São Paulo, quarta-feira, 27 de junho de 2001

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URBANIDADE

Chão de estrelas

GILBERTO DIMENSTEIN

João Marcelo Rolim descia as escadarias do Colégio Objetivo e ouvia os berros, em meio a vaias, que lhe dirigiam seus colegas: "Bicha, bicha, bicha". Quando já estava quase na calçada, na avenida Paulista, olhou para o lado, viu alguém aproximar-se e, sem que pudesse desviar-se, sentiu o cuspe no rosto. Cabisbaixo, não reagiu. "Foi a maior humilhação da minha vida", lembra.
Naquele tempo, ele era apenas um adolescente que não sabia o que faria da vida. Sofria por causa do estigma do homossexualismo e do gosto pelas roupas exuberantes. Está agora com 28 anos, é conhecido como Johnny Luxo e, nesta quarta-feira, vai desfilar. Desta vez, na São Paulo Fashion Week, para ser aplaudido como um dos modelos do estilista Alexandre Herchcovitch, festejado internacionalmente. "Eu sempre colecionei roupas, foi por isso que comecei a participar de desfiles", conta João.
João e Alexandre são personagens bem-sucedidos em uma das prósperas vocações da cidade de São Paulo, geradora de empregos e até mesmo de dólares: a de ditar moda. "O "estilismo" brasileiro é basicamente o "estilismo" paulistano", afirma Glória Kalil, analista de moda, ex-proprietária da grife Fiorucci no Brasil e autora do livro "Chic".
O epicentro desse movimento está na região dos Jardins, mais visível na rua Oscar Freire, onde se materializam os desenhos feitos nas pranchetas. Os rostos que encarnam essa tendência têm como quartéis-generais, além das passarelas, o Ritz e o Spot, dois restaurantes badalados.
Toda uma indústria cresce em torno dos estilistas, estimulando não só as vendas mas um verdadeiro "boom" de escolas de moda -uma atividade até pouco tempo atrás sem opção de formação profissional específica. A demanda inclui costureiras, modelos e até produtores de eventos; a São Paulo Fashion Week, por exemplo, está entrando no circuito internacional -prova disso é a chegada de jornalistas estrangeiros para o desfile.
Tal prosperidade estimula até um orgulho paulistano, algo escasso numa cidade tão maltratada: "Não há cidade igual a São Paulo. Perto dela, no Brasil, tudo parece meio de interior. Devo meu sucesso ao fato de estar aqui", comemora João Marcelo Rolim, que consegue ganhar até R$ 700 por desfile e que transformou as chacotas escolares em apenas lembranças ruins.
E-mail - gdimen@uol.com.br


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