São Paulo, segunda-feira, 27 de março de 2006

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CORRUPÇÃO

Moradores desapropriados em Manaus dizem que são obrigados a pagar "por fora" para serem beneficiados

Corretor cobra propina em programa do BID

Alberto Cesar Araujo/Folha Imagem
Beco São Benedito, de onde os moradores se recusam a sair


KÁTIA BRASIL
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MANAUS

Famílias pobres que estão sendo desapropriadas de suas casas às margens de igarapés de Manaus dizem que foram obrigadas a fazer pagamentos "por fora" a corretores de imóveis para serem beneficiadas pelo projeto Prosamim (Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus), financiado pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e pelo governo do Amazonas.
As famílias desapropriadas podem optar, entre outras possibilidades, por um "bônus-moradia" que garante a aquisição de uma nova casa em outro local de Manaus pelo valor de até R$ 21 mil.
Corretores particulares -indicados por técnicos do Prosamim, segundo famílias- encontram uma nova casa no valor do bônus. As famílias ouvidas pela Folha disseram que são obrigadas a pagar de R$ 2.000 a R$ 10 mil aos corretores para não terem dificultado o processo de desapropriação e de aquisição da nova casa.
Também há relatos de corrupção na outra ponta do esquema: os donos das casas que serão vendidas ao programa pagam "por fora" aos corretores para terem suas propriedades superavaliadas ou apenas para fechar o negócio.
O dinheiro da compra dos novos imóveis é repassado diretamente da Suhab (Superintendência Estadual de Habitação e Assuntos Fundiários), órgão do governo estadual, para a conta bancária do proprietário.
Em casos relatados à Folha, os proprietários pagaram aos corretores uma parte do dinheiro recebido. Para deixar um manto de legalidade na transação, o corretor assina um recibo da comissão de 6% a que tem direito pela venda.
O Prosamim é uma obra de saneamento de igarapés poluídos que atinge extensão de 32 km em Manaus e que prevê a desapropriação de 10 mil famílias. Em 2005, o Senado autorizou o governo do Amazonas a contratar com o BID operação de crédito externo, com garantia da União, no valor de até US$ 140 milhões (R$ 294 milhões), para o programa. A contrapartida do Estado foi de US$ 60 milhões (R$ 126 milhões).
Além disso, a Caixa Econômica Federal liberou R$ 125 milhões para a obra. Segundo a Suhab, que gerencia o pagamento das indenizações, na primeira etapa foram desapropriadas 3.200 famílias. A superintendência informou que o Estado pagou R$ 49,7 milhões em indenizações.
Paschoal Rodrigues, presidente do Creci (Conselho Regional de Corretores de Imóveis) da 18ª Região, disse que o conselho recebeu quatro denúncias contra corretores por irregularidades no Prosamim, mas afirma que eles não eram habilitados pelo órgão.
Por causa das denúncias, o Creci regulamentará cem profissionais na Suhab para atuar no programa. O Creci tem mil corretores habilitados para trabalhar no mercado amazonense. "A sociedade tem de ter consciência de que pode denunciar esse profissional", afirmou Rodrigues.
A Associação de Assistência aos Moradores do Igarapé da Cachoeirinha ingressou na Justiça com uma ação civil pública pedindo a paralisação das obras do Prosamim. Segundo a presidente da associação, Ricardina de Araújo Lima, 50, as interferências dos corretores constrangem as famílias, a maioria morando há anos (de 15 a 50) à beira do igarapé.
Ela afirma que outro problema do programa é que os técnicos pressionam as famílias a sair rápido das casas, devido ao avançado estágio das obras.


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