São Paulo, quinta-feira, 25 de agosto de 2005

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DANÇA DA CHUVA

Prefeitura faz parceria gratuita com fundação "especializada em corrigir desvarios" meteorológicos

Entidade esotérica fará alerta climático

DA REPORTAGEM LOCAL

Tornados? Vendavais? Inundações? Para se prevenir dessas calamidades climáticas, a administração José Serra (PSDB) firmou parceria com a Fundação Cacique Cobra Coral, entidade que se define como "esotérica-científica e especializada em corrigir desvarios do clima".
Publicado no "Diário Oficial da Cidade" na semana passada, o convênio não prevê nenhum custo para os cofres públicos.
O secretário municipal das Subprefeituras, Walter Feldman, um dos responsáveis pelo Centro de Gerenciamento de Emergências da cidade, diz estar interessado nos boletins climáticos da agência de meteorologia Tunikito, que faz parte do mesmo grupo da fundação, comandada pela médium Adelaide Scritori -que não respondeu aos telefonemas da Folha.
A Tunikito também trabalha com seguro e locação de carros.
De acordo com o site da entidade, a principal fonte das previsões meteorológicas de Adelaide -que teria poderes sobrenaturais- é o espírito do chefe indígena americano Cobra Coral, que em outras encarnações teria sido Galileu Galilei e Abraham Lincoln. O espírito de Cobra Coral seria capaz de "empurrar uma frente fria de um lugar para o outro, fazer sumir uma iminente geada e assim por diante".
O site a descreve como uma mulher de meia-idade que se desloca em um Corsa e despacha três vezes por semana à sede da fundação, na cidade de Guarulhos, Grande São Paulo.
Entre as catástrofes previstas pela fundação está a tempestade do dia 25 de maio deste ano, a pior chuva que atingiu São Paulo desde dezembro de 1988 -e que fez o rio Tietê transbordar depois de três anos.
Feldman diz que recebeu comunicado da fundação sobre a enchente cerca de um mês antes. "Queremos aproveitar o trabalho científico que eles fazem."
E o lado esotérico? "Vamos supor que eles tenham informações esotéricas de que no dia 30 de setembro vai acontecer uma grande chuva em São Paulo, mesmo sem boletins científicos que comprovem. O que vamos fazer é aumentar nossa atenção, porque talvez [nós] não tenhamos captado uma informação."
Para Maria Gertrudes Justi, professora de meteorologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o fato de a Cobra Coral dizer ser possível prever o tempo com meses de antecedência põe em dúvida a qualidade do trabalho feito. "Há um limite de 10 a 15 dias para previsões. É preciso levar em conta que trabalhamos com modelos matemáticos", diz Justi, presidente da Sociedade Brasileira de Meteorologia.
Essa não é a primeira decisão inusual que envolve as subprefeituras nesta gestão. Em março, Feldman distribuiu aos subprefeitos "pedômetros", aparelhos que contam o número de passadas do usuário. Em julho, o subprefeito da Capela do Socorro, José Augusto da Silva Ramos, propôs que os moradores da zona sul combatessem a superpopulação de ratos com jibóias.
"O pedômetro era um estímulo para melhorar a qualidade de vida dos subprefeitos. Já as cobras foram usadas como figura de linguagem para que as pessoas cuidassem do lixo", explica o secretário. (FABIO SCHIVARTCHE)


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