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URBANIDADE
Chão de estrelas
GILBERTO DIMENSTEIN
João Marcelo Rolim descia as escadarias do Colégio
Objetivo e ouvia os berros, em
meio a vaias, que lhe dirigiam
seus colegas: "Bicha, bicha, bicha". Quando já estava quase na
calçada, na avenida Paulista,
olhou para o lado, viu alguém
aproximar-se e, sem que pudesse
desviar-se, sentiu o cuspe no rosto. Cabisbaixo, não reagiu. "Foi
a maior humilhação da minha
vida", lembra.
Naquele tempo, ele era apenas
um adolescente que não sabia o
que faria da vida. Sofria por causa do estigma do homossexualismo e do gosto pelas roupas exuberantes. Está agora com 28
anos, é conhecido como Johnny
Luxo e, nesta quarta-feira, vai
desfilar. Desta vez, na São Paulo
Fashion Week, para ser aplaudido como um dos modelos do estilista Alexandre Herchcovitch,
festejado internacionalmente.
"Eu sempre colecionei roupas,
foi por isso que comecei a participar de desfiles", conta João.
João e Alexandre são personagens bem-sucedidos em uma das
prósperas vocações da cidade de
São Paulo, geradora de empregos e até mesmo de dólares: a de
ditar moda. "O "estilismo" brasileiro é basicamente o "estilismo"
paulistano", afirma Glória Kalil,
analista de moda, ex-proprietária da grife Fiorucci no Brasil e
autora do livro "Chic".
O epicentro desse movimento
está na região dos Jardins, mais
visível na rua Oscar Freire, onde
se materializam os desenhos feitos nas pranchetas. Os rostos que
encarnam essa tendência têm
como quartéis-generais, além
das passarelas, o Ritz e o Spot,
dois restaurantes badalados.
Toda uma indústria cresce em
torno dos estilistas, estimulando
não só as vendas mas um verdadeiro "boom" de escolas de moda
-uma atividade até pouco tempo atrás sem opção de formação
profissional específica. A demanda inclui costureiras, modelos e
até produtores de eventos; a São
Paulo Fashion Week, por exemplo, está entrando no circuito internacional -prova disso é a
chegada de jornalistas estrangeiros para o desfile.
Tal prosperidade estimula até
um orgulho paulistano, algo escasso numa cidade tão maltratada: "Não há cidade igual a São
Paulo. Perto dela, no Brasil, tudo
parece meio de interior. Devo
meu sucesso ao fato de estar
aqui", comemora João Marcelo
Rolim, que consegue ganhar até
R$ 700 por desfile e que transformou as chacotas escolares em
apenas lembranças ruins.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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