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ANÁLISE
Réu solto é diferente de impunidade
LUÍS FRANCISCO CARVALHO
FILHO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
No Brasil prevalece a regra
de que o réu acusado de algum
crime responde ao processo em
liberdade. É o princípio da presunção de inocência estabelecido na Constituição como garantia individual.
A gravidade do delito não é
motivo aceitável para a detenção cautelar, muito menos a
condição social do acusado, rico ou pobre. Cabe prisão preventiva em crimes dolosos,
com pena de reclusão, para a
garantia da ordem pública, por
conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal. A prisão se justifica, por exemplo, quando o
réu ameaça a testemunha interferindo ilegalmente no andamento do processo ou quando se prepara para fugir.
Não deve causar estranheza
o fato de algumas pessoas estarem presas, à espera do julgamento, e outras soltas. Cada caso é um caso.
No episódio do médico Roger
Abdelmassih, os pedidos de habeas corpus impetrados sucessivamente no Tribunal de Justiça,
no Superior Tribunal de Justiça
e no Supremo Tribunal Federal
ainda não foram julgados. Os relatores se limitaram a negar as
liminares. Preferiram aguardar
as informações do magistrado
responsável pela ordem de prisão e o parecer do Ministério
Público antes de analisar o recurso. A ministra Ellen Gracie,
do STF, foi fiel à súmula que impede o julgamento do pedido
antes da decisão das instâncias
inferiores. Assim, nada impede
que, apesar das liminares negadas, o habeas corpus seja dado
no futuro.
Várias circunstâncias serão
determinantes no julgamento
do habeas corpus. Pesa contra o
médico a acusação de meia centena de delitos sexuais, de ter
supostamente abusado das pacientes após eliminar sua capacidade de resistência, abusando
de sua condição profissional, a
comoção provocada pela revelação íntima das vítimas, o clamor
público. Juízes são seres humanos e suscetíveis de serem influenciados pelos contornos escandalosos ou emocionais da
causa. Mas, em tese, devem se
manter equidistantes e examinar tecnicamente o decreto de
prisão preventiva.
Réu solto não se confunde
com impunidade. O que de fato
incomoda no Brasil é a ineficiência crônica do Poder Judiciário. A Justiça tarda e falha. Os
processos demoram anos e anos
para ser julgados criando a impressão de que ninguém vai para a cadeia. Mas as cadeias estão
superlotadas. A culpa desse sentimento cada vez mais arraigado
não é da garantia constitucional.
Para se dimensionar a importância do princípio da presunção de inocência, que deveria
valer para todos, basta imaginar
a hipótese de uma pessoa presa
preventivamente, durante anos,
até a efetivação de um julgamento que a absolva... O equilíbrio entre a eficácia da Justiça e
o respeito aos direitos individuais é o grande desafio.
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