São Paulo, sábado, 26 de abril de 2008

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WALTER CENEVIVA

A trilha de Gilmar Mendes

O discurso de posse do presidente do Supremo define posições que repercutirão nas relações entre os três Poderes

O NOVO PRESIDENTE do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Gilmar Ferreira Mendes, ao assumir o cargo, iniciou uma etapa nova, que sugere momentos graves para a vida da Corte. A ministra Ellen Gracie, substituída por ele no cargo, assinalou dois marcos na história nacional: primeira mulher a ter assento na Suprema Corte e primeira a presidi-la.
Agora se vê que a presidência de Gilmar Mendes também será assinalada por aspectos inovadores das tradições do Supremo. Apenas três de seus companheiros são mais antigos no STF: Celso de Mello Filho, Marco Aurélio e, obviamente, Ellen Gracie. A lista das precedências por antigüidade encolheu nos últimos anos, quando os primeiros na linha sucessória deixaram o STF (Sepúlveda Pertence, Carlos Velloso, Ilmar Galvão, Francisco Rezek, Mauricio Corrêa e Nelson Jobim). Sete são mais novos que Gilmar (além de Antonio Cezar Peluso, empossado na vice-presidência).
A novidade histórica está nas muitas formações do STF que permaneceram com maioria estável, senão inalterada, durante anos. Sabia-se, de antemão, qual o voto proferido pelos ministros, um a um, em questões fundamentais. Repercutiam no espaço interno da Corte e, preponderantemente, entre os profissionais da área jurídica.
O novo presidente, ao dirigir trabalhos do Pleno, enfrentará a dificuldade de não saber com precisão quais as posições de seus companheiros, em face dos muitos problemas complexos a serem discutidos.
A transmissão das sessões pela televisão acrescentou, em anos recentes, pormenor não desprezível nesse quadro. Pode-se prever a hipótese de haver votos proferidos em julgamentos avaliados diretamente pelos dez colegas do votante, mas provocando o interesse dos milhões que gostam de assistir às plenárias pela TV. É um mundo novo.
Projeção desse interesse generalizado aparece no severo discurso que Gilmar Mendes pronunciou em sua posse. Criticou contínuas agressões que o poder comete contra direitos da cidadania, ou seja, dos terceiros que não integram a máquina do Estado. Foi firme, por exemplo, na afirmação de que o Estado Democrático de Direito é incompatível com a emissão seguida de medidas provisórias pelo Poder Executivo, geradoras de instabilidade provocada na estrutura jurídica. Suas palavras merecem análise mais pormenorizada, a ser feita nas próximas semanas, pois o discurso de posse do presidente do Supremo Tribunal define posições que repercutirão nas relações entre os três Poderes.
A intervenção do novo presidente nos debates será marcante, mas viabilizada em particular nos desempates. Nos seus anos de judicatura, Gilmar Mendes marcou posições que originaram alterações na jurisprudência e nas leis do processo, em particular no referente à relativização da coisa julgada. Essa convicção foi estimulada no discurso proferido em nome do tribunal pelo ministro Celso de Mello, que fixou parâmetros vigorosos a respeito do papel que a Corte deve ter e, por via de conseqüência, de seu presidente, quando os confrontos de opiniões se tornarem incomponíveis.
Gilmar Mendes, em sua oração, deu definições que provavelmente preocuparam os líderes dos dois outros Poderes, o que é um bem em si mesmo. O Judiciário parece pronto para o desafio.


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