São Paulo, sábado, 26 de junho de 2010

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EUA apostam em escolas privadas para salvar educação pública

Aumenta no país financiamento público de colégios particulares que atendem alunos de graça

As "charters schools" cresceram 289% em 10 anos; modelo causa polêmica, pois eficácia não foi comprovada

ANTÔNIO GOIS
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

O auditório do Brooklyn College, em Nova York, com capacidade para 2.000 pessoas, estava lotado no fim de tarde de uma terça-feira de abril. Não havia apresentação de artista.
O que atraía tanta gente ali era o sorteio de vagas gratuitas em uma rede de escolas privadas mantida com dinheiro público.
O casal Eric e Rachael Thomas era mais um a esperar ansiosamente pelo anúncio dos contemplados.
Ao ouvirem o nome do pequeno Elijah, os dois comemoraram como quem celebra um gol, uma cesta ou um ponto do time de coração. Ao lado, uma mãe chorava, desolada, por sua filha não ter sido chamada.
"Tínhamos certeza que conseguiríamos. Eles [a rede de escolas Achievement First] foram a melhor coisa que aconteceu no Brooklyn nos últimos tempos", disse Rachael.
As reações dos pais naquele auditório ajudam a entender por que uma parcela crescente da opinião pública norte-americana pressiona seus governos a aumentarem o financiamento público a escolas privadas.
Esses estabelecimentos, conhecidos como "charters schools", representam apenas 4% do total de escolas americanas, mas, nos últimos dez anos, cresceram 289%, saindo de 1.297 em 2000 para 5.043 neste ano.

LIBERDADE
As "charters schools" têm liberdade para organizar o currículo, estabelecer horários, aumentar ou encurtar o calendário letivo e contratar professores não sindicalizados, o que gera forte reação dos sindicatos.
Em troca do financiamento público, atendem apenas alunos de graça, selecionados por sorteio, e precisam cumprir metas de qualidade.
A aposta no modelos das "charters", no entanto, é polêmica nos EUA.
Se há quem acredite que elas são uma solução para o criticado sistema público de ensino, outros são céticos em relação aos seus resultados e reclamam que trata-se de uma maneira de drenar recursos públicos para mãos privadas.
As pesquisas de abrangência nacional sobre o tema são inconclusivas. Após consideradas todas as variáveis externas às escolas que influenciam no aprendizado dos alunos, não houve estudo que identificasse até o momento significativa diferença em favor das "charters".

MAU USO
Além disso, começam a aparecer casos de mau uso dos recursos públicos ou baixo desempenho. Na cidade de Nova York, por exemplo, quatro delas (de um total de 99 atualmente) já foram fechadas por maus resultados.
Uma reportagem do "New York Times" em maio trouxe também relatos de estabelecimentos processados por pagarem viagens turísticas a seus membros, ou salários milionários aos diretores.
Mesmo assim, a expansão das "charters schools" continua a ser apoiada por governos em diferentes níveis.
A estratégia fez parte da política educacional de George W. Bush, e continuou com Barack Obama.
"Mesmo sem evidência de que as "charters" são melhores, há uma pressão forte dos pais por mais poder de escolha. Os ricos escolhem as escolas dos seus filhos. Os pobres querem o mesmo", afirma Henry Levin, pesquisador da Faculdade de Professores da Universidade Columbia.


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