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Para juiz, desapropriações são "incomuns"
Marcelo Sérgio, da 2ª Vara da Fazenda Pública, diz estranhar valores altos em indenizações no Rodoanel e poucas ações judiciais
Ele diz que, para cumprir prazos e reduzir custos, pagar um pouco a mais pode ser justificável, mas "desde que seja próximo do razoável"
ROGÉRIO PAGNAN
EVANDRO SPINELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
O juiz da 2ª Vara da Fazenda
Pública de São Paulo, Marcelo
Sérgio, disse ter pedido uma investigação sobre as indenizações pagas, em especial as extrajudiciais, pela estatal Dersa
no trecho sul do Rodoanel porque percebe uma situação "incomum" em desapropriações:
um baixo volume de ações judiciais e a oferta pela estatal de
valor acima do de mercado.
Ele disse não poder afirmar
haver irregularidades, mas indícios de sobrepreço em avaliações, como a de um bananal. A
estatal ofereceu R$ 90 mil, mas
a perícia judicial avaliou em R$
1.880. "É muita diferença."
Conforme o Dersa, em 83%
das negociações com os proprietários houve acordo extrajudicial (sem a necessidade de
intervenção judicial). No total
são 1.452 propriedades, envolvendo R$ 420 milhões.
FOLHA - O que levou o senhor a pedir
investigação à Promotoria sobre as indenizações do Rodoanel?
MARCELO SÉRGIO - Em via de regra o que acontece? O órgão público entra com a indenização:
"Olha, estou oferecendo R$ 100
mil para aquele imóvel. Então,
ele [o proprietário] não aceitou
administrativamente e, por isso, estou ajuizando a ação".
Quando a gente faz a avaliação,
geralmente, é os R$ 100 mil
mais um pouquinho. Nesse caso do bananal, começou algo incomum.
Quando veio o primeiro laudo, o valor era inferior ao que o
Dersa sugeria. É um laudo prévio, não estou dizendo que há
irregularidade, ainda será feito
um laudo definitivo. Só que não
é comum esse tipo de coisa.
FOLHA - E os outros casos?
SÉRGIO - No caso do bananal, o
advogado do proprietário fez a
impugnação. Para justificar um
valor maior para indenização,
ele apresentou vários acordos
que o Dersa fez administrativamente. Num desses, a gente
percebeu uma empresa que teve desapropriada uma área por
R$ 2,6 milhões e doou [outra
área] praticamente duas vezes
maior. É outra coisa inusitada.
Você tem uma área que custa
R$ 2,6 milhões e você está
doando praticamente R$ 4
milhões, R$ 5 milhões? Soa
estranho.
Pode ser que esteja tudo normal. Nesse caso específico, eu
não posso fazer nada, não é um
processo meu, nem veio para o
Judiciário. Eu mandei para o
Ministério Público.
FOLHA - A base de dados do Dersa pode
estar errada?
SÉRGIO - Conversei com um perito. Ele tentou me explicar
mais ou menos o seguinte: o
Dersa tem lá uns critérios técnicos, algumas avaliações, que
estão adequadas. Eles fazem
uma certa distribuição de critérios: para gleba, o valor é X; para chácara, o valor é Y.
O perito viu esse estudo e disse que está certo. O que está errada é a classificação que eles
fazem. Então, em vez de classificar no terreno que seria o R$
4, R$ 5, R$ 6 [o metro quadrado], estão classificando no que
paga R$ 15 o metro quadrado.
Aí que estaria o equívoco.
FOLHA - A maioria foi por acordo?
SÉRGIO - Isso também não é comum. Em desapropriações de
grandes áreas, centenas de proprietários, o comum é ficarmos
sobrecarregados. Um dos fatores que levei para o Ministério
Público foi esse: volume pequeno de desapropriação que a
gente teve.
FOLHA - Se o Ministério Público encontrar sobrepreço, pode haver devolução
de dinheiro? Quem devolve?
SÉRGIO - Em princípio, quem
recebeu a mais. Mas a Promotoria pode, em tese, até responsabilizar quem fez o acordo pelo Dersa, obrigar ressarcimento
pelo próprio servidor.
FOLHA - Porque é dinheiro público.
SÉRGIO - Nesses casos do Dersa, eles até justificam alguns casos em que têm pressa, têm
prazo. Isso realmente ocorre.
Há prazos para serem cumpridos. Então, às vezes, com objetivo até de acelerar as desapropriações, eles acabam oferecendo um pouquinho a mais do
valor que seria o justo.
A gente pode até considerar
isso, se o valor não extrapolar o
que é razoável. Para agilizar a
perda de tempo, gastos com peritos, advogados, pode ter justificativa. Desde que seja próximo do razoável.
FOLHA - Não 50% a mais?
SÉRGIO - Pois é. Sendo razoável,
tendo alguma justificativa de
urgência, uma coisa assim, tudo
bem. Não haveria problema.
Em nenhum momento quero
afirmar que há irregularidade,
apenas que constatei que não é
comum. Eu tenho mais três
processos, e não vi nada de incomum. Está tudo do jeito que
a gente está acostumado.
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