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São Paulo, quarta-feira, 25 de junho de 2003

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SAÚDE

Laboratório recebeu mais de 200 relatos de problemas de pessoas que usaram item contaminado em cirurgia de catarata

Fabricante de medicamento admite falhas

FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL

Sócio da divisão de produtos correlatos do laboratório farmacêutico OftVision, de São Paulo, o médico Antônio Carlos Nunes de Abreu, 49, reconhece que sua empresa não tinha boas práticas de fabricação. "Nós tínhamos um controle, mas não era o ideal que a Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] determina."
Todos os produtos do laboratório estão suspensos no país desde 18 de junho deste ano depois de um lote contaminado por bactérias do produto OftVisc, utilizado em cirurgias de catarata, ter causado infecção ocular em pacientes. Os primeiros casos foram relatados à Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo em março. A empresa recebeu mais de 200 relatos de problemas. Cerca de 30 pacientes seguem sob acompanhamento. A empresa informa ter gastado R$ 2 milhões no auxílio às vítimas -vendeu a sede para pagar parte do prejuízo. "Sou médico, imagine o que sinto."
Abreu, que tem 25% de participação no setor de produtos correlatos, assim como outros três sócios, atribui aos demais donos a responsabilidade pelo que ocorreu. A reportagem não localizou os outros proprietários. Segundo Abreu, houve um desentendimento e eles estão afastados. O médico não quis fornecer os contatos dos outros sócios.
 

Folha - A inspeção da Vigilância Sanitária mostrou que havia liberações do produto sem controle de qualidade.
Antônio Carlos Nunes de Abreu -
A gente fica no escritório, não sabe o que realmente ocorreu. Na realidade, alguns lotes ele [o químico do laboratório] soltou sem laudo.

Folha - O sr. demitiu o químico?
Abreu
- Demiti o químico e toda a área de produtos. Neste mês, contratamos um farmacêutico responsável e um outro para garantir a qualidade.

Folha - Isso não existia antes?
Abreu
- Não.

Folha - Por quê?
Abreu
- Porque as pessoas que estavam envolvidas nunca se preocuparam.

Folha - Mas o senhor não é sócio?
Abreu
- Também sou. Mas cuidava da área de lentes intra-oculares. Nunca acompanhei. Fico na área administrativa. Cada um tem sua função.

Folha - A vistoria verificou que não havia validação da esterilização.
Abreu
- Não era validado. O que vinha dentro [da seringa do produto] é esterilizado dentro da empresa, na autoclave. Nossa autoclave não tinha sistema de gráfico, agora todo o ciclo está em gráfico, documentado. Eles [uma empresa terceirizada recém-contratada] é que validam. Colocam lá uma cultura [de bactérias] e falam se o equipamento está esterilizando. Fazem de seis em seis meses.

Folha - É obrigação de vocês fornecer um produto estéril. Por que isso não ocorreu?
Abreu
- Nós tínhamos um controle, mas não era o ideal que a Anvisa determina. Não cumprimos alguns itens. As pessoas que trabalhavam achavam que o processo era garantido. Modificamos, readequamos a empresa. Não tínhamos boas práticas de fabricação. Os envolvidos [diretamente na fabricação] é que têm de ter certeza do que fazem. Estou assumindo pela empresa.


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