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Movimento na USP reúne estudantes com perfis opostos
Alunos da classe alta e da periferia, atuantes de centros acadêmicos e não-engajados fazem parte da manifestação
Grupo se nega a indicar lideranças do protesto e resolve tudo na base das assembléias; invasão da reitoria ocorreu no dia 3
DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Filhos da classe alta ao lado
de filhos da periferia. Jovens tipicamente paulistanos ao lado
de migrantes nordestinos. Alunos do sucateado curso de história ao lado de alunos do rico
curso de economia. Atuantes
de centros acadêmicos ao lado
de curiosos que só agora sabem
o que significa autonomia universitária. Estão todos lá.
O movimento que desde o dia
3 invadiu a reitoria da USP
agrega perfis tão diferentes
quanto o de Adriana de Cássia
Moreira, 24, negra, que saiu de
Guarulhos (Grande São Paulo)
para morar no Crusp (a moradia para estudantes da USP) e
Diogo Campanhã, 21, branco,
que mora com os pais em um
bairro de classe média alta na
zona oeste da capital.
A Folha conversou com quatro estudantes que, de alguma
forma, têm participação ativa
no movimento. Nenhum dos
entrevistados é líder, porque o
grupo se nega a indicar lideranças e resolve tudo na base das
assembléias. Muitos participam de comissões; outros se
incumbem de disseminar os
propósitos do movimento em
cursos alheios à manifestação.
É o caso de Adriana, que ajuda a explicar o que está acontecendo para alunos que não vão
até a reitoria. Já Diogo faz parte das comissões de negociação
e de comunicação. Há mais de
duas semanas, ele passa as noites na reitoria. Adriana não
dorme lá. "Não me envolvo
mais porque tenho medo de represálias. Quero ser professora
universitária", diz.
Em dias normais, ela se dedica ao mestrado de estudos
comparados de literatura e língua portuguesa. Formada em
português/lingüística, está desempregada e não conseguiu
bolsa de mestrado. Para pagar
as contas, corrige textos
alheios. Diogo vai para o curso
de administração pública que
há dois anos freqüenta na Fundação Getúlio Vargas. De lá, segue para o curso de história,
que faz na USP há quatro anos.
Ambos são da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas), não participam de centros acadêmicos
nem são filiados a partidos políticos. Também não namoram.
As coincidências param por
aí. Ele é filho de mãe bioquímica que trabalha como professora em faculdade particular, e de
pai engenheiro, que atua como
administrador. Tem um irmão.
Ela é filha única de pai professor da rede municipal de Guarulhos e de mãe aposentada
que fez apenas ensino médio.
Diogo estudou em colégios
tradicionais de São Paulo: Rio
Branco e Palmares. Adriana
freqüentou escola pública e só
no ensino médio foi para uma
particular porque conseguiu
bolsa. Ele não fez cursinho. Ela
passou um ano no cursinho.
Ele, já sabendo da luta estudantil, aderiu no primeiro dia.
Em sua visão, não há nada de
errado ao descumprir a decisão
de reintegração de posse da reitoria. "É um direito da população pedir mudanças e ocupar
um espaço público."
Ela, que é do grupo OcupAção Afirmativa (que luta por
melhores condições de acesso e
permanência para alunos carentes), diz que não tinha entendido bem o movimento.
"Fui me informar e vi a necessidade de participar." Para
Adriana, o ponto principal das
reivindicações é a construção
de moradias e a flexibilização
do acesso para pobres e negros.
Para Diogo, é a contratação de
docentes e a melhora na estrutura e na qualidade do ensino.
Se divergem neste ponto, estão convencidos de que a mobilização é necessária para pressionar o governo e a reitoria.
Têm, ainda, outra certeza em
comum: a de que sua mães estão apreensivas. "Minha mãe
está em pânico. Ela tem medo
da polícia", diz Diogo. "Minha
mãe tem medo da polícia porque não temos com pagar advogado", finaliza Adriana.
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