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DEPOIS DOS 40
Para médicos, na vida real a chance de uma mulher engravidar como Helena, de "Laços de Família", não chega a 1%
Novela exagera probabilidade de gravidez
CLÁUDIA COLLUCCI
EDITORA-ASSISTENTE DE TREINAMENTO
A gravidez da personagem Helena, interpretada pela atriz Vera
Fischer na novela "Laços de Família" da Rede Globo, causou um
certo mal-estar entre os especialistas em medicina reprodutiva.
Na novela, Helena engravida
naturalmente aos 44 anos, sem
tratamento e em uma única noite
de sexo. A chance de isso ocorrer
na vida real, segundo os médicos,
não chega a 1%.
Pesquisa feita nos EUA, com 126
mil gestantes, em um período de
dez anos, mostra que apenas 0,6%
delas tinha 44 anos. No Brasil, não
há pesquisa semelhante.
Mesmo com a ajuda de remédios que estimulam a ovulação e
das modernas técnicas de fertilização artificial, uma gravidez nessa idade também é difícil. As probabilidades não ultrapassam 8%,
segundo o médico Paulo Serafini,
50, da clínica Huntington de São
Paulo e chefe do departamento de
Medicina Reprodutiva da Universidade de Yale.
Serafini afirma que, nas condições em que a personagem Helena se encontrava -óvulos velhos,
estresse e nenhum tratamento
hormonal anterior- , as chances
de uma gravidez são quase nulas.
Para o médico José Gonçalves
Franco Júnior, diretor do Centro
de Reprodução Humana Sinhá
Junqueira, o caso mostrado na
novela acaba criando falsas expectativas nas mulheres.
Franco não tem nenhuma paciente acima de 42 anos que tenha
conseguido engravidar com seus
próprios óvulos. O mais comum,
segundo ele, é essas mulheres receberem óvulos doados. Em sua
clínica, das 43 pacientes que engravidaram com doação de óvulos, 70% tinham mais de 44 anos.
O médico Edson Borges, 40, diretor clínico da Fertility e presidente da Sociedade Brasileira de
Reprodução Assistida, também
não tem registro de gravidez de
mulheres acima de 42 anos.
Ele afirma que, além da dificuldade de engravidar, uma mulher
acima de 40 anos tem maior risco
de sofrer aborto e muito mais
probabilidade de gerar um bebê
com síndrome de Down.
"Em uma mulher de 30 anos, as
chances de o bebê apresentar a
doença são de um para cada 1.500
nascimentos. Em uma mulher de
40, a probabilidade é de um a cada
50 nascimentos." Outro dado
preocupante: das 34 mulheres acima de 42 anos que engravidaram
na clínica, 16 abortaram.
Exceção
O caso da apresentadora Silvia
Poppovic, 45, que deu à luz a filha
Ana, no ano passado, depois de
seis meses de tratamento na clínica Huntington, em SP, é considerado uma exceção pelos médicos.
"Não foi nada fácil. Foram muitas injeções na barriga e muito
hormônio", diz Silvia, que prefere
não revelar qual a técnica de fertilização utilizada para conseguir a
gravidez e nem o número de tentativas realizadas "em respeito à
privacidade da filha".
Depois de engravidar três vezes
naturalmente, aos 38, 39 e 42
anos, e perder os bebês durante a
gestação, a comerciante Cleusa
Gouveia, 50, partiu para as fertilizações "in vitro".
Como não deu certo, decidiu
adotar uma menina. Gostou tanto
da experiência que acabou adotando outras sete crianças.
Citoplasma
Uma técnica que vem sendo utilizada por algumas clínicas de fertilização, embora ainda não existam estudos clínicos que comprovem a sua eficácia, é a transferência de citoplasma, indicada para
mulheres com mais de 40 anos ou
que produzem óvulos fracos.
De 10% a 20% do citoplasma do
óvulo de uma doadora jovem é
transferido para o óvulo da paciente para dar origem a embriões
de melhor qualidade e com maior
poder de implantação. Uma questão ética que envolve essa técnica
refere-se à possibilidade de se
transferir, junto com o citoplasma, material genético da doadora.
Religião
Mulheres que procuram ajuda
da ciência para engravidar também apelam para a religião. Casos
de pacientes que rezam durante a
transferência dos embriões para o
útero ou que carregam imagens
de santos para a clínica de reprodução são bastante frequentes.
Na clínica Huntington, de São
Paulo, por exemplo, há um pequeno altar com imagens de santos, santas e várias velas acesas,
colocados por mulheres que conseguiram engravidar por meio da
fertilização artificial.
A Igreja Católica tomou uma
posição dúbia sobre a fertilização
"in vitro". Por princípio, discorda
desse tipo de reprodução por ser
artificial. Por outro lado, o Vaticano dá espaço para que cada casal
tenha oportunidade de resolver
seu problema de infertilidade.
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