São Paulo, quinta-feira, 26 de outubro de 2000

Próximo Texto | Índice

TRANSPORTE
161 empresas dominam linhas intermunicipais do Estado; permissões estão vencidas há, no mínimo, dez meses
Ônibus operam sem licitação em São Paulo

Eduardo Knapp/Folha Imagem
Passageiros embarcam em ônibus intermunicipal no terminal Barra Funda; 161 empresas operam as linhas no Estado


ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

Sem nunca terem passado por licitação, as empresas de ônibus intermunicipais de São Paulo, que faturam mais de R$ 700 milhões por ano, estão operando com todas as permissões vencidas há, no mínimo, dez meses.
Esse sistema abrange 1.235 linhas rodoviárias e suburbanas do Estado, que transportaram 212 milhões de passageiros apenas em 1999. Os contratos que regulamentavam a atuação dessas companhias começaram a expirar cinco anos atrás.
Levantamento da Autcresp (Associação dos Usuários de Transporte Coletivo Rodoviário do Estado de São Paulo) indica que, em 1995, 35% dessas permissões já não tinham validade. No final de 1999, restaram 5% para vencer.
A Constituição de 1988 diz que a outorga de serviços públicos sempre deve passar por licitação. Mas as 161 empresas dominam as linhas intermunicipais do DER (Departamento de Estradas de Rodagem) desde os anos 40, sem nunca terem vencido uma concorrência ou desembolsado algum valor aos cofres públicos.
A informação de que o faturamento anual do setor está girando em torno de R$ 700 milhões, incluindo os impostos das tarifas, é do Setpesp (Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado de São Paulo). A estimativa da Autcresp é ainda maior: R$ 1,8 bilhão.
Na semana passada, um inquérito concluído pelo Ministério Público de Minas Gerais apontou que o sistema de concessão de linhas rodoviárias naquele Estado estava irregular. A situação é semelhante à de São Paulo.
Até 1994, as empresas paulistas vinham atuando nas estradas por meio de permissões, que eram concedidas a cada cinco anos. Desde então, baseado na lei 8.666, que regula as licitações, o governo estadual não pôde mais postergá-las. O problema é que, enquanto os contratos venciam, a licitação permaneceu emperrada.
No primeiro mandato do governador Mário Covas (PSDB), o DER nem sequer conseguiu definir a escolha de uma empresa para analisar as linhas intermunicipais em São Paulo. Esse estudo, tido como o primeiro passo de preparação da licitação, só está sendo concluído neste ano.
A previsão do DER é que a licitação só termine em 2002, no último ano da gestão Covas. Ou seja: nesse oito anos, as empresas terão faturado mais de R$ 5,6 bilhões.
O DER atribui a demora da licitação a entraves jurídicos. Mas nega que a atual situação seja irregular, conforme avaliam alguns advogados. O embasamento do DER é a lei 8.987, de 1995, que regula as concessões. Em seu artigo 42, parágrafo 2º, ela diz que "as concessões em caráter precário, as que estiverem com prazo vencido e as que estiverem em vigor por prazo indeterminado, inclusive por força de legislação anterior, permanecerão válidas pelo prazo necessário" até a elaboração dos levantamentos e projetos para realização das licitações.
Especialistas em direito administrativo ouvidos pela Folha contestam a interpretação ou constitucionalidade desse texto.
"A lei não fixou prazo máximo para haver licitação. Quer dizer que, se o governo quiser, pode demorar 20 anos para fazer uma licitação? É um equívoco, é inconstitucional. Ninguém pode receber isso de mão beijada", afirma Marcio Cammarosano.
"É um absurdo não haver um período máximo para esse processo. Com isso, o governo fica empurrando com a barriga", diz Toshio Mukay.
"Não se pode deixar vencer as permissões e não fazer nada. A simples continuidade da prestação de serviços é irregular", afirma Benedito Porto Neto.


Próximo Texto: Para sindicato, preço cai até 40%
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.