São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2006

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Sem-teto e classe média dividem edifícios

Condomínio no Jabaquara, zona sul de SP, teve 2 dos 4 prédios invadidos depois da falência da construtora, na década de 90

Cerca de 500 invasores já ergueram paredes e vêem discriminação dos com-teto, que reforçaram a segurança e apontam desvalorização

AFRA BALAZINA
DA REPORTAGEM LOCAL

De um lado, sem-teto moram em dois prédios inacabados, sem elevadores e com ligação clandestina de energia e água. De outro, pessoas de classe média habitam dois edifícios bem pintados, com apartamentos concluídos, piscina, sala de jogos e salão de festas.
Na verdade, os quatro prédios deveriam fazer parte do mesmo condomínio, o Central Park Jabaquara, na rua Cruz das Almas, zona sul de São Paulo. A expectativa é que fossem inaugurados em 1992.
Mas a construtora Caporrino Vieira faliu e os blocos não foram concluídos. Duas construtoras terminaram o serviço nos dois prédios que estavam com as obras adiantadas. Os outros foram abandonados, ocupados irregularmente e hoje formam um grande contraste na região.
Lá, enquanto os sem-teto citam discriminação, os com-teto dizem que a região foi desvalorizada. "Quando era só o esqueleto muita gente vinha se drogar no prédio. Com a nossa chegada, isso mudou. Mas os vizinhos acham que aqui só tem bandido", diz o motorista Osmar Fidalgo, 53, sem-teto.
Ele e a maioria dos invasores afirmam que aderiram à ocupação porque estavam com dificuldade de pagar aluguel.
Para Onias Martins de Oliveira Filho, instrutor de tênis que mora na área concluída do condomínio, os novos vizinhos representam dor de cabeça. "Agora até melhorou, mas eles roubavam luz e água da gente e jogavam esgoto aqui na nossa área. Os apartamentos também desvalorizaram muito. As pessoas têm vendido por R$ 50 mil ou R$ 60 mil, metade do que valem, e vão embora", afirma.
No condomínio, as escadas que levariam aos demais blocos hoje acabam num muro, construído para separar os lados. Enquanto as crianças do condomínio brincam nas duas piscinas ou no parquinho, as da invasão jogam pega-pega em meio aos varais improvisados.
Na invasão, o que era esqueleto ganhou paredes internas e externas, janelas de diferentes tipos (madeira, papelão, vidro ou metal) e portas (algumas novas, outras de ferro-velho).
Os fossos dos elevadores -que não existem- foram fechados para evitar que crianças caíssem. Mas há entulho e lixo onde a garotada brinca e em alguns pontos a escuridão reina.
Há cerca de 30 famílias vivendo de forma precária na garagem. Eles fizeram banheiros ali e o esgoto não é coletado.
A balconista Corina Medeiros, 25, vive há um ano com o marido e o filho na invasão. "Estava no Ipiranga. Houve reintegração e resolvemos vir para cá." Ela diz que ficou "dois dias ao relento" no prédio, "com vento na cara", porque só tinham madeira como parede.
"Agora já colocamos piso, porta, rebocamos. Aos poucos vamos melhorando. Mas dá medo investir porque não sabemos se seremos expulsos."
Do outro lado, alguns compraram dois apartamentos para ganhar mais espaço. Fizeram três quartos, escritório e closet.
Outros condôminos tomaram medidas para evitar problemas de segurança. Um dos proprietários alugou mais uma vaga de garagem para poder receber os amigos -ele diz que mais de cem carros tiveram os vidros quebrados e o rádio furtado em frente ao prédio.
Apesar de considerar os prédios inacabados uma grande "poluição visual", a dona-de-casa Carla França, 26, não reclama nem tem medo dos vizinhos. "Moro aqui há um ano e meio e nunca aconteceu nada."
Segundo ela, a localização compensa a feiúra da região. "Fica perto do metrô Jabaquara. Também tem escola e lojas."


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