São Paulo, quarta-feira, 27 de agosto de 2008

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Gestantes enfrentam dificuldades até para conseguir diagnóstico de anomalia

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Gestantes de fetos anencéfalos ainda enfrentam dificuldades para fechar o diagnóstico da anomalia e também para encontrar médicos dispostos a fazer a interrupção da gestação, mesmo após conseguirem liminares na Justiça. Em São Paulo, que possui uma das redes mais bem estruturadas para atender essa gestante, a demora pode chegar a dois meses.
Em 2007, uma pesquisa da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) e da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) mostrou que mais de 90% dos ginecologistas acreditam que a mulher tem o direito de interromper a gestação de um anencéfalo, mas só 49% deles aceitariam fazê-lo -contra 51% dos que não fariam.
Segundo a enfermeira Anaelise Abrahão, que coordena o setor de aconselhamento genético do Hospital São Paulo, ligado à Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), as mulheres ainda perambulam pelos serviços médicos em busca de orientação. "Nenhum serviço quer essa paciente. É como se estivessem com uma batata quente nas mãos."
Abrahão conta que mesmo os serviços especializados de medicina fetal não têm interesse de acompanhar as gestantes quando os bebês são inviáveis. "São poucos os que dão assistência à gestante e dão a opção da interrupção ou que fazem o acompanhamento."
A unidade da Unifesp é referência na capital paulista no atendimento a essas gestantes e realiza por mês uma média de cinco interrupções de gravidez.
O ginecologistas Cristião Rosas, presidente da comissão nacional de interrupção da gravidez da Febrasgo, diz que a federação tem trabalhado na capacitação de médicos para que possam oferecer atendimento de qualidade a essas mulheres, baseados nos dispositivos legais, jurídicos e éticos.
Rosa também observa o pouco envolvimento dos gestores de saúde. "Por mais que você tenha pessoas sensíveis ao problema, se você não tem uma organização da política pública de saúde, a coisa não acontece. É preciso primeiro um compromisso dos gestores."
Quando encontram um serviço disposto a realizar a interrupção, as mulheres de baixa renda enfrentam mais dificuldades, relata Anaelise Abrahão. "Cada reconhecimento de firma são R$ 9,00. Ela precisa reconhecer firma de, pelo menos, quatro assinaturas. Depois tem que ir várias vezes ao fórum. Isso onera bastante."
Apesar dos contratempos, a enfermeira explica que algumas mulheres têm diagnosticado mais precocemente a anencefalia, por volta da 12ª semana da gestação. "É mais fácil [fazer a interrupção] porque ela não tem a percepção de movimento fetal. Ela sabe que está grávida, mas não tem barriga grande, não sente o nenê mexer."
Abrahão diz que a Justiça tem demorado de uma a duas semanas para conceder a autorização para a interrupção. "Já tivemos casos em que a decisão saiu em três dias. Dificilmente temos uma negativa."
Entre as mulheres, 50% decidem pela manutenção da gravidez até o fim.


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