São Paulo, sexta-feira, 26 de agosto de 2005

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LEGALIZAÇÃO EM DEBATE

Advogada brasileira preside comitê de fiscalização da situação da mulher no continente americano

Membro da OEA pede aval da igreja ao aborto

IURI DANTAS
DE WASHINGTON

Presidente do recém-criado comitê OEA (Organização dos Estados Americanos) que vai fiscalizar a situação da violência contra a mulher no continente americano, a advogada carioca Leila Linhares Barsted sugere que a Igreja Católica brasileira deveria se engajar na defesa do direito ao aborto. Segundo ela, seria apenas outro viés das liberdades individuais previstas na Constituição, como a liberdade de culto, da qual a instituição se vale para existir oficialmente no país.
"A própria liberdade de religião significa um direito individual, um direito à intimidade, a ter fé etc. A importância do Estado laico é essa, pois garante a liberdade de religião. O Estado religioso só garante a liberdade da religião dominante. Nesse sentido, a defesa do Estado laico e a defesa dos direitos individuais, como a questão do aborto, devem ser uma defesa intransigente de quem está defendendo democracia, cidadania, direitos humanos. Inclusive da Igreja Católica", disse à Folha.
Barsted foi nomeada nesta semana pela OEA presidente do comitê responsável pelo monitoramento da implementação da Convenção de Belém do Pará, ratificada pelo Brasil em 1995.
O texto da convenção estabelece direitos mínimos de acesso à Justiça, punição a agressores e a manutenção de equipamentos públicos para atender mulheres vítimas de violência física, sexual ou psicológica nos países. Dos países filiados à OEA, Estados Unidos, Canadá e Jamaica não assinaram a convenção.
De acordo com a advogada, os projetos permitindo o direito ao aborto esbarram na forte pressão exercida pela igreja sobre o governo e o Congresso no Brasil.
"O Estado brasileiro, infelizmente, nessa questão dos direitos sexuais e reprodutivos tem seguido uma posição muito pouco laica, digamos assim. Toda a separação entre Estado e igreja, que nossa Constituição garante na questão dos direitos sexuais e reprodutivos, tem sido posta de lado. As pressões das igrejas no Brasil, em particular dos católicos, são muito fortes."
Segundo dom Odilo Scherer, secretário-geral da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), a Igreja Católica, como uma das muitas instituições existentes no Estado laico, cumpre o seu dever democrático de se manifestar publicamente em defesa do ser humano. "Sobretudo do direito à vida de seres humanos frágeis e indefesos. Apelamos aos poderes constituídos para que esse direito seja tutelado e assegurado a todos. A Igreja Católica está respaldada nos princípios constitucionais do Brasil".

Fiscal da violência
Como presidente do comitê, Barsted terá a função de cobrar dos países-membros da OEA a implementação da convenção. Em um primeiro momento, o comitê de especialistas vai enviar um questionário a todos os países para verificar o estágio em que os temas vem sendo tratados domesticamente. Depois, de posse das respostas, o grupo elabora um relatório mostrando a situação em cada país.
No caso de violações ao texto, não cabe sanção da OEA. A pressão é política, e o relatório serve como instrumento para que os governos dêem mais atenção ao assunto. "Ao solicitar que os Estados preencham o questionário, que respondam, que prestem contas do que estão fazendo, estará provocando, impulsionando a implementar de fato a convenção", disse Barsted.


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