São Paulo, domingo, 27 de julho de 2008

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GILBERTO DIMENSTEIN

Emprego da sogra


Empresa criou benefício que dá ao funcionário a opção de incluir, além dos pais, os sogros no plano de saúde


UMA NOVA MODALIDADE de benefício trabalhista está em teste na cidade de São Paulo: a inclusão no plano de saúde não apenas dos pais do funcionário mas, ainda por cima, dos seus sogros.
Essa versão inusitada de Bolsa-Família, que vai do filho à sogra, é apenas um detalhe do pacote de benefícios que inclui, entre outras coisas, ajuda para as mães que quiserem contratar uma babá e bônus atrelado ao desempenho individual e de grupo.
Foi com esse tipo de oferta que a rede de varejo Magazine Luiza selecionou 2.000 entre 120 mil candidatos para trabalhar nas lojas que vai abrir em São Paulo. Os selecionadores optaram por aqueles que demonstraram maior criatividade e habilidade de comunicação.
A imensa maioria dos contratados tem o diploma de ensino médio. É pouco. Todos terão direito a bolsa de estudo para cursar uma faculdade ou para realizar cursos de aperfeiçoamento profissional.
As exigências daquela empresa ajudam a entender a importância de duas medidas anunciadas na semana passada para aumentar o repertório cultural dos brasileiros -afinal, sem repertório cultural, não se produzem trabalhadores comunicativos, indispensáveis em economias com foco nos serviços.

 
Um acordo entre o Ministério da Educação e associações empresariais acertou, na terça-feira, que um terço das verbas destinadas à cultura pelo Sistema S -Sesc e Sesi- seja drenado para alunos de escolas públicas. Isso significa que deverão ser doados ingressos de peças, filmes, exposições ou concertos. Neste ano, segundo o ministro Fernando Haddad, gestores da rede pública serão treinados para aproveitar os recursos disponíveis pelo Sistema S, que, pelo acordo, também deverá aumentar a oferta de cursos gratuitos. O treinamento fará parte de um programa já em andamento, batizado de Mais Educação, desenvolvido em regiões metropolitanas, cuja meta é criar as mais diferentes redes (saúde, lazer, geração de renda, assistência social) em torno das escolas, como se fossem extensões da sala de aula -e, assim, aumentar o horário escolar.
 
Essa é a linha da segunda medida anunciada na semana passada, desta vez em São Paulo. Escolas estaduais terão recursos para que se aproximem mais dos museus, dos teatros, das exposições e dos concertos. Levar até o museu é fácil, basta um motorista de ônibus. A questão é saber se o professor vai conseguir fazer uma experiência que ajude a ensinar. Derrubar os muros da escola e transformar uma cidade num espaço de aprendizado é um desafio experimentado, com muita dificuldade, em várias partes das nações mais ricas. Mas, quando se ultrapassam essas barreiras, os resultados são extraordinários. Um bom exemplo é o Museu da Língua Portuguesa. Já é difícil fazer as crianças gostarem de museu e, mais difícil ainda, é fazer com que gostem do português. Nenhum museu do país recebe em média, por dia, 1.500 visitantes. "Para muita gente, especialmente para os jovens, a imagem de um museu está associada a coisa velha e chata. O que tentamos fazer é que pareça algo vivo, dinâmico, interativo", conta Marcelo Dantas, um dos idealizadores daquele museu. Esse conceito torna-se palpável nas imensas filas que se formam, agora, para ver a exposição sobre Machado de Assis -um escritor na maioria das vezes torturado nas salas de aula. Torturado pelos alunos e pelos professores.
 
Quero dizer o seguinte: as pessoas estão mais preparadas para os desafios do mercado de trabalho, como as demandas da rede Magazine Luiza, quando têm, desde cedo, contato com a cultura -e, especialmente, se aprendem como se estivessem num museu como o da Língua Portuguesa. E não como se fossem personagens do sombrio texto de Machado, intitulado "Conto de Escola". Na conhecida ironia machadiana, conto não é apenas um gênero literário.
 
PS - Bem diferente do espírito do "Conto de Escola" (coloquei o texto no www.dimenstein.com.br) é uma surpresa da qual Marcelo Dantas faz parte. Ele integra a equipe da Fundação Catavento, cuja inauguração está prevista para outubro em São Paulo. O projeto é usar as mais diversas tecnologias para encantar com lições de química, física, matemática, biologia, história ou geografia. Um dos projetos de Dantas é uma parede íngreme que simula uma montanha. Depois da escalada, o "alpinista" entra numa câmara escura, onde vai conversar com personagens como Albert Einstein, Winston Churchill ou Santos Dumont -os recursos digitais permitirão que se pergunte a eles sobre, por exemplo, a invenção do avião, a briga dos ingleses com os nazistas ou a inspiração que levou à teoria da relatividade. Na semana passada, ele pensava se iria incluir na galeria Machado de Assis, que, assim, poderia, quem sabe, esclarecer diretamente a todos sobre sua arte das ironias.

gdimen@uol.com.br



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