São Paulo, sexta-feira, 27 de agosto de 2010

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Crack eleva número de homicídios, diz estudo

Chegada da droga em 95 quadruplicou índice em BH nos anos seguintes

Até 1996, as mortes motivadas por drogas na cidade eram 8,3% do total; entre 2005 e 2006, passaram a 33,3%

MARIO CESAR CARVALHO
DE SÃO PAULO

A chegada do crack a Belo Horizonte, em 1995, provocou uma explosão de homicídios nos anos seguintes. Essa associação aparece na maior pesquisa já feita no país sobre a droga, coordenada pelo sociólogo Luis Flavio Sapori, professor da PUC-MG (Pontifícia Universidade Católica).
Até 1996, quando o crack era incipiente naquela cidade, as mortes provocadas por conflitos gerados por drogas ilícitas eram 8,3% do total. Entre 2005 e 2006, esse índice quadruplicou -33,3%, segundo o levantamento.
Os homicídios estão em queda naquela cidade, mas os motivados pelo crack não param de crescer.
O crack provoca uma letalidade maior do que as outras drogas, segundo o pesquisador, por causa do tipo de dependência que provoca -muito mais severa do que maconha ou cocaína. Como a fissura é incontrolável, o vício é seguido de um endividamento crescente.
"Esse tipo de conflito é resolvido com violência: quem não paga a droga paga com a própria vida", diz Sapori.
Um dos traficantes entrevistados na pesquisa dá uma pista um pouco mais complexa das relações entre vendedor e comprador. "O traficante não mata o usuário porque ele tá devendo. Mata porque ele é um sem-vergonha, tá devendo e foi comprar na outra boca. É nessa situação que ele mata o usuário."
A pesquisa é considerada a maior do país porque analisou 671 inquéritos de homicídios (de 1993 e 2006), ouviu 19 traficantes, 23 usuários e 84 profissionais que tratam dependentes.
A queda dos homicídios em Belo Horizonte a partir de 2004, quando aumentam ainda mais os crimes motivados por drogas, não derruba a hipótese de que crack e homicídios andam juntos, conforme Sapori. Essa queda está ligado a uma maior estabilidade do mercado, diz.

PODEROSO CHEFINHO
O comércio de crack, segundo ele, funciona de forma similar ao mercado de carros ou de geladeiras: tem uma racionalidade que busca o lucro e faz de tudo para evitar ser alvo das autoridades.
"O traficante mata menos porque não quer a polícia na sua boca. Ele percebe que a polícia ficou mais eficiente e mata menos para manter o lucro", afirma.
Uma das descobertas da pesquisa, para o sociólogo, é a forma como os pontos de venda se organizam. O crack tem componentes do crime organizado, mas seria equivocado imaginar uma estrutura do tipo máfia.
O que há, segundo os pesquisadores, é uma rede de "bocas", os pontos de venda, que são abastecidos por um chefão, chamado "patrão". "O atacadista que abastece as bocas não mexe com o varejo. As bocas são como uma mercearia. É uma rede de chefinhos", compara.
O que acontece em Belo Horizonte vale para o resto do país, segundo Sapori.
O sociólogo Renato Sérgio de Lima, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, concorda. "O crack é um acelerador da criminalidade porque desorganiza ao mesmo tempo o tráfico e a polícia."
O sociólogo José Luiz Ratton, da Universidade Federal de Pernambuco, diz não ter dúvidas de que crack gera violência, mas acha que há uma simplificação na conclusão do estudo. Rio e Recife, para ele, passam por uma explosão do crack, mas os homicídios estão em queda.
"Há ondas de homicídio que não coincidem com o crack", afirma.


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