São Paulo, domingo, 27 de fevereiro de 2005

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CONSELHOS

O QUE DIZ O PROJETO:
Deverá ser organizado nas universidades o conselho comunitário social, formado por representantes da sociedade civil, da própria instituição e da administração pública. O órgão supervisionará as atividades da entidade

CRISTOVAM BUARQUE:
"É uma das grandes inovações e é preconceito ficar contra. Como a gente vai ter universidade formando engenheiro sem ter no conselho alguém da Fiesp? Mas se vai ter da Fiesp, por que não ter também do Ministério do Desenvolvimento Agrário ou do MST"

PAULO RENATO SOUZA:
"Não tenho problema quanto ao conselho externo. O meu problema está no papel dado às corporações internas. No caso das universidades federais, o poder é entregue integralmente à corporação interna. Com um agravante: os professores terão apenas maioria simples no conselho, reduzindo sua participação ao que está preconizado na LDB [Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional], de 70%"

TARSO GENRO:
"[É] um ponto polêmico e importante. O conselho tem uma posição meramente de estabelecer uma ponte entre a sociedade civil e a universidade. Não tem função normativa ou de enquadramento"

ELEIÇÕES DIRETAS

O QUE DIZ O PROJETO:
A comunidade universitária deverá eleger o reitor e o vice-reitor nas instituições federais. Já as universidades e os centros universitários privados deverão contar com pelo menos um dirigente, no nível de pró-reitor, escolhido por eleição direta pela comunidade

PAULO RENATO SOUZA:
"Sou contra. A universidade não pertence à sua comunidade interna. [A instituição privada] pertence aos seus mantenedores, e a universidade pública, ao Estado, que tem de intervir na nomeação dos dirigentes. [Mas] é importante consultar a comunidade universitária. Do jeito que está, o projeto foi feito pelas corporações das universidades federais, em benefício dessas corporações"

TARSO GENRO:
"Recebemos várias observações de que isso era errado, que era corporativo, que poderia tirar o peso dos docentes. Não leram direito o projeto. As regras para essa eleição [no caso das federais] são determinadas pelo conselho superior, onde a maioria é docente. Acho injusto dizer que o projeto será entregue às corporações"

ENSINO BÁSICO X SUPERIOR

O QUE DIZ O PROJETO:
Não trata diretamente da questão do ensino básico, mas, ao aumentar as verbas obrigatórias para o ensino superior, há o temor por parte de alguns críticos de que a verba para outros níveis de ensino diminuam

TARSO GENRO:
"Não estamos tratando a reforma do ensino superior de maneira isolada da educação básica. É equivocada essa visão. Nossa visão é abordar a totalidade do sistema educacional do país com foco em prioridades internas de cada área. Fizemos uma proposta de criação do Fundeb que vai significar R$ 1 bilhão a mais por ano de verba federal para o ensino básico nos próximos quatro anos. Em quatro anos, chegaremos a R$ 4,3 bilhões a mais no sistema. Não é o ideal, mas é o possível e o realizável. Não adianta pedir o impossível e não conseguir nada"

CRISTOVAM BUARQUE:
"Acho um equívoco a gente fazer a reforma universitária sem vinculá-la diretamente a uma reforma do ensino básico. Se continuar do jeito que está, vamos passar a idéia de que fizemos uma opção pelos incluídos [por ter acesso ao ensino superior]. Não há universidade boa com um ensino médio ruim. Faço um apelo ao ministro Tarso para que não mande um projeto só de reforma universitária. [E] não basta só enviar também um projeto de criação do Fundeb. Além do mais, R$ 1 bilhão a mais por ano de verba para esse fundo é pouco para um governo que investiu em 2004 somente R$ 54 bilhões. O governo federal tem à sua disposição R$ 680 bilhões. Precisamos investir em quatro anos no mínimo R$ 20 bilhões a mais"

AUTONOMIA E FINANCIAMENTO

O QUE DIZ O PROJETO:
Estabelece que as universidades federais não receberão menos verbas de um ano para o outro, além de aumentar o percentual mínimo de gastos do MEC com essas instituições. O gasto com inativos não poderá ser incluído como despesa em educação

CRISTOVAM BUARQUE:
"Acho que a reforma está partindo do equívoco que é se limitar a um programa de financiamento. As mudanças hoje ocorrem numa velocidade tal que a universidade não está acompanhando. Temos de inventar um sistema em que o aluno que se forme não tenha mais direito de usar seu diploma 30 anos depois, porque ele estará obsoleto. Mesmo se chover dinheiro nas universidades federais, elas não vão se adaptar às exigências de hoje. É preciso que haja mais dinheiro, mas sabendo para onde ele será utilizado. Temos de garantir uma autonomia responsável e comprometida"

PAULO RENATO SOUZA:
"O governo retoma, em linhas gerais, algumas idéias que tentamos aprovar quando eu era ministro. No entanto, ao tirar os inativos [da comprovação das despesas obrigatórias com educação], há um aumento dos gastos nas universidades federais. Não vou discutir se os recursos são necessários ou não. O que me chama atenção no projeto é que não há nenhuma exigência de contrapartida das universidades públicas. A responsabilidade dos dirigentes federais é essencial num projeto de reforma universitária"

TARSO GENRO:
"Estamos vinculando recursos para as universidades federais. Isso já acontece hoje com a USP (Universidade de São Paulo), mas a subvinculação que estamos propondo é de maneira muito mais dura do que a que é feita em São Paulo. Os recursos serão distribuídos de duas maneiras. Uma é garantindo verba para custeio e a outra é distribuindo recursos para projetos de expansão com qualidade, que serão avaliados por uma comissão. Nossa proposta permite uma flexibilidade maior na gestão, para que as instituições operem seus recursos de maneira mais adequada, livre e aberta"

CAPITAL ESTRANGEIRO

O QUE DIZ O PROJETO:
Limita em no máximo 30% a participação de capital estrangeiro em mantenedoras de instituições com fins lucrativos

CRISTOVAM BUARQUE:
"Eu discordo. Não vejo problema nenhum em ter capital estrangeiro na educação. Eu quero é que venha mais dinheiro. Agora, se eles tentarem deformar o ensino, aí a gente controla"

PAULO RENATO SOUZA:
"Não existe a menor hipótese de o capital estrangeiro dominar o ensino superior brasileiro. Só existem duas ou três instituições internacionais com interesse em investir em outros países. O Cláudio de Moura Castro [presidente do conselho consultivo da Faculdade Pitágoras] disse que há dois grupos que podem ter interesse em entrar no Brasil, um já está aqui [o grupo norte-americano Apollo, em parceria com o Pitágoras], e o outro o governo não quer deixar entrar. A entrada de investimento estrangeira é benéfica"

TARSO GENRO:
"O projeto não é contra a entrada de capital estrangeiro no país. O que ele diz apenas é que, quando for constituído capital misto, a parte do grupo estrangeiro não poderá passar de 30%"

COTAS

O QUE DIZ O PROJETO:
Reserva 50% das vagas em universidades federais para alunos da rede pública e determina que haja uma proporção mínima de negros, pardos e indígenas compatível com a proporção da população de cada Estado

CRISTOVAM BUARQUE:
"Sou a favor das cotas. Ao colocar a cota para a escola pública, é possível que as famílias de classe média passem a colocar seus filhos na escola pública para se beneficiar da reserva de vagas. Aí, ela dará força ao ensino público"

TARSO GENRO:
"Esse é um processo de oxigenação das elites e de valorização do ensino médio, que também está sendo objeto de uma política de qualificação, de formação de professores e de currículo. Achamos que essa política tem de ser um elemento de transição para o sistema educacional onde a educação básica de qualidade seja garantida para toda a sociedade. Na nossa opinião, as cotas não rebaixam a qualidade da universidade"

MERCANTILIZAÇÃO

O QUE DIZ O PROJETO:
Cria regras mais rígidas de criação de cursos e de gestão, como a criação de conselhos e eleições diretas mesmo em universidades particulares

PAULO RENATO SOUZA:
""O projeto restringe a expansão do ensino superior ao criar esse conceito subjetivo de necessidade social e ao estabelecer regras mais difíceis para a criação de universidades. Esses foram mecanismos que levaram a uma expansão do ensino superior com melhoria da qualidade. A conseqüência dessas restrições será a volta das reservas de mercado e a queda da qualidade, já que diminuirá o nível de competição. Não é preciso regular até o último ponto. Eu prefiro confiar na sociedade, dando a informação [através da divulgação das notas de cada curso no sistema de avaliação] e deixando que ela regule o sistema"

TARSO GENRO:
"Muitas das críticas feitas pelo [ex-]ministro Paulo Renato a esse projeto partem do pressuposto que o Estado atrapalha o mercado. O mercado é importante, mas ele tem que estar integrado, vinculado e regulamentado pelo Estado. O [ex-]ministro é contra a regulamentação e eu sou a favor. Se ela existe, ela é originária da sociedade, e não da burocracia estatal. Onde não há regulação, há ausência de normas e a regulação se faz apenas pela força dos setores em disputa no mercado"

CRISTOVAM BUARQUE:
"No que se refere ao [ex-]ministro Paulo Renato, a gente não pode negar que ele entrou para a história ao mudar duas mentalidades. Uma era a de que a universidade era para poucos, pois houve no seu período uma expansão do sistema. Se essa expansão foi com qualidade, isso é outro tópico, mas é justamente por criar uma cultura da avaliação, e esse é o segundo elogio que eu faço, que podemos discutir maneiras de melhorar o sistema de avaliação"


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