São Paulo, quarta-feira, 26 de abril de 2006

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EDUCAÇÃO

Da primeira à quarta série, taxa de reprovação no Brasil chega a 21%, segundo estudo divulgado pela Unesco

País tem repetência maior que a do Camboja

FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL

Considerada um dos principais indicadores de qualidade na educação, a taxa de repetência no ensino primário (primeira a quarta série) no Brasil é pior do que a do Camboja e equivalente às de Moçambique e Eritréia. É o que aponta uma pesquisa divulgada ontem pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).
Em uma das seções do estudo, que aborda a qualidade da educação em todo o mundo, a entidade considerou os 45 países cujos índices de repetência são superiores a 10%. O Brasil, com taxa de 21% (a pesquisa usa como base o ano de 2002), tem situação melhor apenas que 15 países, a maioria da África. O Camboja, por exemplo, tem 11%. Já o Haiti, 16%, e Ruanda, 19%. No Chile, o índice é de 2%, e na Argentina, 6%.
A taxa de repetência no Brasil (21%) se assemelha às de Moçambique e Eritréia, que possuem, respectivamente, o 168º e o 161º IDH (índice que mede o desenvolvimento humano em todo o mundo). Essa lista tem 177 países -e o Brasil é o 63º.
Segundo o estudo, a repetência reflete "condições insatisfatórias de ensino e de aprendizagem".
Para Célio da Cunha, assessor para a área da educação da Unesco no Brasil, uma das explicações para o alto índice de fracasso é a falta de condições para o professor. "Eles não estão preparados para ensinar alunos com dificuldades socioeconômicas."
Cunha afirma que a repetência, "além de ser prejudicial ao sistema, acaba com a auto-estima do estudante". Segundo ele, "a situação melhorou um pouco nos últimos anos, mas ainda é o principal desafio da educação no país".
Pesquisa feita pela PUC-RJ, com base no Saeb 2001 (sistema nacional de avaliação da educação básica), mostra que o repetente tem, em língua portuguesa, uma nota 20% menor na quarta série.
"Na prática, o que acontece na maioria das vezes é que a escola afirma que a culpa de não aprender é do aluno. Mas não diz que é o ensino que vai mal", diz Vitor Henrique Paro, professor da Faculdade de Educação da USP e autor do livro "Reprovação Escolar: Renúncia à Educação".
Robison dos Santos Martins, 12, por exemplo, foi reprovado na quarta série duas vezes -uma por ter sofrido acidente que o impossibilitou de fazer a prova final e outra, na opinião da professora, "por não querer nada da vida".
Para o estudante, a reprovação significou mais do que a perda de um ano letivo. "Foi ruim, porque deixei vários amigos para trás."
"Ele ficou bem desanimado de fazer a mesma coisa três vezes", afirmou a mãe de Robison, Antônia Maria dos Santos, 36.
A alta taxa de repetência é ainda mais significativa pelo fato de algumas redes públicas -como São Paulo e Minas Gerais- terem aderido ao sistema de progressão continuada, em que o aluno só repete ao final de cada ciclo (no primário, vai até a quarta série). Segundo dados do MEC (Ministério da Educação), cerca de 20% dos alunos matriculados na educação fundamental estão nesse sistema.
Sobre a alta taxa de repetência no país, o MEC afirmou que possui programas de gestão escolar, o que melhorará a qualidade do ensino no país. Segundo o ministério, esses programas servem como indutores em toda a rede de ensino, pois Estados e municípios são os responsáveis diretos pela educação fundamental.
A pasta cita ainda a ampliação do ensino fundamental de oito para nove anos, aprovada no início deste ano. A medida é benéfica por iniciar o aluno mais cedo na escola, agora aos seis anos -antes era aos sete. Isso, dizem especialistas, facilita a aprendizagem.
Outro fator apontado pelo MEC é o Fundeb, novo fundo da educação básica, que está no Senado. Se aprovado, o fundo custeará o ensino infantil -hoje, apenas o ensino fundamental é financiado por um fundo nacional.


Colaborou SIMONE HARNIK, da Reportagem Local
Veja a lista completa da Unesco na www.folha.com.br/061152


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