São Paulo, sábado, 25 de agosto de 2007

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Pressionada, diretora da Anac renuncia

Em carta ao ministro Nelson Jobim (Defesa), Denise Abreu alegou motivos pessoais, que seriam explicados a Lula

A Folha apurou que influiu na decisão de Denise a ação cautelar do Ministério Público Federal, em São Paulo, que pede seu afastamento

LEILA SUWWAN
HUMBERTO MEDINA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

ROGÉRIO PAGNAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Pressionada por denúncias de irregularidades, acusada de fraude processual, com sigilos quebrados e desgastada, Denise Maria Ayres de Abreu, 45, apresentou ontem à tarde sua renúncia, "em caráter irretratável", ao cargo de diretora de Serviços Aéreos e Relações com Usuários da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).
Em carta ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, ela alegou "motivos pessoais", que seriam explicados diretamente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Porém, a Folha apurou que influiu na decisão de Denise a ação cautelar apresentada à Justiça ontem à tarde pelo Ministério Público Federal, em São Paulo, pedindo o afastamento dela por 60 dias.
A rapidez com que pessoas ligadas à Anac ficaram sabendo da ação ilustra isso.
De acordo com funcionários da Procuradoria, a ação foi distribuída às 14h47. Minutos depois, quando a procuradora Inês Virgínia Prado Soares, autora da ação, se reuniu com o juiz da 5ª Vara Federal Cível, Ricardo Rezende, que irá julgar o pedido, ela ficou sabendo que pessoas ligadas a Denise Abreu já haviam entrado em contato com o magistrado para saber detalhes do caso.
Segundo a procuradora, o pedido de afastamento buscava evitar que a diretora atrapalhasse a investigação sobre a denúncia de que teria entregue à Justiça Federal uma "falsa norma" de segurança para impedir restrições à operação de alguns aviões em Congonhas.
O documento, se fosse válido, poderia ter evitado o acidente do avião da TAM, que deixou 199 mortos.
A procuradora é responsável pela investigação na área cível, que apura se houve improbidade administrativa por parte de funcionários da Anac.
Na ação, a procuradora ilustra sua preocupação com Denise no cargo ao citar que estava em poder da então diretora um processo administrativo da Anac que pode apontar toda "a estratégia de defesa na ação em que o documento [falso] foi utilizado, a participação de cada agente público".

Carta
Denise Abreu discutiu sua renúncia com o presidente da agência, Milton Zuanazzi, e um assessor no meio da tarde de ontem. Após levar a carta a Jobim, decidiu cancelar um pronunciamento público.
Jobim, que trabalha nos bastidores para mudar toda a direção da agência, disse que a saída de Denise Abreu é o primeiro passo para repensar a Anac.
"É uma decisão importante porque faz com que a Anac reduza o seu grau de atrito e o seu grau de tensão com a sociedade", disse.
Anteontem, Denise afirmou à CPI do Apagão Aéreo na Câmara que não pretendia renunciar. A comissão análoga do Senado havia quebrado seus sigilos bancário e fiscal. Ela se disse "injustiçada" e "alvo de uma artilharia incansável".
A situação de Denise no governo foi classificada de insustentável após o episódio da "falsa norma" -e das diferentes versões apresentadas por ela.
Antes disso, ela foi acusada pelo brigadeiro José Carlos Pereira, ex-presidente da Infraero, de fazer lobby pela transferência do terminal internacional de cargas de Congonhas para o aeroporto estadual de Ribeirão Preto (314 km de SP), o que favoreceria um amigo.
"Dra. Denise", como é conhecida, tem fama de caráter forte e autoritário. Ela própria reconhece que é considerada "terrível" e relatos dão conta de que é hiperativa e propensa a discussões acaloradas. Ela diz ser alvo de preconceito por ser mulher.
Ficou conhecida pelo episódio do "charuto", com o qual foi fotografada na festa de casamento da filha de outro diretor da agência, Leur Lomanto, em Salvador, em meio à crise aérea de março, causada pelo motim dos controladores de vôo.
Jobim não descartou a saída dos demais diretores da Anac, como é cogitado nos bastidores políticos. "Cada coisa no seu tempo", afirmou.
Ele afirmou que repassará o pedido de demissão para o presidente Lula. "Estou encaminhando para o presidente, para que possam ser feitos os últimos atos e possamos partir para a frente, ou seja, começar a repensar a Anac", afirmou.
Denise trabalhou em governos tucanos em São Paulo e fez carreira em Brasília a partir de 2003, depois de pedir demissão de cargo concursado de procuradora do Estado de São Paulo.
Ela foi nomeada pelo então ministro José Dirceu como assessora na Casa Civil em 2003.
Três meses depois virou adjunta do então subchefe de Assuntos Jurídicos, José Dias Toffóli. Hoje ele é advogado-geral da União.


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