|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
SP CHIQUE
Na Oscar Freire, lojistas que não pagavam pelo serviço viam desaparecer suas mercadorias; vigias faziam parte do esquema
Policial arma furto para vender segurança
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
A Polícia Civil de São Paulo
anunciou ter desvendado um esquema de venda de segurança à
base de ameaças contra comerciantes de uma das ruas mais sofisticadas de São Paulo -a Oscar
Freire, nos Jardins, o epicentro
das grifes caras na cidade.
Um grupo, que seria comandado por um soldado da Polícia Militar, oferecia segurança às lojas.
Quem não aceitasse pagar cerca
de R$ 1.000 ao mês pelo serviço, tinha o seu estabelecimento furtado. Lojas famosas, como a Ellus e
a Track & Field, foram arrombadas e furtadas à noite por integrantes desse grupo.
De nada adiantou terem alarmes da Siemens Building Technologies, uma das gigantes na área
de segurança privada.
Dois seguranças de moto, que
deveriam checar o que ocorria
quando os alarmes disparavam,
também faziam parte do esquema, segundo a polícia. Em vez de
comunicar o arrombamento, informavam que ocorrera apenas
um disparo acidental.
Os dois eram funcionários da
Power, empresa que tem 4.000
funcionários e uma das maiores
do país nesse mercado, para a
qual a Siemens terceirizou a checagem dos alarmes.
Seis indiciados e um preso
O 78º Distrito Policial, que investigou o caso, indiciou seis pessoas sob a acusação de furto. Só o
soldado Marcelo Losano, porém,
está preso desde a última segunda-feira nas instalações da Corregedoria da Polícia Militar. É a chamada prisão administrativa.
O coronel Paulo Mássimo, corregedor da PM, disse que a prisão
foi decidida porque as suspeitas
que recaem sobre o soldado "são
muito graves".
"É o primeiro caso que investigamos de um grupo que furtava
para angariar contratos de segurança", afirma o coronel.
Os policiais do 78º Distrito Policial demoraram cinco meses para
identificar o grupo que atuava na
Oscar Freire. O caso começou a
ser investigado em janeiro, quando comerciantes começaram a relatar as ameaças. Oito casos de
furtos, ocorridos no final do ano
passado e no começo deste, foram
notificados à polícia.
No meio da investigação, apareceu uma testemunha que os policiais consideram chave -só concordou em falar sob sigilo (o que é
legal) e depois que ofereceram a
ele a entrada no Sistema de Proteção a Testemunhas se sofresse
ameaças.
Foi assim que os investigadores
descobriram uma das provas do
furto. Um dos seguranças que trabalhava com o policial guardara
em casa jeans da Ellus que tinha
furtado na loja da Oscar Freire.
Os seguranças furtavam objetos
de desejo dos mais pobres, como
jeans e óculos de sol das grifes. O
volume furtado nunca era grande,
de acordo com o coronel. "De
jeans, não levaram mais do que
meia dúzia de peças", ilustra.
O núcleo do grupo, segundo o
corregedor da PM, era formado
pelo soldado Losano e mais dois
seguranças, um dos quais era policial reformado.
Um dos seguranças confirmou
aos investigadores que participara dos furtos, mas disse que o soldado, a quem era subordinado,
não sabia de nada.
O relato do soldado
O soldado contou nos dois depoimentos que prestou, no 78º
DP e na Corregedoria, que não sabia das atividades criminosas dos
seguranças. Na delegacia, admitiu
que mandara furtar uma placa luminosa do Café Animalle. Na
Corregedoria da PM, negou que
tenha dado ordem.
Losano entrou na polícia em
1991 e ganhava cerca de R$ 1.500,
segundo a Corregedoria. Ele contou ao corregedor que trabalhava
como segurança na Oscar Freire
há cinco anos. Lá, arrecadava com
os comerciantes cerca de R$
9.000, que dividia com outros dois
seguranças. Ou seja, o seu ganho
no "bico" era o dobro do seu soldo como policial.
As normas da polícia proíbem o
"bico". Na prática, porém, a atividade é tolerada como uma espécie
de contrapartida aos baixos salários que a corporação paga.
O soldado tinha tanta certeza da
impunidade que fornecia a seus
clientes da Oscar Freire RPAs,
uma sigla bem ao gosto dos policiais. Quer dizer "recibo de pagamento autônomo".
Texto Anterior: Infância: Esquema de envio de garotas é revelado Próximo Texto: Outro lado: Empresa diz que caso é o 1º em 19 anos Índice
|