São Paulo, domingo, 27 de agosto de 2000


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ENEM
Grupo que conseguiu isenção para carentes já ganhou processos contra seis universidades públicas por cobrança indevida
60 mil estudantes farão exame sem pagar

ANTÔNIO GOIS
DA REPORTAGEM LOCAL

Hoje, quase 60 mil dos 390 mil alunos que farão o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) estarão em sala de aula graças a liminares conseguidas por cursinhos pré-vestibulares comunitários. Esse grupo deixou de pagar, ao todo, quase R$ 1,5 milhão ao Ministério da Educação (MEC), por causa da isenção da taxa de R$ 25.
Em parte por pressão desse grupo, o ministro Paulo Renato Souza afirma que isentará alunos no ano que vem. Hoje, ele deve anunciar os critérios.
A principal figura por trás desses cursinhos é um frade da Igreja Católica, o frei Davi Santos. A onda de processos contra as universidades públicas começou em 1997, contra a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Hoje, mais de 100 mil alunos já foram beneficiados com as ações do grupo de frei Davi contra seis universidades públicas do Rio e São Paulo e contra o MEC.
Os cursos para negros e carentes começaram na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, e funcionam, em sua maioria, em igrejas. Hoje, são mais de 300 em todo o Brasil e atendem cerca de 18 mil alunos -em sua maioria, negros.
Segundo frei Davi, o índice de aprovação no vestibular é de 25% em São Paulo e 34% no Rio.
No início, eram apenas mandados de segurança individuais contra universidades públicas do Rio. A partir de 1998, no entanto, o grupo de frei Davi começou a mover ações civis públicas que beneficiavam, em alguns casos, todos os estudantes que declaravam não ter condições de pagar a taxa de inscrição nos vestibulares, que varia de R$ 50 a R$ 70.
"Para um filhinho de papai, esse dinheiro pode ser um jantar com a namorada. Mas para o filho de um trabalhador, é meio salário mínimo", afirma o advogado Carlos Cleto, autor das primeiras ações e professor voluntário em um dos "pré-vestibulares para negros e carentes" que foram idealizados por frei Davi.
O principal argumento das ações é o princípio da gratuidade do ensino público. "A cobrança é inconstitucional", afirma Cleto.
No Rio, nas contas de frei Davi, os cursinhos estão ganhando 9 em cada 10 ações. Em São Paulo, esse número é menor: 4 em cada 10. "A Justiça de São Paulo é menos sensível ao direito dos pobres", afirma o frade.
É frei Davi, junto com outras lideranças de cursinhos comunitários, que está à frente das negociações para que USP, Unicamp e Unesp ampliem a isenção para estudantes carentes neste ano.
A Fuvest (Fundação Universitária para o Vestibular), principal alvo do grupo, já fez uma proposta, mas ela é bem aquém do que os cursinhos reivindicam. "É uma situação delicada a nossa. Pessoalmente, tenho muita simpatia pelo trabalho do frei Davi. Mas não tenho condições financeiras de isentar todos os alunos carentes de taxa no vestibular. Se eles não pagarem, alguém vai ter de pagar", afirma Roberto Costa, presidente da Fuvest, que afirma que a cobrança não é inconstitucional.
Ele diz que, neste ano, as negociações, apesar de tensas, estão "respeitosas". Segundo ele, nem sempre foi assim. "Há dois anos, eles invadiram o prédio da Fuvest. Depois disso, passei a não recebê-los aqui dentro e ia conversar na grade do portão", afirma.
O próximo passo do grupo de frei Davi é processar a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo. "Seis de nossos alunos declararam que passaram de ano sem ter aulas. Eles estão sendo prejudicados agora por isso", diz.



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