rafael (extremo leste de SP). Com quatro pessoas na família, metade da renda de R$ 600 é usada para pagar a escola das duas filhas.
Na esperança de um futuro melhor, matriculou Ana Beatriz na Paulista Instituição de Ensino, colégio próximo à sua casa, que teve, na rede privada, a sexta menor média no ranking do Enem na cidade entre alunos do ensino médio regular.
Apesar de a posição da escola não ser muito boa se comparada à das outras particulares, os números do Enem mostram que a menina provavelmente terá desempenho escolar melhor estudando na instituição do que numa escola estadual.
Uma comparação das notas do Enem considerando a renda familiar dos alunos mostra que estudantes igualmente pobres se saem melhor em escolas particulares do que em públicas.
No último exame, 17 pontos separavam a média da rede privada e a média da rede pública. Quando se considera apenas alunos com renda familiar inferior a dois salários mínimos, a distância cai pela metade (oito pontos), mas persiste em favor das particulares.
Os dados do Enem mostram também que, apesar de o perfil de aluno de escolas particulares ser de maior renda que o da rede pública, 15% dos que estudaram apenas em colégios privados têm renda familiar inferior a dois salários mínimos.
"Tenho sobrinhos que estudam em escola pública e a gente ouve muitas histórias de professores agredidos, vê na TV casos até de morte dentro da sala de aula. Na escola particular, elas estão seguras e têm um estudo melhor", diz Ferreira.
Uma mudança em seu trabalho fez com que sua renda caísse de R$ 1.000 para R$ 600. Ferreira adiou as obras da casa, como o acabamento do piso de concreto, mas não deixou de pagar as mensalidades. "Sempre priorizamos a escola."
História parecida conta o motorista de ônibus Everaldo de Azevedo, 37. Ele recebe pensão de R$ 1.000 do INSS por causa de um problema físico. Sua mulher está desempregada. Mesmo assim, não tira a filha Natália do Colégio Tauá, na Ilha do Governador (zona norte do Rio), onde paga R$ 120 de mensalidade, além de material didático e alimentação.
"Cortamos refrigerante, pizza, cerveja e quase tudo para poder manter nossa filha numa escola particular. Lá, pelo menos, tenho como cobrar, pois, se vejo que ela não está aprendendo, posso ameaçar trocar de colégio ou exigir mais esforço do professor. Na escola pública, isso não acontece."
Apesar de argumentos como menos violência e mais facilidade de cobrança, Ailton Fernandes, diretor do Sindicato dos Professores de São Paulo que já deu aulas em escolas públicas e privadas, diz que muitas vezes há escolas públicas do bairro com desempenho melhor que essas particulares. "Mas pesa muito na hora da escolha dos pais o fato de, na rede privada, haver menos paralisações por greve, conselho de classes ou outras razões."


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